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quarta-feira, 15 de agosto de 2018

São Vicente: um padre diferente

As notícias corriam soltas, como sempre correram. Quando chega alguém diferente para morar na comunidade, todo mundo fica curioso e quer saber quem é o novo morador. No tempo de São Vicente de Paulo as coisas não eram diferentes. O que havia de singular era a característica da aldeia (Chântillon) e da própria França antes da  Revolução Francesa (1617).

Chântillon era uma terra esquecida por Deus. Mas, essa realidade não se diferenciava muito nas outras aldeias da França, naquele tempo. A população era composta, em sua maioria, de pescadores, camponeses, pequenos negociantes de gado. A maioria “vendia o almoço para comprar a janta”. Vivia-se uma vida dura numa terra fria e coalhada de pântanos. A “alta sociedade” era composta por Huguenotes (Protestantes franceses) o que não significa muita coisa. A Igreja Católica vivia um estado de penúria. Templos abandonados, poucos sacerdotes e padres de pouco zelo pastoral. Em Chãntillon, o templo servia para reuniões públicas. O campanário (torre) era chamado de “reino”, pois fora transformado  em local de orgias.

Depois de longos anos em completo silêncio os sinos repicaram naquele dia. O novo padre estava chegando à Paróquia. Os curiosos dividiam suas opiniões. Cada um queria saber mais que o outro sobre o assunto. Alguns diziam que o novo padre deixou um trabalho nobre junto à uma família rica ( Os Gondi) somente para se dedicar aos mais pobres. Outros viam tudo aquilo com muita desconfiança. Mas, o que há de certo é que o recém chegado agradou a todos. Era um padre diferente. Lavava as  próprias roupas, cuidava da casa, cumpria fielmente uma rotina de orações, celebrava todos os dias, visitava os doentes e dava atenção a todos. Com o tempo essa notícia se espalhou. Até quem andava afastado da Igreja (Mlle. De La Chassagne)  acabou retornando às suas práticas de fé.

Padre Vicente, na ocasião, era robusto, de estatura mediana e possuía uma barbicha no rosto largo e alongado. O nariz se destacava entre olhos pequenos e vivos, protegidos por espessas sobrancelhas. Era brincalhão e tinha um riso fácil no semblante. Sua voz era carregada com o sotaque de sua terra natal. Conseguia, facilmente, ganhar a simpatia das pessoas. Logo em sua chegada ganhou hospedagem na casa de Jean Beynier, um discípulo de Calvino, até que a casa paroquial fosse ajeitada. Depois de algumas semanas estava instalado na casa paroquial juntamente com outros sacerdotes que descobriram o sentido da própria vocação após o contato com Pe. Vicente.

Em pouco tempo Padre Vicente conseguiu atrair a simpatia dos mais diversos grupos de pessoas. Tornou-se amigo dos ceifeiros de milho-miúdo, a quem ele ia ajudar nas terras enxutas, como dos pescadores das enchentes.  Os mais ricos o respeitavam e até os hereges  foram influenciados por ele. Conseguiu, com seu exemplo de pároco, atrair, de novo, à Igreja até aqueles que tinham trocado de fé.

Certa ocasião, quando se preparava para a missa, alguém cochichou-lhe ao ouvido à respeito de uma família inteira em dificuldade numa região pantanosa. Todos os membros da família estavam doentes de tal maneira que um não podia ajudar ao outro. Já não possuíam nada para comer e nem mesmo vestes para se aquecerem. Isso mexeu muito com Padre Vicente. Naquele dia o seu sermão foi bem diferente. Pediu ao povo que tivesse mais sensibilidade com os pobres. Chegou a afirmar que se alguém daquela família morresse por falta de caridade, toda a paróquia seria responsável por aquela morte. Isso mexeu com a assembléia. Na parte da tarde após suas orações Padre Vicente foi ao local visitar a família. No caminho encontrou com muita gente que retornava de lá com os cestos vazios. A Comunidade reagiu aos apelos do padre em favor daqueles pobres abandonados. Naquela mesma noite, Padre Vicente, fez uma reunião com os paroquianos para planejar as próximas ajudas. Estava nascendo ali, a primeira “Confraria das Damas da Caridade”. Com muito senso prático e sem se perder em detalhes, que para nada servem, Padre Vicente, redigiu, de próprio punho, o primeiro estatuto da Confraria. Esse estatuto simples e claro ainda pode ser lido na Igreja de Chãtillon.

Em Apenas cinco meses, Pe. Vicente conseguiu transformar a Paróquia de Chãtillon.  Daquele pântano de heresias, relaxamento religioso, descrença e indiferença, só restaram lembranças. Padre Vicente foi transferido. Mas, seu exemplo ficou grudado nas pedras e nos corações transformados. Ele continuou vivo na memória daquela gente simples que o chamavam, carinhosamente,  de “Monsieur Vincent”.

Fonte Consultada:

Daniel-Rops, Henri, 1901-1965 - A Igreja dos Tempos Clássicos(1). São Paulo: Quadrante, 2000.

2 comentários:

  1. É muito bonito esse exemplo de vida, Oh São Vicente fazei-me semelhante a vós.

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  2. Sua história é de encher o coração, um grande exemplo de homem. 👏👏👏

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