John Wu
Recentemente, encontrei um livro, quase que, por acaso, na Livraria da Diocese, e comecei a lê-lo. Logo nas primeiras páginas, vi qu...

https://ggpadre.blogspot.com/2016/08/john-wu.html
Recentemente, encontrei um livro, quase que, por acaso, na Livraria da Diocese, e comecei a lê-lo. Logo nas primeiras páginas, vi que se tratava de uma preciosidade. O livro chama-se: Para além do Oriente e do Ocidente. Foi escrito por John Chiang Hsiung Wu (1899-1986). John Wu é chinês, filho de um comerciante de Ningpo. No livro ele fala de sua vida de forma simples e poética. Wu foi educado nas três religiões da China (Confucionismo, Budismo, Taoismo), mas, converteu-se ao catolicismo sem abandonar a cultura oriental. Teve uma esmerada educação chinesa. Entrou em contato com a cultura ocidental quando estudou Direito nos Estados Unidos e Europa. Na China exerceu brilhante carreira de professor de direito, advogado e Juiz. Deve-se a ele a redação da constituição chinesa e, antes do regime comunista, desempenhou o cargo de ministro plenipotenciário da China junto da Santa Sé. Sua vida mudou-se completamente após ler a autobiografia de Santa Terezinha de Lisieux. Abraçou a fé católica e passou a escrever sobre sua experiência cristã de forma magistral. Vou recortar alguns trechos de seu livro para que o leitor tenha ideia da preciosidade e da profundidade de seus escritos:
Sobre seu nascimento:
Nasci sob o calendário lunar. Foi em Ningpo, na madrugada do décimo sétimo dia, da segunda lua do mês de Chi-Hai (1899) que vim ao mundo; no começo de uma primavera fresca e agradável. Era lua crescente. Essa lua, segundo antigas lendas, transforma as plantas das montanhas em jade. Cada botão, cada folhinha que se desdobrava preparava-se para festejar o sol (...) Foi Deus que escolheu a estação e o dia para eu nascer. Foi Ele quem me chamou das entranhas maternas. E eu estava tão ávido de luz, que, segundo me contaram depois, cheguei antes da parteira.
O Décimo sétimo dia da segunda lua é um ótimo dia de nascimento! Fica exatamente no meio de duas festas populares. No antigo folclore, o aniversário de Lao Tze, cai dia 15; e o aniversário de Kuan-Tyin, a deusa do budismo, dia 19. Assim fiquei eu agradavelmente colocado – como num sanduiche- entre o taoismo e o budismo. Acrescente-se a isso, que a segunda lua é especialmente consagrada à memória de Confúcio. Parece, pois, que as grandes religiões da China se uniram para servir-me de armas espirituais. Tirei proveito de cada uma delas, embora a Luz que por fim me esclareceu tenha sido a do “Verbo que ilumina todo homem vindo a este mundo”(...) O cristianismo é divino. É um erro apresentá-lo como uma religião ocidental. O ocidente é, sem dúvida cristão (e desejo que o seja cada vez mais), mas o cristianismo não é ocidental. Não é nem do Oriente nem do Ocidente, nem antigo nem novo. É anterior ao antigo e mais recente que o novo. É mais fundamental em mim que o taoismo, o confucionismo e o budismo em que nasci. Sou grato a essas religiões, pois foram como que guias que me conduziram ao Cristo. Cristo é a unidade de minha vida e graças a essa unidade posso alegrar-me de ter nascido “amarelo” e crescido “branco”.
Ambição:
Observaram alguns amigos meus, que abandonei minhas ambições, depois que me converti ao catolicismo. Na verdade, sou hoje mais ambicioso do que nunca. Tive a minha parte da glória do mundo e achei-a bastante vã. Será autêntica ambição satisfazer-se com uma glória perecível? O mundo inteiro não me parece digno de ser desejado! A minha única ambição é ser filho de Deus. E essa ambição é accessível a todos, desde que sejam sinceros (...) Desde que a imensa felicidade de ser filho de Deus está ao alcance de toda a gente, que valor pode ter as alegrias humanas quando lhe são contrárias?
