Escravização dos índios no Brasil
O infortúnio de estrear o tráfico de escravos no Brasil, que à época do “descobrimento,” nem tinha esse nome, não foi do negro africa...
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O infortúnio de estrear o tráfico
de escravos no Brasil, que à época do “descobrimento,” nem tinha esse nome, não
foi do negro africano. Foi do indígena. Já em 1511, a Nau Bretoa, de Fernando
de Noronha, atracou em Portugal cm uma carga de papagaios, peles de onça
pintada, toras de Pau-Brasil e 35 indígenas escravizados no Brasil. O
traficante Juan Miguel Dabues vendeu 85 índios brasileiros em Valência, na
Espanha entre 1515 e 1516.
Os estudos mostram que a primeira
carga de escravos a cruzar o atlântico não era de negros e sim de indígenas.
Trata-se dos Índios Tainos (do atual Caribe), capturados em 1492 ou 1493, na atual
República Dominicana, por Cristóvão Colombo e despachados para Sevilha na
Espanha.
Sobre a história da escravidão,
no Brasil, muita coisa precisa ser recontada. Talvez, deixemos de cultuar os
bandeirantes como heróis e desbravadores da nova terra, para ver neles, nada
além, de grandes traficantes de escravos, dispostos a cometer verdadeiros
genocídios em busca de riquezas. Atualmente, está na moda derrubar as estátuas
dos falsos heróis. Visto por esse angulo, temos muitas estátuas correndo perigo...
(1)
Genocídio é a palavra certa
quando se trata de dizimar todo um povo ou agrupamento humano. Foi o que Cristóvão
Colombo tentou na Ilha de São Domingo e atual Haiti. Na referida ilha os
indígenas chegaram a ser declarados extintos num censo de 1802. Mas, isso na
verdade, não passa de um grande mito, pois durante as perseguições na ilha, muitos indígenas se refugiaram nas montanhas.
Quando teve início a inquisição espanhola em 1533, os judeus tiveram que se
converter ao catolicismo para não serem torturados. Isso aconteceu também com
os indígenas no local. Dessa maneira, acabaram-se misturando aos espanhóis. Em 1533,
quando os indígenas escravizados foram “alforriados” pela monarquia espanhola, os
donos dos escravos diziam que eles eram africanos. Dessa forma, os Tainos foram,
simplesmente, “reclassificados” e não dizimados (2).
Uma segunda carga de escravizados
partiu dessa ilha rumo à Espanha por volta de 1494. Dessa vez, levava 400
indígenas escravizados. A metade da tripulação morreu antes de chegar à
Espanha. Acredita-se que Colombo tenha levado, na última década do séc XIV,
cerca de 4 mil cativos!
As grandes navegações portuguesas
eram empreendimentos, extremamente, lucrativos. Por isso, os segredos náuticos
eram guardados a sete chaves. A carta de Pero Vaz de Caminha, por exemplo,
datada, de 1º de maio de 1500, só chegou a ser conhecida, publicamente, três
séculos mais tarde. Enquanto isso, os espiões da coroa “vazavam” seus segredos
por toda a Europa. Em 1501, circulou na
Itália um escrito sobre a terra recentemente descoberta que viria a ser o
Brasil. O escrito de Matteo Cretico, entre outras coisas dizia o seguinte:
Acima do Cabo da Boa Esperança, pra oeste, descobriram uma terra nova,
a que chamam dos Papagaios, porque encontraram ali alguns papagaios com um
braço e meio de cumprimento, de várias cores, dos quais vimos dois... Habitam
essa terra homens nus e formosos...
A carta acima foi considerada o
primeiro documento sobre a “descoberta” do Brasil.
