Escravo não era gente
Infelizmente, parece estar crescendo em nossos dias, algumas posturas extremamente racistas. As estatísticas apontam que morrem mais ...
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Infelizmente, parece estar
crescendo em nossos dias, algumas posturas extremamente racistas. As
estatísticas apontam que morrem mais negros do que brancos; que o desemprego
atinge menos os brancos que os negros e que no item escolaridade os brancos
também levam a melhor. Isso, lamentavelmente é fato. Também é fato atitudes
racista no futebol, na arte e em outras situações. Por causa disso é que
procurei debruçar no estudo do tema: Escravidão. Talvez, a origem dessas
atitudes esteja aí.
O escritor paranaense Laurentino
Gomes, em seu primeiro volume de “Escravidão”, um livro publicado em 2019, nos
oferece um grande leque de informações sobre o tema em questão. Com base nessa
leitura e em outras é que escrevo esse texto. Segundo as pesquisas de
Laurentino, o tráfico negreiro era o maior negócio do mundo até o início do séc
XIX. Na busca pelos escravos os europeus percorriam, aproximadamente, 12 mil km
da costa africana, indo da Mauritânia a Moçambique abrangendo uma faixa de 2mil
km de largura para dentro do território. O auge desse comércio foi em 1780.
Quase todos os países europeus se envolveram com o tráfico de escravos embora
os portugueses e brasileiros foram os maiores comerciantes de escravos ao longo
de quatro séculos de história.
Essa “empresa” criada para
comércio de pessoas envolvia toda uma rede de profissionais: Chefes africanos,
fornecedores de comida, de água, bancos de créditos, seguradoras, banqueiros,
guardadores de escravos... Na economia escravagista havia até mesmo centro de
reprodução de escravos com o objetivo de vender as crianças assim como se fazia
com qualquer animal...
O preço de um escravo variava
muito conforme a época, as condições do escravo, e as habilidades que ele
pudesse ter. Em meados do séc XVIII um
homem adulto, saudável, em boas condições físicas, podia ser comprado em
Luanda, Capital de Angola pelo valor equivalente a 15 chapéus de feltro ou 14
pares de meias de seda, ou três barris de pólvora ou ainda por 23 cadernos. Na
região da atual Nigéria um escravo saudável poderia ser comprado por 80 contas
de búzios ou 45 litros de cachaça. Na região do atual Senegal um cavalo arreado
poderia ser trocado por 14 escravos!
A origem de um escravo costumava
ser levada em conta na hora de sua aquisição: Os angolanos eram considerados
mais dóceis, bons para a lavoura e serviços domésticos. Aqueles adquiridos na
região do atual Benin eram bons na
mineração de ouro e diamantes. Os que viessem da Guiné eram bons para a
pecuária e pastoreio. Os mais valiosos, no entanto, eram as crianças e os
adolescentes, do sexo masculino, com idade entre 10 e 14 anos, ainda imberbes,
saudáveis, sem qualquer sinal de defeito físico. Esses eram chamados de “Peça
da Índia”. Uma peça poderia incluir um lote de dois ou mais cativos de acordo
com a idade, o sexo, ou a condição física inferior à ideal.
O lucro advindo do comércio de
escravos variava muito. Mas, quando esse comércio era feito de maneira
clandestina os lucros eram astronômicos e podia chegar a 300%. As viagens mais
demoradas costumavam ter mais perdas de escravos. Uma viagem de Moçambique ao
Rio de Janeiro poderia durar em torno de 70 dias. Por isso, não era bom negócio
segurar o escravo nem na espera pelo embarque, na África e nem depois que
chegasse ao Brasil. Durante as viagens muitos escravos morriam pela absoluta
falta de condições dignas para esse transporte. A depressão, chamada "banzo" era uma companhia constante do escravizado desde sua saída da África. Por causa dela alguns deixavam de comer. Para que eles não morressem tinham que receber comida à força. O alimento era empurrado diretamente na garganta do escravo com a ajuda de um instrumento chamado "speculum oris".
