Nossa Senhora do Rosário, rogai por nós!
Os meus irmãos do Congado costumam cantar algumas músicas assim: A Senhora do Rosário, foi quem me trouxe aqui(bis), a água do mar é san...
Os meus irmãos do Congado costumam cantar algumas músicas
assim:
A Senhora do Rosário,
foi quem me trouxe aqui(bis), a água do mar é santa eu vim, eu vim, eu
vim(bis)...
Em outra canção dizem o seguinte:
Eu vim de longe, tô
chegando agora. Eu vim de longe, tô chegando agora. Vim trazendo flores pra
Nossa Senhora. Vim trazendo flores pra Nossa Senhora...
Em outra, ainda cantam:
Lá do céu vem descendo
uma coroa, essa coroa vem do reino da glória. Vamos receber ela com festa, meu
irmão, essa coroa é de Nossa Senhora(bis)...
Citei apenas três canções das inúmeras que são cantadas pelos
congadeiros em homenagem à Mãe de Jesus e ao santo rosário. Aliás, eles estão entre os católicos
mais devotos à Virgem, sob o título de Nossa Senhora do Rosário. Mas, de onde
vem essa devoção?
A festa litúrgica de Nossa Senhora do Rosário foi instituída
em 1571, por São Pio V, para agradecer à Virgem Maria pela vitória na guerra
contra os turcos na batalha de Lepanto (Mar Mediterrâneo) no dia 07 de outubro
do mesmo ano. Em 1716 a festa foi estendida a toda a Igreja por Clemente XI e
sua data em 07 de outubro, foi fixada por Pio X. A celebração dessa festa é um
convite para que todos nos dediquemos à oração e à meditação das diversas
passagens da vida de Cristo. Se a festa litúrgica começou em 1571 o costume de
rezar o rosário é bem mais antigo. Ele remonta a São Domingos de Gusmão, Santo espanhol,
nascido em Caleruenga (Reino de Castela) em 1170, cujo dia celebramos em 08 de
agosto.
São Domingos de Gusmão viveu numa época de muitas heresias,
principalmente, no sul da França. Por
isso, fundou a Ordem dos Pregadores (Dominicanos) para ensinar a todos a reta
doutrina e iluminar as consciências com o ensino da Palavra de Deus. Para
vencer os inúmeros desafios do seu tempo, contou com uma arma poderosa: A
oração do Santo Rosário!
Não se sabe ao certo, de
onde vem o nome “rosário,” atribuído a esse tipo específico de fieira de contas.
A devoção medieval a Maria via na Virgem um compêndio de virtudes e um tesouro
de alegrias espirituais que a tornavam semelhante a um “jardim de rosas”. Em
latim da época, “roseiral” se dizia rosarium. Daí talvez, a designação. (1).
O costume de usar um fio de contas, ou pedrinhas, para rezar não é exclusividade dos católicos. Outras religiões também adotaram formas semelhantes de oração. Mas, só no Catolicismo o rosário foi associado à devoção mariana. Para confeccionar esse objeto de oração uma semente muito usada, no Brasil, é chamada de “Lágrimas de Nossa Senhora”. A lenda sobre isso, afirma que ao ver o sofrimento dos negros, durante o período do cativeiro, Nossa Senhora chorou. Das lágrimas de Maria nasceu o “biurá”, planta cujos frutos foram chamados de “Lágrimas de Nossa Senhora”. (2)
As “continhas de lágrimas” então, vem de um capim (Capim
Santo)* e, depois de secas podem ser traspassadas por um fio onde as dezenas são
agrupadas. No intervalo entre elas, usa-se uma semente maior para assinalar a
oração do “Pai-Nosso”. Cada semente indica uma Ave Maria. Assim, em seu conjunto
o rosário concentra duzentas Ave-Marias, ou quatro terços, de 50 Ave Marias,
com os 4 Mistérios: Gozosos, Dolorosos, Gloriosos e Luminosos. Esse último
grupo, os “Mistérios Luminosos” foi um acréscimo, bem recente, do Papa e hoje
Santo, São João Paulo II.
