Cheiro de Deus
Quando era criança, lembro-me, que minha mãe tinha algumas colmeias no quintal. Naquele tempo, as abelhas eram mansas e não atacavam as pe...
Quando era criança, lembro-me, que minha mãe tinha algumas colmeias no quintal. Naquele tempo, as abelhas eram mansas e não atacavam as pessoas como atualmente. Não sou entendedor do assunto, mas já me disseram que as abelhas da espécie chamada “Europa” cruzaram com uma espécie africana e acabou gerando esse tipo de abelhas irritadas e nervosas... Ainda me lembro de quando minha mãe capturava novos enxames. Ela esfregava erva-cidreira num caixote de madeira e, ao perceber a revoada dos insetos, punha o caixote no caminho deles e batia palmas. Não sei por que, mas elas costumavam descer todas e enfiarem dentro da caixa. Eram atraídas pelo cheiro e pelos aplausos de minha mãe. Mas, não é sobre abelhas que gostaria de falar. Apenas busco nelas um exemplo para fazer um comentário, à moda de S. Francisco de Sales, que também cita esses insetos com frequência.
No Tratado do Amor de Deus, (1) São Francisco de Sales nos diz que Deus nos atrai com suavidade. Assim como as abelhas são atraídas por determinados aromas nós somos atraídos a Deus, para contemplar esse oceano infinito de maravilhas que é Ele mesmo. São F. de Sales distingue meditação de contemplação. Imagine-se vendo uma coroa. Ela é composta por muitos furinhos, pedras, e penduricalhos. Você pode ver cada coisa, distintamente, ou focalizar no objeto como um todo. Na meditação o devoto procura contemplar distintamente os infinitos atributos de Deus, na contemplação ele foca em um ponto. Vejamos, por exemplo, a Oração do Pai Nosso. Apesar de simples ela é composta de grande riqueza de temas: O reino de Deus, o perdão, as tentações, a necessidade do pão, etc. Cada um desses temas poderiam nos servir na meditação. Mas, bastaria focar-nos na ideia de “Pai” para nos perdermos na contemplação.
A contemplação, no entanto, não
acontece como fruto de nossos esforços nem por técnicas aprendidas. Deus nos
atrai a Ele assim como determinados aromas atrai um enxame de abelhas. A
contemplação se produz desse modo: “A
nossa alma é naturalmente atraída a cada instante, para o bem, que ama como seu
tesouro. Ora sucede algumas vezes que
Nosso Senhor infunde imperceptivelmente no íntimo do coração uma inexplicável e
doce suavidade que atesta a sua presença e então as faculdades, e até mesmo os
sentidos exteriores da alma, por um certo consenso secreto voltam-se para
aquela recôndita parte onde está o amabilíssimo e caríssimo Esposo.”(2)
Chama-nos a atenção essa “doce
suavidade” com a qual Deus nos atrai. Talvez, uma única palavra retirada de um
texto bíblico já seria o bastante para nos elevar e nos introduzir nos
mistérios divinos: “Assim como um novo
enxame de abelhas, ao querer fugir e mudar de lugar, é atraído pelo som que se
faz em qualquer objeto de metal, ou pelo aroma do vinho misturado com mel, ou
ainda pelas emanações de algumas ervas odoríferas, de forma que se deixa
prender pelo engodo dessas doçuras e entra no cortiço que lhe foi preparado,
assim Nosso Senhor, pronunciando alguma secreta palavra do se amor, ou
difundindo os perfumes de seus vestidos, isto é, imprimindo em nossos corações
os afetos das suas celestiais suavidades, e fazendo-lhe sentir a sua
amabilíssima presença,. Chama a si todas as faculdades da nossa alma, e estas
juntam-se em torno dele e nele se fixam como no objeto por que ansiavam”. (3)
Algo semelhante deve ter acontecido com Madalena que chorava junto ao túmulo de Jesus afogada em desespero. Ainda mergulhada no pranto, bastou ouvir o seu nome, pronunciado por quem supunha ser o jardineiro, para que tudo mudasse. Aquele foi o momento em que Deus lhe tocou com suavidade, ao pronunciar o seu nome, e isso lhe permitiu recolher-se aconchegando-se em Deus.
Tocada por Deus a alma tende a
esse recolhimento a que Santa Tereza chamou de “oração de quietação”(4). Quem é
tocado por Deus, naturalmente se recolhe para saborear todas as belezas que lhe
são comunicadas na alma. Exemplo perfeito disso foi Maria, a mãe de Jesus: “Imaginai, Teotimo, quando a Santíssima
Virgem e Senhora nossa concebeu o Filho de Deus, seu único amor. A alma desta
amantíssima Mãe recolheu-se toda junto daquele amantíssimo Menino e porque tão
divino Amigo estava dentro das suas sagradas entranhas, todas as faculdades da
alma se concentraram nela mesma, como santas abelhas dentro da comeia onde está
o mel, e à medida que a divina Majestade, engrandecia e glorificava os louvores
desta infinita e extrema bondade e o seu espírito exultava de alegria dentro do
seu corpo por sentir junto de seu Deus.
Não expandia pensamentos nem afetos fora de si mesma, porque o seu tesouro,
os seus amores e as suas delícias estavam dentro de suas sagradas entranhas”.(5)
Peçamos ao Senhor que nos permita ouvi-lo e sentir os seus toques suaves. Que os seus perfumes possam ser reconhecidos por nós, os seus filhos e ovelhas de seu rebanho. Afinal, se o pastor tem o cheiro das ovelhas elas também devem conhecê-lo pelas emanações de seu aroma carregado de suavidades...
1- Tratado do Amor de Deus. Livro VI
2- Tratado do Amor de Deus, Livro VI, Cap VII.
3- ----------- CapVII
4- Tereza de Ávila. Livro da Vida. Cap 14.
5- Tratado do Amor de Deus. Livro VI, CapVII
Imagem de 👀 Mabel Amber, who will one day por Pixabay
DEVO MUITO AO QUERIDO PADRE GG - CRIATURA LINDA !!!
ResponderExcluirSentir-se tocado pela graça Divina: Eis o verdadeiro caminho da conversão sincera ao Criador de todas as coisas...
ResponderExcluirPADRE GABRIEL É A PESSOA QUE MAIS ME AJUDA COMO ARTISTA - URBANO MEDEIROS
ResponderExcluirQue lindo! Que saibamos sentir o suave perfume de Deus.
ResponderExcluirDeus seja louvado sempre!
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