Ciência:
Certo dia um vizinho convidou-me para ouvir o fonógrafo que comprara. –“Que desgraça”! - Pensei eu. “Um feiticeiro mau apoderou-se da alma de um morto e fechou-a nesta caixa! E um pobre homem tem de repetir tudo quanto sabe, cada vez que o feiticeiro exerce a sua mágica!” Foram esses os dias mais impressionantes de minha vida. A inocente imaginação de uma criança do Oriente defrontava-se, pela primeira vez, com as invenções da ciência ocidental. A ciência trouxe à luz as maravilhas do universo, mas destruiu o sentido do maravilhoso.
Limpeza: (Sobre a acusação que o povo de Ningpo não tomava banho)
Somos, na realidade, menos sujos do que consideram os estrangeiros. Pessoalmente, prefiro a minha sujeira sadia a uma limpeza débil. Muitas criaturas parecem esquecer que são feitas de lôdo, e que a ele voltarão. A terra materna pouco importará com nossas unhas pintadas.
Pai:
Meu pai chamava-se Chia-Dh’ang. Nasceu em Ningpo em 1847 (...) Sua vida não conheceu tempestades. Mas, se houve homem possuído de paixão da bondade, foi certamente meu pai! (...) Era meio gordo, respirava lentamente e seu sorriso era bondoso e afável. Tinha o coração vasto como o mar – um mar navegável a toda embarcação, menos a navios de guerra e submarinos. Ele criava em torno de si um ambiente celeste. O lema de meu pai foi sempre este: “Ajuda teu próximo, ainda que não tenhas meios para isso”. Como é bom ser filho de um homem bom!
Mãezinha:
Deu-me Deus duas mães: uma que me pôs ao mundo, outra que me criou. À que me deu à luz, chamarei de mãezinha; a que tomou conta de mim, chamarei de mãe. Eu tinha quatro anos quando morreu minha mãezinha com trinta. O espírito de minha mãezinha me ajudou a compreender o Taoismo. O espírito de meu pai me ajudou a compreender Confúcio (...) Ao que parece as últimas palavras de minha mãezinha a meu pai foram mais ou menos estas: “Vim sob o vosso teto para pagar a minha dívida. Deis-vos três filhos. Saldei a dívida e agora vou partir. Cuidai-vos bem.” (...) Só se explicam bem essas palavras pelo budismo, que acredita na migração das almas e na lei de causalidade espiritual. Quando durante a sua vida, um homem é beneficiado por outro, deve retribuir-lhe o benefício numa vida posterior. Assim, quando presta serviços a seu próximo, considera que está pagando uma dívida contraída em outra existência.
Mãe:
Se me perguntarem qual a criatura humana que me foi mais querida, responderei sem hesitar que foi minha mãe de criação. A sua memória foi pranteada por mim como nenhuma outra (...) Quando morreu minha mãezinha, minha mãe de criação já tinha 52 anos e poderia ser minha avó. Ninguém avalia o privilégio que é para um garoto de quatro anos ter uma avó para cuidar dele! A mãe dar-lhe a talvez, palmadas. Mas, a avó, nunca! (...) Aos quinze anos tive uma febre tifoide. Durante vinte dias minha mãe tratou-me sem descanso. Ao fim disso arriou (...) tivera um ataque, sem dúvida em consequência da preocupação e do excessivo trabalho que lhe dera minha doença. Ela sacrificou sua vida para salvar-me da morte. Jamais experimentei tamanha dor. Em lembrança de minha mãe escrevi estas pequenas estrofes:
Foi velando a minha vida
Que ela passou para a outra.
Já que sou teu ó Jesus,
Paga por mim esta mãe.
Quando entrei em Tua Casa
Tua mãe tornou-se minha!
Que a minha se torne tua,
Já que ao meu teto viete!
Em seu livro: Para além do oriente e do ocidente, John Wu, ainda fala sobre os filhos, a esposa e outras experiências do seu itinerário de fé que o conduziu a Cristo. Num outro momento, falaremos sobre isso ( Foto de sua família com o Papa Pio XII)
Imagem de Dimitri Houtteman por Pixabay
Imagem de Dimitri Houtteman por Pixabay