Devaneios
Numa fração de segundos, o paraíso descortinou-se diante de mim. Você sabia que o paraíso se abre a quem percebe as coisas pelo avesso?...

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Numa fração de segundos, o paraíso descortinou-se diante de mim. Você sabia que o paraíso se abre a quem percebe as coisas pelo avesso? Pois é. Uma simples poça de água suja, reflete na superfície todo o encantado do céu! Isso é apenas uma parte do que agora vejo. A superfície do poço, treme nervosamente sob a menor brisa. Parece querer livrar-se da sombra de uma árvore monumental que lhe tira a visão do céu. A poça dágua compete com a árvore cascuda pela posse das alturas. Com seus gravetos ressequidos a árvore parece arranhar o infinito. Diante de mim ela ignorava as especulações de quem precisa pensar para viver. Não conseguia esconder os musgos que lhe denunciavam a idade. Mas, o tempo é mais traiçoeiro e se revela, mesmo quando tentamos negá-lo. Assim, a árvore, certamente não vira quando seu tronco engrossara.
Enquanto pensava, sob a árvore o céu chorou uma chuvinha fresca sobre o poço e desfez a imagem bonita de si mesmo. Feito Buda, continuei pensando sob a árvore, agora ensopada pela chuva. As batidas distantes de um relógio me acordaram para o tempo. Por instantes, pensei ser eterno como a árvore que, certamente, estava ali há anos! Sua permanência centenária e suas toneladas faziam dela uma testemunha ocular da história. Quantas pessoas já se passaram por ali? Quanta ameaça sofrera? Quanta conversa ouvira? No entanto, permanecia imutável, parada como se nada perturbasse seu lado zen. A indiferença às mudanças era seu escudo. Atrás dele defendia sua permanência milenar. Poderia um dia ter sido transformada numa bela mesa de jantar, ou quem sabe, de altar? Talvez fosse melhor que a tivessem transformado em objeto de arte. Mas, ninguém a vira e nem lhe – prestara atenção. O anonimato, que para outro seria desgraça, para ela foi bênção e garantia de vida longa. Agora vivia assim: Abrigava passarinhos e cobria uma poça dáqua, que mesmo apesar de suja, conseguia refletir toda a beleza do céu. Hoje, apenas hoje, deu-me abrigo. Por isso, nasceu esse texto.