Em Portugal, África e,
sobretudo, no Brasil Colonial e Imperial, a criação das Irmandades ou
Confrarias do Rosário foram muito comuns. Eram associações de leigos com vistas
à divulgação de uma devoção ou realização de alguns trabalhos. Enterrar os seus
mortos, por exemplo, era uma das funções da irmandade dos pretos,
já que os negros não poderiam ser sepultados nos cemitérios dos brancos.(3)
Associada à devoção à Nossa Senhora do Rosário a devoção a
São Benedito também marcou a história do Brasil, principalmente a história dos
negros escravizados. Em 1711 já
encontramos referências a tais festas. (4) São Benedito, morto em 1589, por
causa de sua cor e condição de filho de escravizados, passou a ser considerado,
após a morte, o padroeiro dos negros. Seu culto, no entanto, permaneceu muito
tempo à margem do catolicismo oficial e só mais tarde ele foi canonizado. A
devoção à Nossa Senhora do Rosário, criada por São Domingos foi impulsionada
com o envio de missionários dominicanos à África. Daí a sua introdução e
crescimento progressivo entre os negros escravizados. O culto aos santos negros
ou de virgens negras foi, de início, imposto de fora, ao africano, como uma
etapa da cristianização.
Algumas “irmandades do Rosário” foram registradas também no
Congo, Moçambique e Angola já no Séc XVII.
Foi, exatamente, dessa região (região dos povos bantos) que vieram, para
o Brasil, os primeiros escravos. Daí se pode concluir que parte dos bantos, já era
católica, mesmo antes de aportar na nova terra. (5)
Antes de 1552 já existia no Brasil uma irmandade para os
escravos oriundos da Guiné, na costa ocidental africana. Provavelmente, alguns escravos que vieram
para o Brasil já pertenciam a confrarias ou irmandades do rosário na África.
E como foi que a Virgem do Rosário foi adotada como mãe desse
povo no Brasil? Bom, aqui há um mito de
origem que precisa ser explicado. Esse mito brasileiro está enraizado na
memória de todos os congadeiros com pequenas variações.
Dizem que, certo dia, Nossa Senhora apareceu no mar. Os
brancos tentaram tirá-la de lá e levá-la para suas casas. Mas, o esforço foi em
vão. A santa permanecia imóvel. O pessoal do congado também tentou e não
conseguiu muito sucesso. O pessoal do Candombe e do Moçambique teve sucesso.
Nossa Senhora os acompanhou, aos toques dos tambores, e foi morar com eles na
Senzala. Como mãe dos pobres preferiu habitar com eles e não na Casa Grande. (6)
Por isso, ainda hoje, durante os festejos do Rosário, o grupo que faz o cortejo
da imagem de Nossa Senhora é o grupo de Moçambiqueiros. Na devoção à Nossa
Senhora do Rosário, os diversos grupos (Congado, Moçambique, Vilões,
Marinheiros, Catopés, Candombe...) se unem apesar de suas diferenças. Esses
grupos preservam uma forte influência africana, sobretudo, nos ritmos, nas
danças e cores das vestimentas. Mas, com o tempo, assimilaram também, a
influência indígena e outros elementos como por exemplo, a cultura marítima.
A devoção à Nossa Senhora do Rosário vem de longa data e
carrega muitas histórias conforme se pode perceber. Nem todos conhecem os bastidores
de tal devoção. Mas, isso não importa muito pois, o mais importante é cultivar o
hábito da oração. Quem reza sabe que o rosário, ou terço, não é um objeto de decoração
de pescoço ou pulsos, mas um auxílio na contagem das orações. Através da contemplação
dos diversos mistérios da vida de Cristo, o devoto vai se aproximando cada vez
mais de Deus na medida em que a oração se transforma num hábito diário. Que
Nossa Senhora do Rosário nos abençoe e nos faça aproximar cada vez mais de Deus
através de sua oração predileta!
