Mística: a dor de uma ausência...

Uma das músicas mais lindas de nosso cancioneiro popular nasceu do desejo de filho em homenagear seu pai falecido. “Naquela mesa,” fo...



Uma das músicas mais lindas de nosso cancioneiro popular nasceu do desejo de filho em homenagear seu pai falecido. “Naquela mesa,” foi escrita por Sérgio Bitencout em 1969. Ela canta a dor de uma ausência que acaba se fazendo presente nas coisas mais corriqueiras. É sempre assim. Quem já perdeu o pai se entristece ao ver os objetos que ele mais gostava em vida. A música “Naquela mesa” é bem conhecida. Mas, faço questão que você veja a letra:

Naquela mesa ele sentava sempre
E me dizia sempre o que é viver melhor
Naquela mesa ele contava histórias
Que hoje na memória eu guardo e sei de cor
Naquela mesa ele juntava gente
E contava contente o que fez de manhã
E nos seus olhos era tanto brilho
Que mais que seu filho eu fiquei seu fã
Eu não sabia que doía tanto
Uma mesa num canto, uma casa e um jardim
Se eu soubesse o quanto dói a vida
Essa dor tão doída não doía assim
Agora resta uma mesa na sala
E hoje ninguém mais fala no seu bandolim
Naquela mesa tá faltando ele
E a saudade dele tá doendo em mim
Naquela mesa tá faltando ele
E a saudade dele tá doendo em mim

Naquela mesa tá faltando ele
E a saudade dele tá doendo em mim
Naquela mesa tá faltando ele
E a saudade dele... 

A música não esconde a dor de uma perda. O destaque para o bandolim não é à toa.  Jacob do Bandolim (1918-1969) foi a maior referência brasileira nesse instrumento. Tanto assim, que o “bandolim” acabou sendo incorporado em seu nome. Foi ele quem colocou o bandolim como instrumento solista por excelência. Morreu em 1969, com 51 anos, vitimado por infarto cardíaco ao voltar de uma visita ao amigo e também músico Pixinguinha.

Diante da grande dor de uma ausência alguns homens se desesperam enquanto outros produzem música e poesia... Isso me parece um grande mistério. Talvez, seja esse o mistério que subjaz por trás das grandes experiências místicas. O que é a mística senão a dor de uma grande ausência?

O místico um dia foi surpreendido por um mistério superior, infinitamente, maior do que ele. O profeta Jeremias chegou a reclamar: Seduzistes-me, Senhor; e eu me deixei seduzir! (Jr 20, 7-13). Uma vez, seduzido, não posso mais viver sem vós... Essa segunda parte a gente completa para ele...

Uma vez tendo experimentado toda a beleza do mistério de Deus o místico não sabe mais viver sem a presença desse Amado. São João da Cruz reclamava do “escondimento” de Deus: Onde é que te escondeste Amado, e me deixaste com gemido? Como servo fugiste, havendo-me ferido; saí, por ti clamando e já eras ido... (Canção I).

A experiência desse mistério é tão profunda, é um “beijo na alma”, na expressão de Santa Terezinha, após sua primeira comunhão, que por mais que se esforce o místico não consegue expressá-la:

Há coisas que perdem o seu perfume quando expostas ao ar; há pensamentos da alma que não se podem traduzir em linguagem da terra sem perderem o sentido íntimo e celeste; são como aquela «Pedra branca que será dada ao vencedor, sobre a qual está escrito um nome que ninguém conhece, a não ser aquele que a recebe». Ah! Como foi doce o primeiro beijo de Jesus à minha alma! (História de uma alma, nº 109).

O místico é antes de tudo, um inconformado. Não se conforma em viver longe de Deus. Precisa desse “enamoramento” constante. Vive num constante exílio. O meu coração está inquieto enquanto não se repousar em Deus, dizia Santo Agostinho. Estamos falando de uma relação que só pode ser entendida entre amantes. Vista do lado de fora dessa relação, pode parecer completamente sem sentido. Ouvindo a pregação dos apóstolos alguns presentes pensaram que eles estavam bêbados (Atos 2, 12). De fato, estavam embriagados do amor de Deus. Talvez, seja esse o maior ideal que possa ser desejado por todos nós... Pense nisso!

Imagem de Ri Butov por Pixabay 

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  1. ..." Eu não sabia que doía tanto
    Uma mesa num canto, uma casa e um jardim
    Se eu soubesse o quanto dói a vida
    Essa dor tão doída não doía assim"..

    Saudades eterna de Maria Lúcia, minha irmã!

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