Os filhos do boto
Dentre as tantas lendas maravilhosas que habitam as terras brasileiras, gostaria de lembrar-lhes de uma, que vem da Amazônia. Trata-se d...

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Dentre as tantas lendas maravilhosas que habitam as terras brasileiras, gostaria de lembrar-lhes de uma, que vem da Amazônia. Trata-se da lenda do Boto Rosa, um parente próximo do golfinho. Assim, como as veias irrigam de sangue, as nossas células, a floresta amazônica é fertilizada, abundantemente, pelos rios que banham suas matas e aldeias. A idéia da fertilidade ligada aos rios não acontece por acaso.
Dizem, que em noite de lua cheia, o Boto sai das águas do Rio Amazonas, transformado num lindo rapaz para conquistar as moças ribeirinhas. Ele costuma aparecer às festas da localidade, impecavelmente vestido e, usando sempre um chapéu na cabeça, para disfarçar o orifício que todo boto possui no alto da fronte. Possui uma beleza incomum e bebe muito, sem nunca ficar embriagado. É meigo, sedutor e carrega um magnetismo no olhar capaz de deixar extasiada sua vítima. Uma vez atraída pelo boto, a donzela acaba se apaixonando à primeira vista. Arrastada até à praia mais próxima, é por ele engravidada e abandonada em seguida. Por isso, as mães não se cansam de alertar as filhas para tomarem cuidado com os flertes de desconhecidos durante as festejos. Por trás da figura de um belo rapaz, pode estar escondido, o próprio Boto Rosa.
Os homens, nessas ocasiões, temendo perder suas mulheres armam verdadeiras ciladas ao Boto. Inventam uma dança de roda onde todos devem tirar o chapéu. Se alguém não se aventurar ao gesto é um forte indício de que seja o dito cujo. Mas, ainda que algum cavalheiro não descubra a cabeça, eles costumam fazer vistas grossas. Pois o primeiro a querer agredir o boto certamente foi o último traído pela mulher. Nesse caso, é melhor fingir que não viu nada. Enquanto isso, o Boto vai à cata da próxima vítima que, ansiosamente, espera por ele.
No Amazonas, nenhuma criança nasce de mãe solteira. Quem não tem pai, seguramente é filho do Boto. Perdidamente, apaixonadas por ele, algumas mulheres preferem se afogar no rio a viver com seus antigos maridos. Quem sabe, no fundo claro das águas, não teriam o marido dos sonhos?
Ultimamente, tenho pensado, que o Boto não habita somente as águas do Amazonas. Creio, que em certas épocas do ano, até mesmo o Ribeirão Paciência lhe serve de abrigo. Caso contrário, como explicar o alto índice de crianças com pais desconhecidos aqui por nossas bandas? Pensando nisso, estou na tocaia para ver se algum varão cruza incauto Ribeirão Paciência usando chapéu e gravata. Estou disposto a pagar o mico de tirar-lhe o chapéu. Quero averiguar se o dito cujo tem um furo na cabeça. Mas, não se preocupem comigo. Por sorte sou padre e, portanto, não poderia ser traído pela esposa. Ainda que fosse casado poderia alegar a curiosidade própria de pesquisador da lendas e da mitologia brasileira...