1, Augras, Monique. Todos os Santos São Bem-Vindos. Rio de
Janeiro, Pallas, 2005, pp 402
2, ------------ pp 45
3, Gomes, Laurentino. Escravidão: do primeiro leilão de
cativos em Portugal à mote de Zumbi dos Palmares, Volume I – Rio de Janeiro,
Globo Livros, 2019 –Pp. 349
4, Bastide, Roger. As Religiões Africanas no Brasil – 1º
Volume. São Paulo, Ed. Da Universidade de São Paulo, 1971. Pp 163
5, http://ggpadre.blogspot.com/2019/10/origem-do-congado.html
6, Lucas, Glaura. Os Sons do Rosário: O Congado mineiro dos
Arturos e Jatobá. Belo Horizonte, MG. Editora da UFMG, 2014 –Pp. 58ss
* Coix lacryma-jobi L. (Origem: Ásia) - Usada há séculos contra doenças reumáticas, inflamações, dores, espasmos, febres, infecções e micoses. Considerada diurética, tônica da vesícula, anti-séptica das vias respiratórias e urinárias e anti-reumática. Nomes populares: capim-de-contas; lágrima-de-nossa-senhora; capim-de-nossasenhora; lágrima-de-santa-maria; capiá; conta-de-lágrimas; capim-rosário; biurá; biuri; capim-miçanga; lágrima-de-jó; adlaí.
https://core.ac.uk/download/pdf/33535431.pdf - BEBENDO NA RAIZ: UM ESTUDO DE CASO SOBRE SABERES E TÉCNICAS MEDICINAIS DO POVO BRASILEIRO
Marília Flores Seixas de Oliveira - TESE DE DOUTORADO. Brasília, DF, 2008, pp 206.
UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA – UnB. CENTRO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL – CDS - Consulta realizada em 07/10/21
Sua bênção padre adorei gostei demais que a Virgem Maria proteja todos nós sou a Lúcia de fortuna de minas
ResponderExcluirÉ MUITO RICO TUDO QUE O PADRE GABRIEL ESCREVE
ResponderExcluirOBRIGADA
Bom dia Pe.Geraldo !!! Estou muito feliz do senhor , com tanta sabedoria passar esses conhecimentos para nós !!! Parabéns !!! N. Senhora do Rosário !! Rogai por nós !!! Eliana Rodrigues , S.José da Varginha !!!
ResponderExcluirNossa Senhora do Rosário, rogai por nós!
ResponderExcluirComo estou feliz por ter sido lembrada em suas bênçãos de hoje...
Grande significado este gesto do Senhor para minha vida.
Nasci neste mês e fui agraciada com este nome por meus pais, tão católicos eram.
Sou sua admiradora de longa data e o senhor sabe disso.
A cada dia, o senhor se supera em conhecimentos a nós emitidos com tanta sabedoria em textos de uma deliciosa leitura.
Grande abraço.
Observação: ainda não consegui acrescentar meu e-mail ao do Anastácio aqui...
Bom dia pe.geraldo!!Quero rezar pelo meu marido José Silvério Peixoto que ta fazendo aniversário hoje 🙏 que nossa senhora do rosário abençoe ele sempre
ResponderExcluirMaria Alice
Bom Jesus do Pará
Aprendi muito ao ler este texto rico em informações. 👏🏻👏🏻
ResponderExcluir"Que Nossa Senhora do Rosário nos abençoe e nos faça aproximar cada vez mais de Deus através de sua oração predileta!"
ResponderExcluir..."A devoção à Nossa Senhora do Rosário vem de longa data e carrega muitas histórias conforme se pode perceber. Nem todos conhecem os bastidores de tal devoção";;
ResponderExcluirNossa senhora do Rosario rogai por nós
ResponderExcluirPadre Geraldo peço sua bênção para toda
ResponderExcluirminha família e todos meus amigos 👐👐👐👐👐👐👐
ResponderExcluirSão bençãos e mais bençãos obrigado por fazer parte da minha vida 🙏🙏
ResponderExcluirMuito obrigada, Pe Geraldo Gabriel, quanta riqueza de conteúdo.
ResponderExcluir