Vicente de Paulo: Um santo no meio das guerras

Cada época da história tem suas características e Deus pede que o testemunhemos dentro de nossa época. Isso não é fácil. Volta e meia ide...

Cada época da história tem suas características e Deus pede que o testemunhemos dentro de nossa época. Isso não é fácil. Volta e meia idealizamos o passado ou o futuro. Mas, o meu compromisso com a fé deve acontecer no presente. Em alguns momentos da história foi muito difícil dar um testemunho de fé. Em épocas de guerras, por exemplo, é difícil até falar de Deus.

São Vicente de Paulo conheceu, melhor do que ninguém essa realidade. O seu tempo foi um período de transição entre o Feudalismo e a chamada “Idade Moderna”. Centenas de pequenos reinos se aglutinavam em torno de um poder mais forte para obterem garantias de sobrevivência. Como se não bastasse essa ebulição política, o cenário religioso piorava ainda mais as coisas.  A Guerra dos Trinta anos (1618 – 1648) escondeu diversos interesses sob o manto do conflito entre Católicos e Protestantes. O protestantismo havia quebrado a unidade religiosa da Europa. De um lado posicionavam os reinos católicos (Áustria, Hungria, Baviera, Espanha, Nápoles e Milão); de outro lado estavam (Inglaterra, Suécia,Dinamarca, Holanda e grande parte da Alemanha). A França, antes de entrar na Guerra ficava espremida entre dois grupos.

Internamente a França também estava dividida por interesses religiosos e políticos. Representando os interesses religiosos católicos, naturalmente, estavam: São Vicente de Paulo, o Cardeal Bérulle, Olier e outros. Os religiosos eram favoráveis à união da França com a Àustria e com os demais reinos católicos. Representando os interesses políticos estavam: O Cardeal Richelieu, Henrique IV, Mazarino e Luís XIV. Esse segundo grupo queriam rebaixar a Áustria enfraquecendo-a com o apoio dos protestantes. Assim, pensavam afirmar a soberania da França diante do Sacro Império Germânico Cristão (Alemanha). Richelieu pensava que o estado deveria ser guiado apenas por decisões políticas sem a interferência da religião.

Henrique IV morreu antes de executar esse plano. Richelieu começou a executá-lo e o Cardeal Mazarino, com astúcia o levou até ao fim. Richelieu ajudou a subir ao trono da Suécia o jovem audaciosos Gustavo Adolfo. Com isso visava atacar a Áustria pelo lado direito. Colocou no trono de Lorena (nordeste da França) o Duque Carlos IV. Com isso visa atacar a Áustria do lado esquerdo, se fosse necessário. Acontece que esse Duque aliou-se com a Áustria. Nesse caso, Richelieu não teve escolha e acabou atacando a Região de Lorena. A Áustria veio em seu socorre e assim a França acabou entrando numa guerra sem fim. Essa guerra visava afirmação de pequenos reinos e garantia de poder. Mas, ocultava-se atrás de uma justificativa religiosa.

Nesse cenário sombrio São Vicente irá atuar feito um leão juntamente com os Padres da Missão e as Filhas da Caridade. A região de Lorena ficou devastada pela guerra. Isso não foi diferente em outras partes. Naquele tempo os soldados devastavam tudo por onde passava: Destruía igrejas, incendiava plantações, estupravam as mulheres, saqueavam tudo o que vissem pela frente... A fome não demorava a aparecer. Junto com a fome vinham as doenças e epidemias. De 1635 a 1643, a região de Lorena foi, literalmente, devastada pela guerra.

Nessa região, São Vicente atuou com bravura e caridade. Chegava a atender cerca de 1.132 faminto que, diariamente procurava alimentação. A fome era tanta, que muitos comiam bolotas de carvalhos e raízes de árvores. Na pior situação até canibalismo existia. Matavam-se uns aos outros para comer as próprias carnes...

Não podendo mais aguentar aquela situação de miséria crescente, São Vicente decide procurar o Cardeal Richelieu, que na verdade, foi o grande responsável pela guerra. Sem medo lançou-se aos pés do Ministro suplicante. Transcrevo o discurso tal qual li, na obra que cito ao final do texto:

 - “ A paz, eminência, dai-nos a paz. Tende piedade de nós e dai-nos a paz!”  Ao que o Cardeal lhe respondeu de forma evasiva: - “ Eu também desejo a paz, mas não depende só de mim!” 

São Vicente saiu desse encontro muito desolado. Nada conseguiu com o poderoso ministro da França. Então, decidiu mendigar-se nas ruas de Paris, tentando arranjar o mínimo de recursos para os abandonados da guerra. O pouco de dinheiro que ele conseguia pedindo esmolas em Paris, fazia milagres! Muita gente escapou da morte por causa desse gesto de profunda caridade. Para que a ajuda chegasse ao destino os desafios eram grandes. As estradas andavam cheias de assaltantes e criminosos. São Vicente encontrou a pessoa certa para correr esses riscos. Tratava-se do Irmão Mateus Regnard. Ele tinha muita habilidade para enganar os ladrões. Certa vez, foi atacado pelas costas e o ladrão exigia que ele lhe desse tudo. Mas, aproveitando de uma pequena distração do ladrão pisou sobre a bolsa de dinheiro atolando-a na lama. Pisou mais fundo para marcar o local e depois buscar a bolsa. Assim enganou o ladrão que pensou que sua vítima fosse doente mental e desistiu dela. Dessa maneira Irmão Mateus conseguiu levar as esmolas que São Vicente havia ganhado em Paris até a região de Lorena.

As dificuldades em Lorena só se aliviaram em 1643, quando os soldados de guerra abandonaram a região, graças a uma intervenção de São Vicente junto às autoridades. Só depois disso ele e seus padres vão atender outras regiões também afetadas pela guerra.

São Vicente de Paulo foi um homem que enfrentou, sem se desanimar, todos os desafios de seu tempo.  Quando não tinha nada para ajudar dividia a própria comida com os famintos conforme você pode ler em seguida:

“Eis o tempo da penitência, por que Deus aflige o seu povo. Não é  nosso dever permanecer de joelhos, diante do altar, para chorarmos os pedados desse povo? Sim; é nossa obrigação; mas, além disso, devemos suprimir alguma coisa em nossa alimentação para socorrê-lo”.

Que São Vicente de Paulo, mestre do amor e da caridade nos ensine a ter um coração misericordioso! – Amém.

Obs: Obra lida para escrever esse texto:
Castro, Jerônimo. Padre. São Vicente de Paulo e a Magnificência de Suas Obras. Petrópolis,RJ. Vozes, 1957 – PP 273 ss.

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