Page

Páginas

segunda-feira, 17 de dezembro de 2018

Os deuses a serviço do diabo


Pois é. O improvável aconteceu mesmo. No universo indiano o que não faltam são deuses. Eles são imortais embora, muitas vezes, impotentes. Por uma concessão de Brama que, naquelas alturas tinha mais poder do que Indra, o diabo Havana conseguiu muitos privilégios, inclusive o poder de não ser exterminado pelos deuses ou diabos. Por incrível que pareça, os próprios deuses o serviam. Agni, o deus do fogo aquecia os fogões de sua cozinha; Vayu, o deus dos ventos,  varria-lhe os pátios de Lanca, a Ilha de Havana; Varuna, senhor das águas, fornecia vinhos para sua corte. O sol alumiava a sala de Havana e a lua os seus jardins. Viswakarman, o deus “arquiteto do universo” permanecia de braços cruzados. Havana abusava de seu poder e tentava a todos.  Devorava a comida dos sacrifícios nos altares e brincava na fumaça dos incensos. Literalmente, o diabo estava solto, naquele tempo! Hoje ele fica solto só de vez em quando, pelo que parece.

Morava em Kosala, norte da Índia,  um rei muito piedoso e justo que se chamava Dasaratha. Era o rei de Ayodhya. Já estava um pouco idoso para realizar seu grande desejo de ser pai. Somava sessenta mil anos de idade e, naquele tempo, não havia Viagra... Sem saber o que fazer procurou o Sacerdote Vasishtha, quase sempre sobra para os sacerdotes,  e pediu-lhe que intercedesse junto aos deuses para que ele pudesse ser pai. Logo em seguida o cocheiro do rei transmitiu essa notícia às três esposas que o rei possuía:  Kaushalya, Sumitra e Kaikeyi, a mais jovem delas. A partir de então, cada uma das esposas fazia de tudo para ajudar o rei a realizar o sonho de ser pai.

Lá no céu, Indra ouviu as preces do sacerdote Vasishtha e quis ajudá-lo embora já estivesse velho e sem forças. Então recorreu ao poderoso Narayana, o Senhor Vishnu. Os dois deuses beberam uns tragos de soma, uma bebida indiana e se alegraram. Mas, Vishnu, disse que não poderia ajudá-lo para não comprar inimizade com Brama. Mas, como Narayana era muito sábio estudou bem a sentença antes aplicada a Havana, por Brama e constatou que ele, o diabo poderia ser vencido. Na verdade ele não poderia ser morto pelos deuses, mas poderia ser morto por um homem. Foi então que Indra, de comum acordo com ele decretou que ele nasceria na terra acompanhado de sua esposa Lakshmi que também seria transformada numa mortal e teria o nome de Sita. Narayana, por sua vez seria chamado de Rama e seria um príncipe humano para derrotar o diabo Havana. Depois dessa decisão o Rei Dasaratha teve quatro filhos: O filho de Kaushalya foi Rama, os filhos de Sumitra foram Lakshman e Shatrughna e o filho de Kaikeyi foi Bharata.

O que foi dito acima é parte de um clássico indiano chamado Ramyana. A narrativa trata da formação do povo indiano com suas lutas, lendas e sonhos. Começou a ser escrito cerca de 200ª.C e terminou 200d.C. É um conjunto de histórias dentro da mesma história que acaba revelando princípios morais e questões religiosas presentes, ainda hoje no imaginário indiana. O Príncipe Rama é modelo de virtude e boa conduta. Mesmo lutando contra as forças demoníacas ele vence e consegue arrebatar o seu grande amor, Sita, do poder de Havana o diabo que a havia sequestrado. Na história o que se trava é uma luta do bem e do mal, coisa própria do interior de cada ser humano. Isso faz com que o Ramayana (Caminho de Rama) seja, profundamente, atual. Quem não luta contra os próprios demônios que querem nos roubar de nós mesmos? A princesa Sita transforma-se num horizonte idealizado que nos atrai e ao mesmo tempo foge de nós. Para se chegar até ele temos que vencer os próprios abismos. A odisseia de Rama fala muito da história de cada um de nós!

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Deixe aqui seu comentário