Festa de Casamento
Hoje em dia, as coisas estão mudadas. Não se fazem mais casamentos como antigamente. Não que sejam melhores ou piores, mas, são bem difere...
Hoje em dia, as coisas estão mudadas.
Não se fazem mais casamentos como antigamente. Não que sejam melhores ou
piores, mas, são bem diferentes. Recorro à minha memória para falar de alguns
casamentos que presenciei, no passado, e de alguns “micos” que paguei, durante os mesmos.
Na roça, onde nasci, quase nada
acontecia de diferente. Um casamento, então, costumava ser um grande evento.
Para nós, que mal tínhamos o que comer, um casamento na vizinhança prometia
biscoitos, broas, refrigerantes, doces e muitas outras gostosuras. A gente
ficava torcendo para receber o convite, pois, naquele tempo, não havia
penetras. Sendo convidados, podíamos “tirar
a barriga da miséria”! Lembro-me, do casamento de uma vizinha e algumas cenas
ficaram guardadas comigo. Numa grande mesa, montada no terreiro, especialmente,
para a ocasião, havia um “bolo de noivas,” algo inusitado ao nosso paladar. Ele
era coberto com “suspiros” (1) e em torno deles a gente suspirava mais que a própria
noiva... Naquele dia, não consegui ter acesso ao bolo. Só me restou uns dois "suspiros" espumando brancura.
Geladeira não havia naquele
tempo. Mas, em compensação, os biscoitos variavam em grandes balaios forrados
com panos alvejados. A gente não sabia o que “provar” primeiro. Em dois casamentos que compareci acabei me
engasgando e só agora tenho coragem de contar isso. Certa vez, engasguei-me, com
broa de fubá de canjica. Esse episódio foi no casamento de Conceição, minha irmã.
A festa foi na casa do noivo. A velha casa ficou repleta de convidados e a mesa
prometia! Nunca havia comido uma broa de fubá de canjica. Aquilo era uma verdadeira
tentação! Confesso que até hoje elas me tiram da dieta. Acontece que a iguaria é
muito seca e, facilmente, vai parar no lugar errado. Foi o que aconteceu!
Quanto mais engasgado mais nervoso eu ficava, pois não queria chamar a atenção
de ninguém. Foi um verdadeiro sofrimento público. Ô vida! No dia em que chove
sopa, pobre está com garfo na mão...
No casamento de Lourdes, minha
irmã mais velha, engasguei-me com “bolinha de carne” hoje chamada “almôndega”. Justo
naquela porção, havia um nervinho rebelde às mordidas que foi a causa do meu infortúnio.
Expedito, meu cunhado, e hoje mais do que irmão, sempre foi atencioso e gostava
de agradar as crianças. Melhor que ninguém, ele conhecia nossa mísera condição.
A dele também não era diferente da nossa. No dia do seu casamento, ou na
véspera, convidou-nos, para irmos à sua casa. Nelci, sua irmã, havia cozinhado
uma grande panela com “bolas de carne” ao molho de tomate. A panela era de
alumínio, uma coisa rara naquele tempo. Nunca comi coisa tão gostosa! Mas,
parece que nesses momentos sou meio azarado. Acabei me engasgando de novo, na
frente de todos e, quase morri, de constrangimento e de engasgo mesmo.
No dia da festa tudo era bom e a
gente se esquecia da pobreza. Mas, o que é bom dura pouco! Justo nesses dias, acontecia
de sujarmos a única roupa boa tínhamos. Nesse caso, não havia segunda opção:
Deveria permanecer sujo até a festa acabar! Eu fui uma dessas vítimas. Além do engasgo sujei a roupa nova com molho de tomate...
Minhas duas irmãs se casaram no
mesmo dia e a igreja ficava bem longe de nossa casa. Então, meu pai alugou uma “Rural”
para levar a família. Eram tantos meninos que um caminhão, talvez, fosse mais apropriado
ao transporte. Zezé era muito implicante e só gostava de andar na janela. Isso era
um pé de briga entre nós. Por muito menos a gente brigava. Mas, naquele dia, engoli os desaforos e contentei-me no meu cantinho. Mamãe dizia que quem
andasse na janela acabava vomitando de enjoo. Vomitando ou não, eu já era
enjoado de natureza.
