Enxotando abutres

Você, certamente, já passou por muitas provações na vida. O povo costuma afirmar que “desgraça quando vem sozinha é bendita”. Pessoalmente, não gosto de usar essa expressão. Acho que Deus nunca deixa de nos dar uma chuva de graças. Nós, é que nem sempre, percebermos e acolhemos essa chuva.  Mas, infelizmente, é assim: os problemas costumam aparecer juntos ou seguidamente. É explicável. Uma doença gera gastos e, às vezes, endividamento; uma gravidez, antes da hora, costuma gerar pensão alimentícia e desgastes com a justiça. E vai por aí afora. 

Nas horas mais difíceis, algumas pessoas pensam que Deus os abandonou. Para piorar a situação sempre aparecem os abutres: milagreiros, curandeiros e charlatões de toda espécie. Todos prometem cura a “preços módicos”.  A vítima, já enfraquecida pelas provações, em busca de saída, às vezes, embarca mais uma vez... Para ilustrar minhas ideias busco uma passagem bíblica muito curiosa: Gn 15,5-12.17-18. Essa passagem mostra um personagem, Abraão, que tem todos os motivos para não acreditar na Palavra de Deus. Ele, no entanto, permaneceu firme enxotando os abutres, até que Deus se lhe manifestasse em forma de braseiro para firmar com ele uma aliança. 

Abraão estava idoso e desanimado. Não tinha filhos, nem terras. Suas esperanças estavam se esgotando. Deus o convidou a olhar para ao céu e contar as estrelas. A cena é muito bonita. Deus lhe garantiu uma terra boa e uma descendência mais numerosa que as estrelas do céu.  Até aí tudo bem. Então, era preciso selar o trato, ou seja, a aliança. Naquele tempo, não havia cartórios nem carimbos graças a Deus! Então, dividiam alguns animais ao meio e tirava-lhes o sangue para aspersão. Os parceiros passavam por entre os animais divididos e firmavam o negócio. Daí se algum deles “caísse no mato”, poderia ter a mesma sorte dos animais. Bem, acho, que poucos desistiam do pacto firmado nessas situações.  

Abraão dividiu os animais, esperou até se cansar e Deus nada de aparecer. O que apareceram foram abutres para devorar as vítimas esquartejadas. Para piorar as coisas a noite chegou e o sono também. Mas, Abraão manteve-se firme. Afinal, era um homem de fé. Apesar disso, Deus fê-lo esperar bastante. A noite veio e, quando menos se esperava, um braseiro e uma tocha de fogo passaram por entre os animais. Deus fechou o pacto sozinho. No meio da noite escura de Abraão uma luz surgiu para recompensar-lhe a  perseverança. 

Acho esse trecho muito rico de significados. Como é importante perseverar na fé nas horas difíceis! Abutres, certamente, não faltam na vida de ninguém. Temos que espantá-los, quantas vezes forem necessárias. Deus não se esquece de suas promessas. Nossa paciência é que é curta. Nas horas de escuridão não podemos cochilar. Devemos permanecer vigilantes, pois a qualquer momento Deus aparece como um noivo no meio da madrugada. É perigoso deixar escapar essa chance...