Das Dores, mulher de fé

  Ela buscava lenha seca para vender na cidade. Com seu corpo magro e uma foice nas mãos embrenhava-se pelos matos, com pés descalços até ju...

 


Ela buscava lenha seca para vender na cidade. Com seu corpo magro e uma foice nas mãos embrenhava-se pelos matos, com pés descalços até juntar uma bom feixe. Amarrava tudo e colocava sobre a cabeça até chegar à cidade e trocar a lenha por dinheiro.  Naquele tempo, nas pequenas cidades, usava-se muito o fogão à lenha.

Das Dores, era viúva e mãe de cinco filhos ainda pequenos. Lavava, passava com ferro de brasas, cozinhava e, nas horas vagas, carregava lenha para vender. Assim, podia comprar o que lhe faltava para a criação dos filhos. Quase nunca reclamava da vida. Mulher de fé, uma fé simples, herdada de família, criava os filhos sendo mãe e pai ao mesmo tempo.  O seu marido, lavrador, de profissão foi encontrado morto na subida do morro indo para o roçado. No tombo da morte feriu-se no rosto e ralou os braços nos cascalhos da estrada. Sua marmita, já fria, como o seu corpo, foi encontrada cheia de formigas.

Ao saber da notícia Das Dores, não reclamou e buscou forças em Deus para seguir adiante. Agora não tinha mais o companheiro  para ajudá-la na criação da prole. Sabia que o futuro seria ainda mais difícil. No silêncio rezava, pensando que os sofrimentos de Jesus foram, ainda, maiores do que os seus. Por isso, agradecia a Deus por sua vida.  Sentia-se rica ao ver os filhos saudáveis e bonitos. O seu desejo de vê-los na escola e bem encaminhados na vida, aos poucos, ia se realizando. Para manter os filhos aumentou ainda mais o peso dos feixes de lenha! Às vezes, dava duas viagens ou mais para complementar a renda.

O tempo foi passando, lentamente e, com ele, Das Dores foi se consumindo em sua magreza. Os filhos cresceram, casaram e se mudaram. Com ela restou apenas, o caçula que lhe servia de companhia. Com o avanço da idade não conseguia mais buscar lenha e andava ancorada numa bengala feita de bambu. Encarquilhada e com cabelos grisalhos, um dia, Das Dores também partiu. Morreu dormindo feito um passarinho com a consciência, absolutamente, tranquila. Fez o que pode pelos filhos e amigos. Não era estudada nem sabia fazer discursos. Mas, sua vida daria um belo romance, e que romance! Com sua simplicidade e ternura ensinou a todos o que era o amor pois, fez de sua vida um presente para os outros. E não foi, exatamente, isso que Jesus nos ensinou sobre o amor?

Foto de Amar .M: https://www.pexels.com/pt-br/foto/mulher-campo-interior-filiais-14780463/

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  1. Gabriel... Espetacular esse texto. Nos leva a reflexão de que nos nossos momentos de sofrimento e de turbulência, temos que pensar sempre no grande sofrimento de Jesus e ver o quão pequeno é o nosso sofrimento. E Jamais perder a fé e a esperança em dias melhores. Obrigado Gabriel. Forte Abraço!

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  2. Existem muitas das Dores pelo mundo afora... Conheci várias, dentre elas, minha querida mãe!

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  3. Ainda adolescente escrevi um poema cujo título é Lenheira..Sua crônica me restitui à memória uma infância difícil, mas bela, em Itapecerica. Nas lembranças estão as muitas vezes que caminhei ao lado de minha mãe com um feixe de lenha na cabeça.

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  4. Esse texto é um retrato comovente da força silenciosa de uma mulher comum, mas extraordinária, que representa tantas outras mães anônimas do Brasil profundo. A narrativa é delicada e respeitosa, entrelaçando sofrimento, fé e dignidade com uma simplicidade que emociona. Das Dores é símbolo de resistência, daquelas que enfrentam a dureza da vida sem se entregar ao desespero, sustentando a família com o próprio corpo e com uma fé que não faz alarde, mas move montanhas.

    Padre Gabriel valoriza o cotidiano e transforma o ordinário em poesia — ao mostrar que heroísmo também é acordar cedo, carregar lenha, amar sem condições, e envelhecer com o coração em paz. A última pergunta, que faz alusão ao ensinamento de Jesus, fecha o texto com uma chave de ouro, amarrando a história numa lição de amor cristão vivido na prática, e não apenas no
    discurso, chamando atenção ao que é essencial. Parabéns!

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  5. Texto muito verdadeiro e comum de acontecer, já que muitas mulher se fazem forte movida pelo amor à sua prole. O marido da Das Dores morreu, mas assistimos muito abandono de maridos vivos.
    Varias mulheres criaram muito bem seus filhos com muita dignidade, mas é inegável os sacrificios que passaram. E depois dizem ser a mulher o sexo frágil!

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  6. Que saudade da minha mãe agente pequeno ia com ela buscar lenha pra fazer doce e bolinho de feijão pra vender mais Deus levou muito cedo 😞😞

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  7. Padre Gabriel, nesse texto pude encaixar direitinho minha Vó Geraldina, (Dona Dina )que ficou ficou viúva com 4 filhos e criou sua prole com muita dificuldade e a fé em Deus nunca faltou. Lindo texto.

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  8. Simplicidade, coragem, fé.... são inúmeras as qualidades dessa mulher. Ela me fez lembrar da minha mãe. Mulher guerreira e cheia de amor ❤️
    Lindo esse texto 👏 😍

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  9. Mais uma Maria lutadora, fiel a Deus e a família nela confiada. Inúmeras por esse mundo, são assim. O lugar delas, junto de Deus, é carimbado desde a concepção. Poucas seguem outro caminho, contrariando a maioria. Mas mesmo assim, chances de mudar de vida, aparecem a todo momento.

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