Antes dos casórios minhas irmãs
prepararam seus “enxovais”: Alguns forrinhos de mesas, uma máquina de costura,
algumas peças de cozinha e pronto! Juntando tudo, o enxoval de cada uma, cabia
em duas caixas. Conceição tinha uma sombrinha “furta cor” e morria de ciúmes dela. Acompanhou
sua mudança com a sombrinha aberta embarcada num carro de boi. A felicidade
minha era tanta que não cabia no peito. De alguma forma, perdia duas irmãs, mas
em compensação, tinha mais duas casas para visitar. Lourdes sempre foi boa cozinheira,
mas para fazer doces ninguém ganha de Conceição. Sua geleia com pele de porco faz
a gente esquecer que é pecador!
O tempo passou depressa e minhas
irmãs já são avós. Eu sou tio-avô e trago no rosto, fundas marcas de expressão.
Por dentro, o menino continua vivo e disposto a brincar. Só não brigo mais com
Zezé. Hoje eu o amo como sempre amei. Ele também é avô
e ainda não perdeu seu coração de criança. Somos dois avós que ainda brincamos cada um do seu jeito e cada um pro seu lado... Ô vida boa, gente!
Foto: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Ford_Rural_F75.jpg
Renzo Maia; cropped and adjusted by uploader Mr.choppers
Kkkk ainda quero ver você contando essas histórias. Fiquei lendo e imaginando você narrando. Forte abraço
ResponderExcluirComo é bom, ler seus textos e entrar na história, impossível não sentir se na história. Legal demais.
ResponderExcluirMe emocionei e ao mesmo tempo dei muitas gargalhadas.
ResponderExcluirLer os textos do senhor, sempre me faz sonhar e entrar na história.
Melhor coisa da vida é bolinha de carne com molho de tomate 🍅.
ResponderExcluirLegal demais as lembranças
Rsrs.. nos rimos mt aqui em casa com seus micos padre Geraldo Gabiel...
ResponderExcluirComo é bom seus textos
Boas lembranças... Viajei no tempo casamento de minhas tias...
ResponderExcluirBom demais, ler suas narrativas... reais ou não, a gente se sente integrante da estória e se emociona de diversas formas.
ResponderExcluirEsta estória me fez rir muito...também porque fiquei imaginando a sua risada gostosa ao contá-la! rsss
Ainda de quebra um Adoniran Barbosa que narra passagens do cotidiano do pobre mundo Paulista, cantando e provocando o riso.
Como é bom ler suas histórias padre. A gente para dentro delas.. e passa fazer parte delas. Fico muito agradecida pela sua existência.
ResponderExcluirKkķkķk estou aqui chorando de rir com a broa de fuba e as bolinhas de carne como erá bom este tempo em? Deus abençoe sempre o senhor e obrigado por tudo boa noite kkkkkkkkkk
ResponderExcluirGostei Padre Geraldo
ResponderExcluirMe.fez lembrar do casório de minha irmã fomos umas 20 pessoas num carro deste( arrural) kkkkk
Kkkk estou aqui lembrando das minhas manotas. Como é bom relembrar nossa infância. Viajei com sua história padre.
ResponderExcluirDei boas gargalhadas imaginando a cena. Viajei no tempo, carro cheio de crianças, sem "cinto", apertados, festa de casamento na roça, assim mesmo do jeitinho que descreveu e para completar a lembrança : a "Rural". Meu pai tinha uma e a dirigi um bom tempo...valeu!!!
ResponderExcluirAté hoje existem as famosas bolinhas de carne nos casamentos, acredito que não tão suculentas como antes, mas elas estão lá, e como resistir a essa iguaria rsrs, ler essas crônicas faz viajar no tempo e viver cada instante aqui narrado. Parabéns.
ResponderExcluirNa verdade, o padre Gabriel nos faz dar boas gargalhadas...misto de alegria e lembranças boas!
ResponderExcluirUai Padre, peguei esse tempo de festas regadas de biscoitos... realmente sinto o tempo passando pra mim já.Mas o Senhor passou aperto heim. Ri muito lendo.
ResponderExcluirSaudades.
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