A Mística permeia todas as religiões

Conforme você deve ter percebido, ultimamente, eu parei de escrever por um tempo. Os motivos que me levaram a essa parada quase sempr...


Conforme você deve ter percebido, ultimamente, eu parei de escrever por um tempo. Os motivos que me levaram a essa parada quase sempre são os mesmos. Trabalho, escassez de tempo, o medo de ser pianista de uma nota só e certa frustração com o meu tempo. Mas, se parei de escrever não parei de buscar novos ares. Minha última empreitada foi uma série de leituras sobre o pensamento indiano. Após as leituras, vieram  pequenos textos em meu blog quase sempre servindo de roteiros para alguns vídeos que produzi depois sobre o assunto.

Agora estou iniciando novas pesquisas e leituras. Comprei alguns livros e, à medida que o tempo permite vou lendo, grifando aquilo que me chamou mais a atenção e, posteriormente, escrevendo. Minha proposta atual é entender um pouco mais do que vou chamar de “mística islâmica”.  Mas, porque esse tema? A primeira pessoa que pergunta isso sou eu mesmo. Porque tenho me interessado em algo tão fora de nossa realidade cristã ocidental? Devo confessar que ainda não sei responder tal pergunta. Talvez a resposta seja a tal frustração com o meu tempo, já elencada acima. Não tenho pretensão de pesquisar um tema diferente apenas para destoar do que está aí. É uma fome mesmo. Fome de beleza, de embriaguês do sagrado, de sentido profundo para a existência ou uma fuga da realidade brutal que nos sufoca o tempo todo. Até onde estou percebendo a mística está acima de todas as religiões. Por isso, não importa se é cristã, islâmica, judaica, budista...

Mas, quem sou eu para falar de um tema tão profundo? – Sou alguém que vê o mundo, que o interpreta e quer transcendê-lo. Sou incon-formado; um ser pequeno demais que teima em percorrer o próprio caminho. Nesse caminho posso desfrutar de verdadeiros luzeiros (grandes místicos) que tem me ajudado a dar os primeiros passos.

Vou transcrever abaixo o que li e achei muito relevante para explicar a tendência mística (1):

Podemos encontrar tendências místicas em todas as grandes religiões do mundo. E as descrições que os místicos nos fornecem da experiência mística demonstram uma notável uniformidade, apesar das fronteiras sociais, culturais e religiosas, e de enormes diferenças cronológicas e geográficas. Isso nos permite falar de uma dimensão mística em todas as religiões, e foi por essa razão que o filósofo alemão Leibniz chamou o misticismo de philophia perennis: a filosofia perene.

Com base nos relatos de místicos de várias épocas e culturas, normalmente são atribuídas  as seguintes características  à experiência mística:

1, O místico sente uma unidade em todas as coisas. Há apenas uma consciência, ou um Deus que permeia tudo;
2, Embora o místico já venha se preparando há muito tempo para seu encontro com Deus, ou com o espírito universal, sente-se passivo quando isso acontece. É como se ele fosse tomado por uma força externa,
3, Essa condição se caracteriza pela intemporalidade. O místico se sente arrancado para fora da existência normal de quatro dimensões;
4, O êxtase em si é transitório, e em geral não dura mais que alguns minutos;
5, Mas ele possibilita um novo insight, que permanece com o místico depois da experiência;
6, Essa compreensão é inexprimível, não pode ser comunicada a outros;
7, Como a experiência é paradoxal em si mesma, o místico vai usar paradoxos ao tentar descrever o estado que experimentou. Assim, pode definir o ser encontrado como “abundancia de vazio”, “escuridão ofuscante” ou algo parecido.

No poema de Rumi (2), citado abaixo, vão aparecer muitas dessas características apontadas acima:

Rumi - Tu e Eu

Feliz o momento em que nos sentarmos no palácio,
dois corpos, dois semblantes, uma única alma
- tu e eu.

E ao adentrarmos o jardim, as cores da alameda
e a voz dos pássaros nos farão imortais
- tu e eu.

As estrelas do céu virão contemplar-nos
e nós lhe mostraremos a própria lua
-  tu e eu.

Tu  e eu, não mais separados, fundidos em êxtase,
felizes a salvo da fala vulgar
- tu e eu.

As aves celestes de rara plumagem
por inveja perderão o encanto
no lugar em que estaremos a rir
- tu e eu.

Eis a maior das maravilhas: que tu e eu,
sentados aqui neste recanto, estejamos agora
um no Iraque, outro em Khorassan
- tu e eu.

Nos próximos artigos falarei mais sobre esse grande místico e poeta persa  cujos textos, foram anotados por seus discípulos  em momentos de transe místico do mestre. Assim como acontecia com São João da Cruz, os místicos se perdem no mistério de Deus como uma gota dágua se perde no oceano. Veja, se não vale a pena conhecê-los melhor?

(1) Gaarder, Jostein, O livro das Religiões/ Jostein Gaarder , Victor Hellem. São Paulo, Cia das Letras, 2000 pp 35
(2) Rumi (1207-1273) foi um poeta e mestre espiritual persa do século XIII. Seus poemas adquiriram grande popularidade principalmente entre os persas do Afeganistão, Irã e Tajiquistão.

Rumi nasceu em Balkh, no atual Afeganistão, no dia 30 de setembro de 1207. Seu pai foi um teólogo e pregador islâmico. Entre 1215 e 1220, quando os mongóis invadiram a Ásia Central, Rumi, sua família e alguns discípulos deixaram sua cidade, migrando para terras muçulmanas, incluindo Bagdá, Damasco, entre outras. Depois de peregrinarem para Meca, se instalaram em Konya, na atual Turquia Ocidental.

Em 1231, Rumi se torna discípulo de Sayyed Burhan ud-Din Muhaqqiq Termazi, um dos alunos de seu pai. Com a morte de seu pai, herdou a posição espiritual que ele ocupava. Tornou-se professor e teólogo e pregava nas mesquitas de Konya.

Rumi passou a maior parte dos últimos anos de sua vida em Anatólia, dedicado em terminar sua obra prima do sufismo (sabedoria mística e contemplativa do Islão) “Masnavi”, formada por seis volumes. Escreveu ainda vários volumes de poesias populares. Faleceu em Konya, atual Turquia, no dia 17 de novembro de 1273. https://www.pensador.com/autor/rumi/biografia/ - Consulta em 20/04/19


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