O Sentido do Mastro
Quase todo mundo já viu, mas ninguém se pergunta muito sobre o sentido do mastro com a bandeira do santo padroeiro nas nossas festas popul...
Quase todo mundo já viu, mas ninguém se pergunta muito sobre o sentido do mastro com a bandeira do santo padroeiro nas nossas festas populares. Existem rituais que foram tão incorporados em nossa cultura que, simplesmente, são repetidos sem muitos questionamentos. Parte desses rituais acontece em torno do mastro. Na véspera da festa alguém corta a árvore que servirá de mastro. Uma equipe se encarrega de enfeitá-lo. Outra de enfeitar a bandeira do santo. Tudo deverá estar impecável! Na véspera da festa, o mastro é erguido com música, fogos, danças e orações.
O mastro levantado convida para a festa. Colocar bem alto, a imagem do santo padroeiro é uma forma de homenageá-lo e reconhecer a sua importância na vida da comunidade. A bandeira do santo erguida no mastro, informa que ele está presente e aguarda seus devotos. A “fincada do mastro” não acontece de qualquer maneira. Exige certos rituais. Ele é um importante elemento de ligação da terra com o céu. Não dá para olhar a bandeira do santo sem erguer os olhos para o alto... Os devotos entendem que sem esse “casamento” da terra com o céu, a continuidade da vida fica ameaçada. É bom lembrar que grande parte dessas festas, carregadas pela religiosidade popular, tem origem rural, onde a chuva, elemento do céu, é fundamental para fecundar a terra. Os vestígios da agricultura aparecem também em algumas regiões onde os mastros são enfeitados com frutos, flores e ramos verdes.
A imagem do mastro enfeitado com “laranjinha capeta” (Citros limonia), foi muito presente em minha infância. Na noite de São João os vizinhos se juntavam para rezarem o terço e levantarem o mastro. Alguém cortava um bambu para servir de mastro e deixava os galhos salientes na ponta do mesmo. Neles, a gente espetava as laranjinhas que, naquele tempo, não tinham grande serventia. Hoje se sabe o quanto esse “limão cravo” é rico de nutrientes e propriedades medicinais. No dia da festa o azedume da vida se transformava em alegria e o “limão capeta” passava a ser chamado de “laranjinha santa”. Tudo se iluminava ao brilho dos fogos e a correria dos cachorros... Para nós sobrava a fé e a confiança em Deus. O pequeno agricultor, quase sempre abandonado à própria sorte, na maioria das vezes, só pode contar mesmo com a proteção dos santos...
O mastro levantado mostra o santo e aponta para o infinito. Assim, ele se torna um importante símbolo sagrado. Em dias de festa ele representa o eixo da terra e o centro do mundo. Em torno dele a comunidade revigora sua fé e renova as esperanças. Os congadeiros de Pará de Minas, fazem uma grande festa na “fincada” e na “retirada”(descida) do mastro. Os cantos são muito lindos e entoados em grupos ficam mais belos ainda. O puxador do canto entoa o verso principal e o povo reforça no refrão:
Ô bandeirinha, bandeirinha de papel, ô bandeirinha, bandeirinha de papel, a bandeira de Maria sobe agora para o céu...”
Em alguns lugares do Brasil a “puxada do mastro” também é muito valorizada. Enquanto se carrega o mastro os homens dançam e cantam. Todos fazem questão de tocar nele. O mastro adquire um valor sagrado, pois lembra a árvore da vida, a árvore do paraíso. No Maranhão foi registrada uma cerimônia de “batismo do mastro”, um conjunto de rituais que preparam o mastro para o dia da festa.
O mastro lembra também a Cruz de Cristo, Sagrado Lenho que nos trouxe a redenção. Na Comunidade de Trindade, em Pará de Minas, a turma capricha muito na Festa de Santa Cruz e a enfeita toda com fitas coloridas. O quadro é um verdadeiro espetáculo para os olhos!
Certa vez, durante uma Festa do Congado, em Pará de Minas, a chuva caiu forte, bem na hora de levantar o mastro. Ficou difícil demais! Os couros das caixas bambearam e o som ficou choco. Na hora de colocar a bandeira no mastro o encaixe deu problemas e isso segurou, mais ainda, a turma debaixo da chuva. Realizada a manobra, o pessoal já estava em ritmo de saída. Foi então, que alguém deu o alarme: - Voltem, vamos consertar o mastro! Na hora eu não entendi. Só depois percebemos que no calor da hora, ou seja, na molhança da hora, o santo foi erguido de cabeça para baixo. Ô meu Deus! Todo o ritual foi repetido e quando terminou saimos do local totalmente encharcados de água e de bênçãos...
Obs: Esse texto teve como fonte:
Cascudo, Luís da Cãmara 1898 - 1986. Dicionário do Folclore Brasileiro. São Paulo, Global, 2001
Dicionário da Religiosidade Popular de Frei Chico.
Foto em destaque: Arquivo pessoal
A nossa cultura tem que ser cultivada. Parabéns por nos proporcionar conhecimentos. 😍😘
ResponderExcluirNO PRÓXIMO ANO VAMOS ENFEITAR O MASTRO COM LARANJINHA...
ResponderExcluirOBRIGADA POR ALEGRAR NOSSA COMUNIDADE E A MINHA VIDA COM SEUS ENSINAMENTOS.
Nossa... Como temos que prestar bastante atenção nos pequenos detalhes de festas e celebrações religiosas. Obrigada por compartilhar este conhecimento.
ResponderExcluirParabéns Padre Geraldo Gabriel pelo texto. O sr. sempre ajuda aumentar nosso conhecimento.
ResponderExcluirQue maravilha!
ResponderExcluirAdorei saber mais sobre nossa cultura e sobre o significado da levantada do mastro ! Parabéns padre Geraldo por está levando conhecimento e reforçando nossa fé!
Parabéns Pará nosso padre do povo preto...que informações importantes para a nossa cultura...
ResponderExcluir..."A imagem do mastro enfeitado com “laranjinha capeta” (Citros limonia), foi muito presente em minha infância"...
ResponderExcluirQue bom conhecer sobre estes ritos, porque a gente lembra do levantamento do mastro,das músicas, mas eu particularmente não sabia nada disso. Muito valioso!!!
ResponderExcluirQue maravilha é essa cerimônia do levantamento dos mastros sinto saudades quando o senhor estava com a gente
ResponderExcluir..."O mastro lembra também a Cruz de Cristo, Sagrado Lenho que nos trouxe a redenção...
ResponderExcluirOh senhor tende misericórdia de nós
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