Revelação
“Pertenço de fazer imagens. Opero por semelhanças. Retiro semelhanças de pessoas com árvores, de pessoas com rãs de pessoas com pedras, et...

“Pertenço de fazer
imagens. Opero por semelhanças. Retiro semelhanças de pessoas com árvores, de
pessoas com rãs de pessoas com pedras, etc, etc...” - Manoel de Barros – Livro sobre Nada.
Vou recortar da poesia de Manoel de Barros a expressão: “Retiro semelhanças de pessoas com árvores”.
Isso valeu-me uma reflexão enquanto visitava Pe. Jair, um grande amigo, de
velhos carnavais. Pe. Jair é um excelente cozinheiro e um ótimo anfitrião. Em
sua casa, enquanto esperava o almoço contemplei, pela vidraça, uma enorme árvore
de eucalipto das imediações. Aquele foi um momento de revelação, dessa vez, não
foi debaixo de uma bodhi (figueira) à semelhança de Sidarta e nem foi uma
grande iluminação ao ponto de provocar uma mudança de vida. Às vezes, Deus se
nos revela em conta-gotas, sem sustos ou sobressaltos.
Ao contemplar a grande altura daquela árvore pensei muitas
coisas:
- Como ela conseguia retirar água das profundezas da terra e
subir com ela até ao galho mais alto? Nada escapa à força da lei da gravidade.
Se eu tivesse que subir a água até àquela altura, certamente, iria precisar de
uma bomba muito potente, gastar muito combustível e fazer grande barulho. O
eucalipto, no entanto, fazia aquilo, naturalmente, sem o menor ruído ou
esforço.
- Onde a árvore arranjava tanta força para suportar o peso de
sua copa que, certamente, aumentava muito com o vento?
- Quanto tempo de vida ainda restaria àquela majestade
altaneira?
Algumas pessoas se parecem ao eucalipto. Elas se destacam na
sociedade pela prática do bem e atingem grandes alturas na vida espiritual.
Penso, por exemplo, em Santa Dulce dos Pobres que, na Bahia, que, mesmo frágil,
fisicamente, realizou um grande bem. Estava muito enraizada em Deus, caso
contrário, as ventanias a teriam derrubado, pois, certamente, não lhe faltaram
oposições. Assim como aquela árvore, que abrigava inúmeras vidas, Santa Dulce
acolheu muitos que viveram e ainda vivem à sua sombra.
Naquele instante de revelação, senti uma ponta de inveja do
eucalipto. Ele parecia conversar com as nuvens enquanto acariciado pelo vento.
E naquela manhã cheia de luz, espalhava uma suave fragrância no ar. Que bom seria
se pudéssemos imitá-lo, afinal, quem cresce para cima deve espalhar perfume e
não ódio pelo mundo afora.
“Preciso de obter
sabedoria vegetal”,
dizia, no mesmo texto, o nosso poeta do Pantanal. O eucalipto cresceu,
lentamente, sem ruídos ou estardalhaços. Não seria essa a tal “sabedoria
vegetal” mencionada?
Um dos santos que mais admiro na Igreja é São José. Ele foi
escolhido por Deus para ser o esposo de Maria e o Pai, que o Menino Jesus
conheceu na terra. Foi um santo de grande estatura espiritual e dele, no entanto,
não ouvimos sequer uma palavra. Em seu tempo ele foi uma árvore frondosa que produziu
flores, frutos e perfumes. Desse aroma agradável até hoje nos beneficiamos.
Imagem de Philip Barrington por Pixabay
Apenas mentes e corações sensíveis como o Senhor, o Citado Manoel de Barros e outros escritores, poetas para construir com palavras uma rica reflexão do valor da natureza e os misterios da criação do nosso Deus.
ResponderExcluirGostei, e faz bem sim saborear estes escritos, hoje foi este com o titulo Revelação.