Profissionais do choro

  O choro é um desses sentimentos que tem a faculdade de provocar, facilmente, uma reação em cadeia. Alguns, por exemplo, choram, simplesmen...

 

O choro é um desses sentimentos que tem a faculdade de provocar, facilmente, uma reação em cadeia. Alguns, por exemplo, choram, simplesmente, quando vêem outros chorando. É o que podemos chamar de "choro solidário". Outros choram como arte de convencimento. Assim, ela chora no velório do marido para convencer os presentes que  amava, de verdade, o falecido... Existem, os que choram  de alegria ou de tristeza. Dizem que o crocodilo chora ao devorar sua presa.  Estando com a boca cheia suas glândulas lacrimais se comprimem. Então, enquanto se alimenta com prazer, chora de dar dó... Esse costume do crocodilo foi adotado com maestria pelos humanos. Recentemente, o Brasil todo assistiu, consternado, o choro de uma deputada pela morte do marido. As investigações, ao que parece, indicaram ela como a assassina...

No antigo Egito, durante os “velórios” as mulheres choravam e arrancavam os cabelos. Erguiam os braços e lamentavam a morte da vítima. Quanto mais rico fosse o morto mais as mulheres se lamentavam e, obviamente, recebiam por isso.  O “sofrimento” dessas mulheres era tanto que, algumas , chegavam ao desmaio... Mais criativos que os egípcios os romanos chegaram a estabelecer uma tabela de preços para esses requintes funerários. Dividiram as profissionais do pranto em duas classes: a "Préfica", paga para cantar os louvores do morto, e a "Bustuária", que acompanhava o cadáver ao local da incineração, pranteando-o, estridentemente. Talvez, elas chorassem, na verdade, por causa desses nomes feios que receberam. O pagamento dessas mulheres custava muitas lágrimas. Dizem que coletavam o liquido num tubo de vidro. O pagamento correspondia ao volume das lágrimas. Em algum pais da África, além de chorar o morto, a família contrata alguns dançarinos para executar uns passos de dança com o caixão sobre os ombros. No Brasil, um grupo tentou copiar isso. Mas, não deu muito certo não.

Na cultura judaica o alarido das mulheres era acompanhado de flautas. No “plano funerário” daquele tempo, incluíam, necessariamente, os tocadores e as choradeiras. As lágrimas corriam em bicas de o defunto fosse rico. Caso, contrário nem choravam. Davam apenas uns gemidinhos...  O pagamento por esse serviço chamava-se “jeira” (geralmente um alqueire de pão). Não era lá grande coisa e, além disso, muitos se negavam a pagar pelo serviço. Nesse caso, o “bradório”, ou choradeira, saia de graça. Sempre houve caloteiros pela história. Imagino que o leitor, bem informado, saiba o que significa a palavra “calote”. É provável que muitas carpideiras em vez de chorar o morto choravam a própria sorte...

No Brasil, não temos a figura da carpideira profissional. O que impera por aqui é a informalidade. No filme  brasileiro “Morte e Vida Severina” a cantora Elba Ramalho desempenha o papel de uma carpideira profissional. Ela canta “incelências” e ganha por isso. Então, a morte para ela, é questão de sobrevivência. É provável que você também conheça homens e mulheres que exerçam, informalmente, essa profissão. Normalmente, eles chegam ao velório, antes mesmo,  do morto. Mais importante, nesse caso, é serem vistos pela família, se possível esboçando um choro ou cara de tristeza. Trata-se de um choro compensador. Dor mesmo, não existe. Recompensa, talvez possa existir. Não custa se esforçar um pouco. Afinal, temos tantos motivos para chorar...

Imagem de Tania Van den Berghen por Pixabay 

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  1. Para mim a melhor interpretação de Morte e vida Severino é uma animação de Miguel falcão que interpreta muito bem a escrita de João Cabral de Melo Neto, feita em preto e branco, muito emocionante, já assisti umas 20 vezes.

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