Os escravos eram considerados uma carga como outra qualquer. No dia 06 de setembro de 1781, o navio inglês “Zong”, de Liverpool, saiu da África rumo à Jamaica com excesso e escravos a bordo. Em 29 de novembro, no meio do Atlântico, sessenta negros já haviam morrido por doenças e pela falta de água e comida. Temendo perder toda a carga antes de chegar ao destino, o capitão Luke Colingwood decidiu jogar ao mar todos os escravos doente e desnutridos. Ao longo de três dias, 133 negros foram atirados da amurada, vivos, para a festa dos tubarões... Houve outro caso de transporte fracassado em 1809 que levou à falência o capitão Felipe Justiniano Costa Ferreira. Na viagem que fez de Moçambique para a Bahia no navio “Flor da Bahia”, morreram 192 de um total de 557 cativos embarcados!
Os escravos eram considerados uma carga como outra qualquer. No dia 06 de setembro de 1781, o navio inglês “Zong”, de Liverpool, saiu da África rumo à Jamaica com excesso e escravos a bordo. Em 29 de novembro, no meio do Atlântico, sessenta negros já haviam morrido por doenças e pela falta de água e comida. Temendo perder toda a carga antes de chegar ao destino, o capitão Luke Colingwood decidiu jogar ao mar todos os escravos doente e desnutridos. Ao longo de três dias, 133 negros foram atirados da amurada, vivos, para a festa dos tubarões... Houve outro caso de transporte fracassado em 1809 que levou à falência o capitão Felipe Justiniano Costa Ferreira. Na viagem que fez de Moçambique para a Bahia no navio “Flor da Bahia”, morreram 192 de um total de 557 cativos embarcados!
Perder escravos não era um bom
negócio. Mas, por causas das péssimas condições do navio negreiro as perdas
eram inevitáveis. Mesmo quando tudo dava certo na viagem as condições de vida
do escravo, no Brasil eram péssimas. A expectativa de vida de um homem
escravizado, ano nascer, em 1872, era de apenas 18 anos e três meses!
Um navio negreiro era uma
combinação de máquina de guerra, prisão móvel e fábrica. Dentro da embarcação
havia um constante clima de guerra. Por isso, era preciso armamento e vigilância
constante. O capitão do navio era a autoridade máxima e podia decidir sobre a
vida de qualquer um dos tripulantes.
No navio negreiro havia muitas
funções: Capitão, médico cirurgião, artilheiros, cozinheiro, tanoeiro (que
fabricava e reparava os barris), e até um padre responsável pela “assistência
espiritual”. Havia também grande número de escravos para ajudar nas viagens.
A “linha de produção” dessa fábrica
flutuante começava no interior da África com a captura ou compra dos cativos.
Depois disso, eles eram transportados por longas distâncias amarrados uns aos
outros. Muitos já chegavam debilitados ao litoral. Nesse local ficavam
aprisionados esperando pelas negociações e embarque. Às vezes, chegavam a
esperar até cinco meses. Nessas prisões comiam uma ração minguada de feijão,
farinha de mandioca e às vezes, um pedaço de peixe. Por todos os lados havia
guardas armados para evitar as fugas.
Antes do embarque cada negro era
batizado e tinha o seu nome mudado. O padre entregava a cada um, um pedaço de
papel com o seu novo nome. Ainda antes da partida cada escravo imobilizado e
marcado com um ferro em brasa. Um único escravo costumava ser marcado mais de
uma vez dependendo das negociações que o envolvia. Aquele que fugia era marcado
de novo com a letra “F” para dizer que ele era um fujão.
O ritual de marcação era
terrível. O “marcador de negros” esquentava um ferro encaixado num cabo de
madeira. Quando estivesse incandescente o escravo era imobilizado com ajuda de
vários assistentes. O local da marcação era coberto com cera e um pedaço de
papel lubrificado com óleo. Assim se evitava que a carne do escravo se grudasse
ao ferro em brasa. A dor era
insuportável e aquela ferida demorava muito para cicatrizar-se. A dor na alma,
certamente, jamais cicatrizava...
O embarque no navio era algo
aterrorizante para os escravizados. Alguns nunca haviam visto um navio, outros
nunca tinham visto o mar. Outros ainda pensavam que os portugueses eram
canibais. Os homens eram colocados na parte de trás do navio e as mulheres na
parte da frente. Essas eram sujeitas à todas as formas de violência. Mas, com
os homens não era diferente. O espaço era tão pequeno que às vezes nem dava
para se mexer. Acorrentados aos pares, perna direita com perna esquerda e mão
direita com mão esquerda, cada escravo tinha menos espaço do que homem dentro
de um caixão escreveu o historiador Eric Williams, sobre um navio negreiro.
