Dois peixes e cinco pães

 

O Evangelho de São Marcos (Mc 6, 34 -44), mostra-nos, uma situação humanamente, impossível de ser realizada: Alimentar uma multidão com apenas dois peixes e cinco pães!

O relato evangélico não é uma narrativa jornalística. Ela tem mais compromisso com o ensinamento do que com os fatos. Nesse caso, os fatos, apresentados no superlativo, tem uma finalidade pedagógica, ou seja, visam transmitir um ensinamento. E qual seria o ensinamento que essa narrativa da “multiplicação” dos pães quer nos transmitir?

No texto bíblico, encontramos dois modelos de economia: uma humana e outra divina. A humana é baseada em cálculos matemáticos e se funda numa relação de troca. Eu pago e posso ter. O outro modelo de economia contempla a partilha e a solidariedade. Eu recebo sem pagar e devo compartilhar o que recebi.

Diante de um grande “problema” que era alimentar a multidão, os discípulos de Jesus não encontram outra saída a não ser dispensar toda aquela gente faminta. “Dispensar” é um jeito de “lavar as mãos”, não assumir a questão, de fato.  Aparentemente, seria a solução mais simples. Dispensa o povo e cada um dá o seu jeito. É um salve-se quem puder! Mas, Jesus pensa diferente. Ele ordena que o problema seja assumido: - Dai-lhe, vós mesmos de comer! Com os cálculos matemáticos os discípulos retrucam: Não tem jeito! Eles se esqueceram de um elemento muito importante. Jesus estava presente.

Quando Deus está presente os problemas costumam deixar de serem problemas. O povo diz que, “O pouco com Deus é muito e o muito sem Deus é nada”. Nunca vi um ditado mais certo! O pouco que eles tinham eram dois peixes e cinco pães. Mas, Jesus não dispensou esse pouco. É a partir dele que o milagre vai acontecer. Às vezes, precisamos oferecer o pouco que temos para que um grande milagre aconteça! Talvez, o milagre não tivesse acontecido se o dono dos peixes e dos pães tivesse guardado-os, só para si...

Na matemática humana dois mais dois, não passam de quatro. Na matemática de Deus, dois mais dois, pode chegar a quatro mil! Quando Deus é incluído na economia ela se torna milagrosa. Quando Deus não está nela, apenas alguns se beneficiam de tudo, enquanto outros ficam sem nada!

Hoje, temos pouca experiência de gratuidade. Até os presentes que “trocamos” negam essa dimensão, pois se são “trocados” não são de graça! Eu dou para receber e, se possível, levar uma vantagem nessa troca. Talvez, por causa dessa mentalidade mercantil, temos dificuldades em compreender a graça de Deus. Deus não me cobra pela água generosa que cai do céu nem pelo oxigênio que respiro. Mas, a gente cobra do outro até uma casca de banana!

Quem experimentou a gratuidade divina deve se esforçar para sair dessa lógica mercantilista. Deus é sempre generoso conosco, apesar de nossos pecados. O Profeta Isaías, ilustra essa generosidade de Deus quando compara o seu reino com um banquete para o qual todos são convidados: “Ó vós, todos os que tendes sede, vinde às águas, e os que não tendes dinheiro, vinde, comprai e comei; sim, vinde e comprai, sem dinheiro e sem preço, vinho e leite” (Is 55,1).

O Evangelho da “multiplicação” dos pães, na verdade, deveria ser chamado de Evangelho da “partilha” dos pães, pois o milagre sempre acontece, quando nos dispomos a dividir o que Deus nos deu de graça.

Imagem de Philippe Ramakers por Pixabay