Quando Deus se Curva

No capítulo IV do Evangelho de São Marcos há uma cena que me impressiona muito. Trata-se do encontro entre Jesus e uma mulher Cananéia....


No capítulo IV do Evangelho de São Marcos há uma cena que me impressiona muito. Trata-se do encontro entre Jesus e uma mulher Cananéia. O fato aconteceu na região de Tiro, atual Líbano. Jesus, de  propósito, estava em território pagão, juntamente com seus discípulos. Sabemos que o relacionamento dos judeus com os pagãos não era dos melhores. Os samaritanos, por exemplo, eram chamados de “cães”. É preciso dizer também, que para nós, os cães têm um significado bem diferente do que tinha para eles. Temos o cachorro como “o melhor amigo do homem”. Em regra geral, o tratamos bem e gostamos dele. Embora, de vez em quando também chamamos o outro de “cachorro” para ofendê-lo. Aplicado, aos samaritanos, no entanto, esse termo era muito ofensivo. O termo escondia um baita preconceito com aqueles que não faziam parte do “povo eleito”.

            A mulher Cananéia chega perto de Jesus e pede a cura para sua filha que estava sofrendo. Ele quebra todo  protocolo e não se importa com isso. Uma mulher, ainda mais sendo estrangeira, jamais se aproximaria de um judeu. Mas, “quem está com um calo é que sabe onde ele dói”. O “calo” da mulher é a situação da filha. O que não faz uma mãe, quando um filho está sofrendo? Então ela chegou e pediu o milagre. Jesus a responde como qualquer judeu a responderia, certamente. “ “Não é justo tirar o pão da mesa dos filhos e atirá-lo aos cães”. É preciso se perguntar se, de fato, essa foi a resposta de Jesus ou um ranço judaico de quem escreveu o relato. Mas, isso não nos importa e nem importou à mãe. Naquele momento ela não estava para discussões. Sabiamente respondeu: “ Sim, Senhor, não é justo tirar o pão dos filhos, mas os cachorrinhos comem as migalhas que caem da mesa... Em outras palavras ela disse: “ Eu não saio daqui sem as migalhas que tanto preciso!” A reação da mulher fez com que Jesus a atendesse, pois sua oração foi sincera e sua fé muito grande. Note-se que ela chamou Jesus de “Senhor”, esse título revela o quanto ela o respeitou mesmo sem conhecê-lo.
            Existem outras passagens na Sagrada Escritura mostrando que a fé de algumas pessoas arrancou de Deus verdadeiros milagres. No episódio das “bodas de Caná”, por exemplo, (Jo 2, 1-11) Jesus não resiste a uma intervenção de sua mãe pedindo-lhe, solução para a falta do vinho.  Maria percebe o que ninguém havia notado. O vinho estava acabando. Isso seria um vexame, para os donos da festa. Discretamente procura Jesus e, com seu jeito de mãe, apenas diz: Eles não têm mais vinho... É como se dissesse: Por favor, tire-os dessa situação vexatória! Jesus não diz para ela se vai ou não, resolver o problema. Mas, qual filho deixa de atender a um justo pedido de sua mãe? Nesse caso, o pedido de Maria fez com que Deus se curvasse para resolver um problema e garantir a alegria da festa.

            Numa outra ocasião Jesus não resistiu às lágrimas de uma mãe. A viúva da cidade de Naim (Lc 7,11), entre soluços e lágrimas caminhava atrás do enterro de seu único filho. Sorte dela quando o cortejo cruzou com o olhar misericordioso de Cristo. Cheio de ternura e compaixão Jesus parou o enterro, devolveu a vida para o jovem e muito mais, para sua mãe. Ter compaixão é colocar-se no lugar do outro. Jesus sabia do sofrimento das viúvas naquele tempo. Colocou-se em seu lugar e, vendo suas lágrimas, não resistiu: mais uma vez Deus se curvou em favor de seus filhos!

            Não seria possível elencar todas as situações onde Deus se curvou para elevar os homens. Mas, nenhuma me impressiona mais do que a situação do “lava-pés”(Jo 13, 1-17). Fico perturbado só de pensar em Jesus inclinado lavando os pés de seus seguidores. Essa tarefa era reservada aos escravos da casa na hora de receber visitas! Jesus não se preocupou ao rebaixar-se a tal condição. Como se não bastasse tanta grandeza do mistério da encarnação, Ele radicalizou. Chegou a ser menos que um homem; um simples escravo da Galiléia! Isso, de fato é chocante para nossa vaidade humana.  Mas, esse é o nosso Deus! Um Deus que, apesar de toda a onipotência divina, não teme em se curvar para curar a dor de uma simples viúva!

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  1. ..." Não seria possível elencar todas as situações onde Deus se curvou para elevar os homens."

    Na minha vida sou testemunha do quanto Deus nos ama!

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