Inspiração: Toque suave de Deus!

 

Naquele dia, estava sem nenhuma inspiração para pregar, enquanto celebrava um batizado. Mas, na hora da unção, sentindo a suavidade daquele óleo perfumado foi como se eu tivesse presenciado uma manhã de primavera! Cada cristão é chamado, pelo batismo e pela crisma, a espalhar no mundo todo o suave odor de Cristo. Através de um simples perfume Deus me despertou para a grande importância daquilo que eu fazia, de forma meio automática.

São Francisco de Sales afirma-nos que as inspirações que sentimos são os toques suaves que Deus nos envia e nos faz decidir por Ele. Em seu livro (*) ele nos fala dos “atrativos amorosos” de Nosso Senhor que nos auxiliam na vivência da fé e da caridade. Há um “Primeiro movimento que Deus opera em nós, sem nós, que nos excita e desperta do sono do pecado, pois, como poderia pedir o acordar, estando dormindo”?  Por isso, a exemplo de Santo Agostinho, devemos pedir a Deus que Ele nos atraia com sua doçura para que possamos acreditar no seu amor.

Por outro lado, é preciso considerar que, assim como Deus nos inspira, antes mesmo que decidamos por Ele, o mal também nos tenta com suas astúcias. Somos livres para acatar as inspirações divinas ou ceder às tentações do mal. Quando não repelimos a graça (inspiração) ela leva-nos à penitência e ao amor, quando cedemos à tentação nos afastamos de Deus.  

A inspiração de Deus no apóstolo Pedro foi o simples cantar do galo.  Depois de ouvir o canto ele chorou amargamente e, então, sentiu o olhar de Jesus, cheio de doçura, pousando sobre ele.  Aquela inspiração já foi uma graça, pois, “sem a graça não se corre para a graça” (S. Próspero de Aquitânia).

Despertada pela inspiração e movida pela graça a alma acorda como se recuperasse os sentidos depois de um desmaio e então pode murmurar:    -Ai de mim, meu amado, levai-me, eu lhe suplico, e tomai me debaixo dos braços, pois, de outro modo não posso ir (Ct 1, 3); Se me levardes corremos: -Vós ajudando-me com o aroma dos vossos perfumes e eu, com meu fraco consentimento. “O vosso aroma me reforça e revigora até que o bálsamo do vosso nome sagrado (Ct 1, 2), a unção salutar da minha edificação seja derramada em mim...”

A alma humana não teria orado se não fosse excitada. Assim, quanto mais perto do amado (Deus), mais perfumada a alma fica e, sua alegria, torna-se plena ao sentir o bálsamo do amado.  Deus o tempo todo se vale de suaves inspirações para tocar-nos, provocando em nós o desejo de amá-lo e permanecer ao seu lado. É a inspiração celeste que vem a nós e  excita nossa vontade em direção ao amor sagrado. Se não a repelirmos ela nos acompanha, assim como um anjo acompanhou Tobias, preservando-lhe, de todo mal e fortificando-lhe, em sua viagem.

Naquele dia de secura espiritual da minha parte, Deus valeu-se de um simples perfume para fazer brotar em mim um manancial de alegria. Você já pensou que, muitas vezes, Deus usa de sutilezas para tocar em você também? Quando isso lhe acontecer faça como o profeta Samuel que durante a noite, ao ouvir uma voz o chamando seu nome levantou-se prontamente e respondeu: - Fala, Senhor, o teu servo escuta!

Eu não tenho dúvidas que tanto na sua vida quanto na minha, o que não faltam são tentações e, talvez, o desanimo seja uma delas. Precisamos rezar, para que Deus nos livre sempre das tentações e abra nossas almas para acolher suas santas inspirações. Deus costuma ser tão discreto que corremos o risco de não perceber a suavidade de seus toques!  Ele “não cessa de tocar em nossos corações por inspirações, atrativos e movimentos sagrados”(**). Quem sabe, ele não queira tocá-lo, nesse momento, ao finalizar a leitura do texto?

(*) – Tratado do Amor de Deus, Livro II – Cap 21

(**) - ------------- , Livro II – Cap 22

Foto: Arquivo pessoal