Acorrentados dessa maneira os cativos tinham dificuldades para chegar aos
toneis que lhe serviam de banheiros e, por isso faziam as necessidades onde
estavam deitados. O mau cheiro infestava todo o navio. As doenças também eram
frequentes e muitos morriam por causa
delas. O fedor era tamanho que algumas pessoas chegavam a desmaiar. Quando
chovia a situação piorava muito, pois os cativos tinham que ficar o tempo todo
nos porões do navio. A comida e a água
eram escassas. Normalmente serviam-se de sopas, mingaus, pratos cozidos e
angus... Á água costumava estragar durante as viagens e por causa disso muitos
morriam por infecções e disenterias.
Os negros só tomavam um banho
mais caprichado próximo ao desembarque. Isso serviria para melhorar-lhes as aparecias
e serem vendidos com mais facilidades nos leilões.
Os navios negreiros eram um
pedaço do inferno. Grande parte dos cativos quando não morriam adoeciam nessas
viagens. Quando algum cativo ameaçava provocar revolta ele tinha a cabeça
cortada na frente de todos. Havia uma superstição entre os negros segundo a
qual, quem tivesse a cabeça cortada jamais conseguiria regressar à África.
Cientes disso, os capitães não perdiam tempo. Dessa maneira dominavam pelo
terror.
Ainda que alguns neguem os fatos
ou queiram minimizar o que aconteceu, devemos reconhecer que o Brasil tem uma
dívida social com os negros. Foi à custa do suor e do sangue de milhares desses
irmãos que chegamos aqui. Nada mais injusto do que o preconceito e o racismo! Devemos
abominar esse tipo de comportamento. Eles só servem para acentuar ainda mais as
chagas do passado.
Imagem de Mturner por Pixabay
..."Ainda que alguns neguem os fatos ou queiram minimizar o que aconteceu, devemos reconhecer que o Brasil tem uma dívida social com os negros..."
ResponderExcluirObrigada Padre Gabriel por nos mostrar com sabedoria parte dessa História, muito triste e tão real!
Perder o nome, a dignidade a os sonhos... Desumanizados em nome de quê? É muito triste ver que tanta gente ainda desumaniza, desrespeita e trata as pessoas como coisas. De onde vem tanto ódio? De onde vem tanta maldade? É por isso que não basta não ser racista. Na atualidade é preciso ser anti-racista!
ResponderExcluirMuito triste e desumano, mas, REAL!
ResponderExcluir..."Os navios negreiros eram um pedaço do inferno. Grande parte dos cativos quando não morriam adoeciam nessas viagens."...
ResponderExcluirA cada parágrafo uma dor. O último parágrafo uma esperança: um dia essa consciência chegue a toda a humanidade e seja banida da face da Terra qualquer tipo de exploração...
ResponderExcluir....a dor na alma certamente jamais cicatrizava.
ResponderExcluirESSE TEXTO DESPERTA UMA GRANDE INDIGNAÇÃO , MAS SENTIR REVOLTA COM ESSES RELATOS NAO VAI MUDAR A HISTORIA .
O QUE TEMOS QUE FAZER É PUNIR OS RACISTAS E OS PRECONCEITUOSOS. PARABÉNS PADRE POR NOS LEMBRAR DESSE PASSADO TRISTE.
Difícil aceitar tamanha crueldade com nossos irmãos negros,no passado no período da escravidão.
ResponderExcluirMarcação com ferro quente, castigos, trabalhos exaustivos e com punição, alimentação não digna,descasos etc.
Não vejo motivo de tanta diferença pela tonalidade da pele.
No coração se encontra todas as cores !
E com bondade e humanidade ,todas se encaixam neste mundo maravilhoso.
Pensando assim, podemos colorir a vida de forma harmoniosa e pacífica de acordo com nosso coração.
Mas infelizmente existe coração que tem ausência de cores para alegrar outros corações!
A discriminação parece não ter fim!!😔😔