O Bispo me fez chorar
Antes de escrever esse texto vai uma explicação: Ele foi escrito por mim em 2002 após uma longa entrevista com Dom José Belvino sob...
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Antes de escrever esse texto vai uma explicação:
Ele foi escrito por mim em 2002
após uma longa entrevista com Dom José Belvino sobre um tema polêmico, na
época, que seria debatido na Rádio Santa Cruz. Como a Rádio é da Igreja
Católica, quis ouvir a opinião do Bispo antes de colocar o debate no ar. Depois
da entrevista escrevi esse texto. Confesso que Dom Belvino, muitas vezes, me
emocionou com suas reflexões. Quis transcrever esse texto, apesar de antigo,
somente para recordar o que aconteceu naquele dia.
Atualmente, somos desafiados,
constantemente, por questões ambíguas que nos pedem um julgamento. Obviamente,
não nos cabe a condição de juízes, mas parece inerente à pessoa humana a
pergunta pelo certo e pelo errado. Convivemos, hoje, com realidades distintas e
opostas. Se os jornais nos mostram as mulheres afegãs com o rosto coberto pela
burca, mostram, por outro lado, um casal de Minas Gerais que, adota, legalmente,
um filho, sendo homossexuais. Presenciamos de um lado, o conservadorismo
exagerado e de outro, uma postura bem diferente... Divididos nesse espaço nos
perguntamos: mas o que está correto? A
novela da Rede Globo exibe, num horário nobre, o caso do “homem que virou
mulher”.
A Rádio Santa Cruz, de Pará de
Minas, não tem o costume de fugir dos
temas polêmicos, mas antes de debatê-los, procuramos ouvir opiniões distintas,
de várias pessoas sobre os temas. Por
causa disso, num sábado, durante o Programa “Show de Sábado”, apresentado pelo
locutor Geraldo Cunha, resolvemos discutir
os assuntos da troca de sexo e adoção de crianças por homossexuais. Meio assim
ressabiado procurei o Bispo da Diocese, pensando mil e uma coisas. Apesar de
conhecê-lo, não sabia qual seria sua reação às minhas perguntas. Com sua calma
de pessoa vivida, Dom Belvino recebeu-me por volta das 13 horas, em sua casa, num
horário impróprio para audiências. Com gravador ligado ouvi sua fala sobre o
assunto.
Vou descrevê-la na íntegra:
Meu caro Pe. Gabriel e prezados
ouvintes:
Há certos assuntos dos quais, se
possível, a gente fugiria. O assunto
deste programa é um deles. Todo “ismo” costuma ser perigoso: Fatalismos,
modismos, fanatismos, etc. Os modismos,
que parecem atuais, na verdade sempre existiram sob as cinzas. Agora vêm à tona,
causando muita inquietação, como a mudança de sexo, por exemplo. Isso diz
respeito a uma pequena minoria da sociedade. Mas, ao que parece, é uma minoria
extremamente sofredora. Como devem sofrer as pessoas que nascem fisicamente com
um sexo, psicológica e “espiritualmente” com outro! Elas sofrem por causa do
preconceito, da reação da sociedade e da própria família...
A gente se pergunta: eles têm
culpa? Acho que não. Como agir nesses casos: aceitar? Olhe, estamos vivendo num
mundo pluralista, onde tem de tudo e temos que conviver com os contrários.
Temos que aceitar quem não pensa, nem age como nós. Santo Agostinho, em sua sabedoria e inteligência dizia: “ nós
devemos, às vezes, condenar as atitudes erradas das pessoas, mas nunca condenar
as próprias pessoas”.
Penso que nós devemos amá-las de
qualquer jeito. Portanto, vamos respeitar o que acontece com determinadas
pessoas que enfrentam tantas dificuldades, físicas, psicológicas ou
existenciais. Vamos fazer por elas o que estiver em nosso alcance para ajudá-las
a serem felizes. Não somos obrigados em concordar com tudo o que pensam e
fazem. Há certos princípios que são básicos e se os desprezamos os resultados
são catastróficos. Entretanto, se uma pessoa assim, vier junto a mim e se
desabafar pedindo ajuda eu lhe darei apoio. Terei a compreensão necessária,
como um pai deve ter para com o filho. Um pai, mesmo não concordando com o
filho, o recebe de braços abertos, chora e ri com ele. Seja qual for o problema,
aquele que me procurar pedindo amizade e orientação, eu não darei as costas
(pausa). Pe. Gabriel, a gente sempre pede a Deus a graça de para os filhos ser
pai, para o povo ser pai, para os padres ser pai. Isso não tem sido muito fácil
no mundo de hoje.
O Bispo não sabe, mas se antes da
entrevista eu estava ressabiado, após a mesma, fiquei emocionado. Nunca pensei
que sua caridade fosse tão grande! Imaginei que fosse ouvir um discurso
moralista ou legalista, mas o que ouvi foi a própria caridade. Ela supera a
lei. Tolera coisas que a lei não tolera.
Senti-me diante o próprio Cristo!
O Bispo não sabe por que saí
depressa de sua casa. Fiquei desconcertado. A emoção era demais. Na estrada
liguei o gravador e ouvi a entrevista várias vezes. Coloquei-me no lugar do
marginalizado. Aquele que, muitas vezes, é alvo de chacota da mídia, cuja
imagem se assemelha a de Cristo, banalizada por muitos naquele tempo e ainda
hoje. Na fala do Bispo ouvi a voz do amor. As lágrimas pesaram-me nos olhos.
Não me contive.
Naquele dia o meu bispo me fez chorar...
Dom José... " nunca pensei que sua caridade fosse tão grande"...
ResponderExcluirAmava seu carisma e sua postura de um verdadeiro santo.
Sua morte " me fez chorar"...
Lindo texto. Dom José Belvino era muita pessoa de grande sabedoria.
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