Mitologia Africana: Ossaim

No universo mitológico, o mundo dos “deuses”, não é muito diferente do  mundo dos homens. Os deuses são vaidosos, ciumentos, possessivo...


No universo mitológico, o mundo dos “deuses”, não é muito diferente do  mundo dos homens. Os deuses são vaidosos, ciumentos, possessivos... Essa realidade pode ser constatada também no panteão africano.  Os “deuses” lutam entre si, traem uns aos outros e competem por maior poder.  Deuses, ancestrais divinizados, ou arquétipos idealizados, seja como for, eles, os Orixás, deixaram-nos, as suas narrativas. Hoje falaremos um pouco sobre Ossaim, o Orixá que conhece o poder de cura de todas as ervas.

Bastante curiosa foi a estratégia de Ossaim, para conseguir uma esposa. Conta nos a lenda que um rei queria casar suas três filhas. Mas, só as daria em casamento para o pretendente que adivinhasse o nome delas. Ossaim, que já andava desejoso de casar-se,  transformou-se num belo pássaro e pôs-se a cantar num pé de Obi (noz-de cola), próximo à estrada onde as filhas do rei passariam pela manhã. Seu plano deu certo. Atraídas pela magia do canto, as jovens aproximaram-se da árvore e, enquanto conversavam entre si, revelaram seus nomes: Aió Delê, Omi Delê e Onã Inã. No dia seguinte, Ossaim procurou o palácio e revelou ao rei o nome de suas  filhas. E foi assim, que ele se casou com a filha  mais velha do rei. É por isso, que o símbolo de Ossaim é uma haste de ferro, tendo, na extremidade superior, um pássaro em ferro forjado. Seu instrumento simbólico é um cajado em forma de árvore. 

Ossaim era revoltado com seus pais por ter sido criado sem calças. Por isso, desde jovem, desapareceu na floresta onde cobria seu corpo com as folhas das árvores. Acabou descobrindo o segredo curativo das mesmas. Mas, conhecia também as palavras de encantamento para despertar nelas o poder curativo. Certa vez, Xangô, Orixá da justiça, achou que devia repartir esse poder de Ossaim com os outros orixás. Então, combinou com sua esposa Iansã, Orixá dos ventos, que repartisse as folhas, igualmente, com os demais orixás. Iansã agitou sua saia e a ventania começou tão forte que parecia arrancar tudo pela frente. Ao perceber o plano Ossaim ordenou as folhas que voltassem para seus lugares. E todas elas obedeceram. Ao ver isso, Xangô não o importunou mais. Depois desse fato, Ossaim deu uma folha para cada Orixá, segurando para si mesmo a maior parte dos segredos curativos das ervas. Ossaim conhece o poder de cura e também o poder de envenenamento das plantas.

Por alguma razão Ossaim acabou se tornando escravo de Orumnmilá (Ifá), Orixá do Oráculo (1). Certa ocasião Orunmilá quis fazer uma grande plantação. Cabia a Ossaim a tarefa de roçar o mato. Mas, Ossaim recusava a cortar diversas plantas por conhecer o poder curativo que elas possuíam. Foi então, que o Orixá do Oráculo preferiu ter Ossaim  mais perto de si do que trabalhando na lavoura. Pois, não bastava conhecer o futuro se não conhecia os meios da cura. Essa relação de disputa por saberes, certamente, foi uma realidade existente entre os curandeiros e os sacerdotes de ifá (da adivinhação). Existe ainda outra lenda que mostra a relação entre os sacerdotes e os curandeiros. De acordo com essa lenda Ossaim conhece o uso medicinal das plantas mas, foi Orunmilá que conferiu o nome as mesas. Os poderes das plantas estão ligados ao nome delas e são despertados por palavras pronunciadas na hora do uso. Tais palavras são indicadas pelos advinhos aos curandeiros. Somente assim, a cura acontece.

No campo religioso, Os “filhos” de Ossaim, usam colares de contas verdes e brancas. O dia a ele dedicado é o sábado (em algumas bibliografias, segunda feira) e suas oferendas prediletas contem carne de bode, galos e pombos. Seus “filhos”, normalmente, são pessoas equilibradas e capazes de controlar seus sentimentos e emoções. No sincretismo religioso é cultuado como São Benedito.

Atualmente, cresceu muito, entre nós, o número daqueles que acreditam no poder das folhas para curar as doenças e reequilibrar o organismo. Pelo visto, isso vem de longa data. Nossos ancestrais africanos, indígenas nos deixaram esse legado. Apesar da negação da cultura popular que ainda é fato, ela teima em se fazer presente, para a alegria de muitos outros. Num contexto onde o acesso aos profissionais da saúde é quase impossível outras alternativas se abrem para as pessoas.

Por tudo isso, viva Ossaim!


1 – Orunmilá: Orixá do oráulo (Ifá), pouco conhecido no Brasil. Importantíssimo em Cuba, onde é conhecido por  Orula.

Fontes inspiradoras desse texto:

1- Moura, Clóvis. Dicionário da Escravidão Negra no Brasil. SP. Ed Universidade de São Paulo, 2013.

2- Verger, Pierre-Fatumbi. Lendas Africanas dos Orixás. 4ª edição. Salvador, BA, Corrupio, 1997. pp. 14.

03-__________________ . Orixás, deuses Iorubás, na África e no Novo Mundo. 5ª Edição,

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