Sita: A mulher que não se queimou na fogueira

O poema épico indiano “O Ramayana” fala da saga do Príncipe Rama, filho de Dasaratha,   Rei de Ayodia, em busca de sua amada que fora r...


O poema épico indiano “O Ramayana” fala da saga do Príncipe Rama, filho de Dasaratha,  Rei de Ayodia, em busca de sua amada que fora raptada por Ravana, uma criatura demoníaca que habitava na Ilha de Lanka. A narrativa é composta de 24 mil versos e um grande leque de pequenas histórias dentro da história principal.

O demônio Ravana raptou Sita durante seu exílio na Floresta Dandaka, aproveitando-se de um momento em que ela encontrava-se sozinha dentro de casa. Isso obrigou Rama a mobilizar todas as forças do céu e da terra para ter sua amada de volta. O que um homem apaixonado não faz para ter a mulher de volta?

Escondida na Ilha de Lanka Sita resistiu bravamente ao seu raptor e de forma alguma quis ter intimidades com ele. Pelo contrário, só pensava em seu marido, pelo menos é isso que a história conta... Depois de muita luta Rama conseguiu resgatá-la. Foi um momento intenso de breve alegria. Pensamentos sombrios logo começaram  a rondar-lhe a cabeça. Será mesmo que Sita teria se preservado para ele durante todo esse tempo? O que nunca falta, em casos assim, são pessoas que colocam lenha na fogueira.

Ao perceber a desconfiança no olhar do marido, Sita tomou uma decisão corajosa. Mandou acender uma pira funerária e comunicou que preferia ser morta pelas chamas que conviver com aquela desconfiança. Naquele tempo, pelo visto, não bastava “por a mão no fogo” para provar inocência... Algumas pessoas tentaram demovê-la daquela ideia maluca. Mas, ela permaneceu irredutível.  Tamanha foi a surpresa de todos quando ela entrou na pira incandescente.  O fogo subiu alto e as chamas lambiam sua pele. Ela, no entanto, parecia nada sentir. Foi então, que seu marido a retomou de volta. Sua inocência foi provada pelo fogo! Isso fez calar as bocas dos linguarudos de plantão e muitos tiveram que pedir perdão das maledicências proferidas contra a rainha.

Após narrar a história de Sita, espero não estar induzindo ninguém a tomar o mesmo caminho. Aliás, é preciso tomar cuidado até mesmo na hora de dizer que coloca a mão no fogo. Conheço um camarada que tentou fazer isso, mas queimou-se todo, antes mesmo de estender o braço. Nesse caso, a situação dele ficou ainda pior. Existem alguns homens tão desconfiados que mesmo se a mulher passasse por isso, ele continuaria a desconfiar-se dela.

Hoje em dia o caminho usual não é mais a pira funerária. A pessoa assume que traiu, mas ao mesmo tempo procura aliviar sua culpa transferindo-a responsabilidade para outro personagem: O “encardido”. Na verdade, parece que Eva foi a primeira a usar desse artifício. Ela só comeu o fruto proibido por causa do encardido daquele tempo, ou seja, a serpente.

Está na moda por a culpa no “encardido”. Essa saída alivia a barra de todos. Ninguém é culpado se houver traição. A culpa é só do encardido. Soube de um caso, que a vítima retirou a queixa da delegacia, mesmo após uma séria denúncia de agressão física. O argumento? – Não foi culpa dele doutor. Foi culpa do encardido! Como não tem como enquadrar tal meliante o caso foi dado por encerrado.

Existe um  final diferente para Sita e Rama em outra versão do Ramayana. Mas, esse outro  final será pretexto para uma nova crônica...

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