Estávamos na fila do médico, um lugar onde a maior virtude é a paciência. Nesses ambientes costumo aprender muito. Lá, somos todos desco...

Estávamos na fila do médico, um lugar onde a maior virtude é a paciência. Nesses ambientes costumo aprender muito. Lá, somos todos desconhecidos e unidos pela dor. Enquanto aguardava a minha vez, abri meu livrinho, coisa que sempre faço nessas horas. Nisso, postou-se ao meu lado, um senhor de meia idade, que também aguardava ser chamado. Ele puxou conversa: - O senhor conhece a Bíblia? – Lá vai embora minha leitura, pensei. – Mais ou menos, respondi, fingindo de bobo e procurando não render conversa. Com certeza, o moço não sabia que eu estava lendo Tereza de Ávila. Aliás, ele nem deveria saber quem dessa tal Tereza. – Eu sou religioso, disse-me ele. Mas, não sigo o Papa de Roma. Comecei a ficar decepcionado. Pensei, inicialmente, que ele me fosse falar de Deus, de seu infinito amor por nós. Mas, qual nada! Queria duelar. Parece que queria discutir comigo sobre quem estava certo ou qual seria o caminho mais curto da salvação. Então, decidi fechar o livro de vez, e me preparei para o debate apologético. Perguntei ao moço: - Quantos asilos ou instituições filantrópicas sua Igreja mantinha ou ajudava a manter. Diante de minha pergunta ele é que se fez de bobo. Ficou calado. Pedi, então, que citasse para mim, o nome de apenas uma pessoa de sua igreja que fosse uma referência nacional, um destaque ético, pois não queria usar a palavra “santo”. Mais uma vez ele se fez de surdo. Supliquei-lhe, então, que ele me falasse do Apóstolo Paulo, de suas viagens e dos livros que escreveu... Após curto espaço de tempo pedi sua opinião sobre a visita do Papa Francisco ao Brasil, e do seu pedido de união entre os cristãos, pois o Papa estava visitando nosso país. Nesse momento, ele levantou-se, apressadamente, e saiu, mesmo antes do atendimento médico. Fiz questão de não me apresentar como padre. Até que gostei da conversa. Tive a oportunidade de falar-lhe do amor de Deus, de sua misericórdia para conosco e dos homens que são verdadeiramente iluminados de nosso tempo. É lamentável que, num mundo tão carente de diálogo, respeito e fidelidade, ainda tenha gente que queira brigar pelo mesmo Deus.
A fila do médico pode ser uma metáfora da humanidade, que caminha meio doente para Deus, o verdadeiro médico, entre os soluços e as lágrimas do presente. Como se não bastassem as dificuldade próprias do existir precisamos criar mais dificuldades ainda, brigando pelo mesmo Deus? Isso não leva a nada. Apenas dá dor de barriga na gente. Nesse caso, não precisamos procurar os médicos. Basta mudarmos de postura...