O que aconteceu no Continente
Americano com a chegada dos europeus foi, na verdade, um grande massacre. No
Brasil não foi diferente. Na chegada de Cabral habitava por aqui, cerca de 4
milhões de indígenas. Mais de mil línguas eram faladas nas centenas de tribos
espalhadas pelo território. Em 1808, na chegada da família real ao Brasil os
indígenas estavam reduzidos a 700 mil. Durante o período colonial o Brasil exterminou
cerca de 1 milhão de índios a cada cem anos... Atualmente, os índios
representam meio por cento da população brasileira. Estão distribuídos em 305
povos diferentes que falam 274 línguas, mas só a metade dessa população ainda
vive em aldeias ou reservas indígenas (3).
A escravização dos indígenas não
foi o único motivo para esse genocídio. Outros fatores também contribuíram com
isso: Guerras entre tribos, promovidas pelos colonizadores e choque
epidemiológico, pois muitas doenças ainda não eram conhecidas pelos indígenas:
varíola, sarampo, rubéola, tuberculose, lepra... Entre 1559 e 1562, uma
epidemia de varíola percorreu toda a costa brasileira e somente na Bahia matou
mais de 70% dos índios aldeados pelos jesuítas.
Quando os portugueses chegaram à
Bahia em 1500 todo o Brasil já estava habitado. Estudos arqueológicos apontam
vestígios de ocupação humana, por aqui, há mais de doze mil anos. Povos Tupis,
Tupinambás, Guaranis e outros, habitavam toda a costa brasileira além das
bacias hidrográficas.
A escravização dos índios
começou, no Brasil, desde a chegada dos portugueses. Em 1545, a Capitania de
São Vicente, no litoral paulista, comandada por Martim Afonso de Souza, contava
com aproximadamente 03 mil nativos escravizados, trabalhando em seis engenhos
de açúcar. Mesmo após o início da
escravização dos africanos a captura e comércio de indígenas por mais de cem anos.
Com o passar do tempo, os
colonizadores perceberam que era mais fácil contar com a escravização dos
africanos. Eles não tinham como retornar às suas terras, eram mais resistentes
às doenças e conheciam menos o território. Além disso, os índios poderiam ser aliados,
como de fato, o foram na defesa do litoral ou destruição de quilombos.
O historiador Luiz Felipe de
Alecastro calcula em cerca de 100 mil, os cativos capturados pelos bandeirantes
entre 1627 a 1640. O registro de um grande engenho na Bahia (Engenho Sergipe do
Conde) mostra como a mão de obra escrava indígena foi, aos poucos, sendo substituída
pela mão de obra do escravizado africano:
Em 1574, os cativos africanos representava 7% da mão de obra, enquanto
93% da mão de obra era indígena. Em 1591
a mão de obra indígena só representava 37%. (4)
A escravidão é uma mancha da qual
a humanidade nunca conseguiu se livrar totalmente. O Brasil não fugiu à regra. Foi
com o suor de pessoas escravizadas que os engenhos e demais engrenagens da
economia colonial puderam se movimentar. Tudo isso serviu para enriquecer ainda
mais a coroa portuguesa e a elite econômica nascente. Para entender todos esse processo não basta
confiar na versão oficial da história. “Enquanto o leão não falar, a história terá sempre a versão do caçador...”
Obs: Esse texto foi escrito baseado nas informações do Livro:
Escravidão – Volume 1, de Laurentino Gomes. RJ - Globo Livros, 2019.
1-
O bandeirante Raposo Tavares, por exemplo,
partiu de São Paulo em 1628, com grande número de homens e conseguiu
aprisionar em dois anos entre 40 a 60
mil índios Guaranis que foram aldeados no atual Estado do Paraná.
2-
https://www.nationalgeographicbrasil.com/historia/2019/10/sobreviventes-genocidio-no-papel-indigena-caribe-tainos-extintos-dna
- Consulta em Julho de 2020.
3-
Dados do IBGE, 2010.
4-
Bóris Fausto. História do Brasil, p. 80. Op.
Cit. Por Laurentino Gomes no Livro já citado, p. 129.
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