Escravidão negra no Brasil: A Árvore do esquecimento
Uma das memórias mais tristes, registrada em nossa história, é a memória da escravidão. Ela denuncia uma realidade cruel, quando milh...

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Uma das memórias mais tristes, registrada
em nossa história, é a memória da escravidão. Ela denuncia uma realidade cruel,
quando milhares de escravos africanos foram arrancados de suas terras para
morrerem, como animais, do outro lado do Atlântico, muitos deles no Brasil.
Num texto que publiquei, anteriormente, mencionei a “Porta do Nunca Mais”, existente na Ilha de Goreia,
situada na Baía de Dacar, capital do Senegal (1). Agora, devo dizer que, existem
na África, dezenas dessas portas, pois os escravos partiram de locais variados
do continente. Em muitos desses locais foram erguidos tais monumentos. Eles
servem para lembrar-se dos quase 12,5 milhões de escravos traficados! Os estudos
mostram que, em três séculos e meio, os navios negreiros realizaram 36 mil
viagens saindo de 188 portos de cativos ao longo do litoral africano (2).
Em Ajudá, litoral do Benim,
embora menos conhecida, também existe a “Porta do Não Retorno”, erguida em
memória de um milhão e homens, mulheres e crianças que partiram daquele local
para uma viagem sem volta. Por essa porta passou o maior número de escravos
rumo ao inferno... Pasme! Um dos maiores traficantes de escravos foi brasileiro
e filho de escrava, pelo que parece. Seu nome: Francisco Félix de Souza.
Francisco era mulato, nascido em Salvador. Ainda jovem, mudou-se para a África
e dedicou-se ao mais lucrativo negócio da época: O comércio de gente! Somente
ele, embarcou para o Brasil, cerca de meio milhão de escravos! Ao morrer em
1848, deixou 53 viúvas, mais de oitenta filhos e 2 mil escravos. Recebeu do rei
Guezo, do Daomé, seu sócio, o título honroso de “chachá”. Ainda hoje ele é
lembrado em Benim. Mas, também com uma descendência dessa não daria para ser,
facilmente, esquecido...
Aos escravos comercializados da
região do atual Benim, estavam reservados estranhos rituais de esquecimento, antes dos embarques nos tumbeiros (navios negreiros). Na estrada que ligava a
praça dos escravos ao porto de embarque, os homens deveriam dar nove voltas em
torno da árvore do esquecimento. As mulheres davam apenas sete voltas. No local, ainda existe um monumento para recordar essas tristes cenas. Manter o monumento
é uma forma de recordar-se, dos milhares de escravos j
Jejes, mandados ao Brasil, principalmente, para a Bahia, nos séculos XVIII e XIX. Apesar de todos os rituais, a memória coletiva teima em não esquecer as brutalidades daquele tempo. A árvore, talvez, tenha morrido de tristeza por ter assistido tantas dores e tantas separações!
Jejes, mandados ao Brasil, principalmente, para a Bahia, nos séculos XVIII e XIX. Apesar de todos os rituais, a memória coletiva teima em não esquecer as brutalidades daquele tempo. A árvore, talvez, tenha morrido de tristeza por ter assistido tantas dores e tantas separações!
A atitude nada republicana, de
Rui Barbosa, que mandou queimar os arquivos da escravidão, para que o estado
não tivesse que pagar indenizações aos antigos donos de escravos (5) também vai na direção do esquecimento forçado.
Ambas as situações, tiveram por objetivo o esquecimento: - Esquecimento da mãe
África e esquecimento dos horrores praticados em nome de progresso econômico.
Aqueles que aqui chegaram perderam não só a identidade. Seus descendentes
perderam até o direito de conhecer as próprias origens com a queima dos
arquivos.
Nossa história não pode ser
esquecida, em que pese, uma onda atual, que
insiste nessa direção. Um povo sem história não é povo; é massa de manobra...
Os colonizadores sabiam disso. Impor uma única língua, uma única crença
religiosa, uma lei era a forma mais eficiente de dominação. O que aconteceram
com tantos povos indígenas que habitavam o Brasil, antes da colonização? O que
aconteceu com tantas línguas que se falava por aqui? Onde foi parar os sistemas
de crenças dessa gente toda? O que sobrou de tamanha diversidade cultural? Será
que ainda é possível salvar o que resta?
Essas perguntas servirão para tirar-lhe o sono... Será?
Fontes:
2-
Informação do banco de dados: Slave Voyages,
citação na página 18 do livro “Escravidão”- Vol 1, de Laurentino Gomes.
3-
BERKENBROCK, Volney, J. A Experiência dos
Orixás. Petrópolis, RJ: Vozes, 1997.
4-
GOMES, Laurentino. Escravidão. Do primeiro
Leilão de cativos em Portugal à morte de Zumbi dos Palmares. Vol 1. RJ: Globo Livros, 2019.
5-
MOURA, Clóvis. Dicionário da Escravidão Negra no
Brasil. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2013 - pág. 65
Excelente texto. A história é a memória de um povo.
ResponderExcluirMuito bonito o texto! Não conhecia esta parte da história dos escravos. Gostei muito. Parabéns!
ResponderExcluirMuito bom, padre. A “alegoria da caverna” de Platão nunca precisou ser tão aplicada como nos dias de hoje. O povo precisa sair da ignorância e conhecer sua história de verdade para não cair nos erros do passado!
ResponderExcluirO Brasil precisa muito resgatar sua memória, sua história.... somos um povo de memória curta. 👍👍👍
ResponderExcluirExcelente texto Padre Gabriel. Muito objetivo, esclarecedor e rico em detalhes. Os números citados são assustadores e nos fazem pensar nos fatos acontecidos em nossa história.
ResponderExcluirLindo texto.O senhor sempre enriquecendo a nossa história.
ResponderExcluirCom a visão ampliada, com certeza, será possível salvar o que ainda resta...É visível o trabalho do Senhor, amigo Padre Geraldo Gabriel, sempre num grande protagonismo de reflexão e salvaguarda dos povos de Matrizes Africanas...Que inspire gerações!
ResponderExcluirNossa história é rica, com a presença de muitos fatos marcantes que protagonizam certa rebeldia com o ser humano! Contudo um entendimento sobre o que se passou nos permite vivenciar com protagonismo o tempo presente! Gratidão a mais esse enriquecimento cultural GG!
ResponderExcluirTorna-se cada vez mais necessário abraçar e proteger nosso povo, nossos livros, nossa história e nossa cultura. Assim como o povo negro teve sua história apagada e as almas marcadas pelas portas e árvores do esquecimento, o Brasil atual continua fazendo a população enfrentar estes símbolos através de um revisionismo histórico desleal e ameaçador.
ResponderExcluirMagnífico texto,eu faço parte dessa história.
ResponderExcluirExcelente texto Pé. Gabriel! Parabéns! Fiquei estarrecida com os números citados. Não tinha conhecimento dessa parte da história dos escravos.
ResponderExcluirParabéns padre..fiquei atordoada com os números que na verdade eram pessoas!
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