Diário de bordo

Recentemente, estive em Belo Horizonte, a Capital de Minas.  Como sou muito caseiro, isso para mim, é uma verdadeira odisséia. Fui de ôn...

Recentemente, estive em Belo Horizonte, a Capital de Minas.  Como sou muito caseiro, isso para mim, é uma verdadeira odisséia. Fui de ônibus, como sempre faço. O espaço do ônibus é um grande laboratório para quem tem interesse pelo ser humano. Tomei o ônibus no ponto e não na rodoviária. Disputei com motos a passarela que liga o Bairro Serra Verde com o Dom Bosco. O tempo prometia chuva. 
No ponto do ônibus puxei conversa com um moço que trabalhava numa granja de frangos.  A mulher ao lado, permaneceu séria com cara de mulher resgatada pelo mercado de trabalho. Será que mulher não pode puxar prosa com homem em ponto de ônibus? Ela respondeu apenas uma de minhas perguntas sem olhar nos meus olhos. Eu perguntei-lhe: - Você (a gente nunca sabe se deve falar você ou senhora com uma mulher...) está esperando o Santa Maria? – Não. Vou com a equipe da Prefeitura. Eu ja havia imaginado que ela seria  funcionária pública. Conversando depois ao celular ela disse que ia pedir ao motorista para “atrasar um pouquinho” e esperar a amiga, pelo jeito, aflita, do outro lado da linha.
Com o funcionário da granja, omito o nome de propósito, falamos sobre o trânsito, sobre os loteamentos (diante de nós estava o loteamento do S. Luís), e falamos mais uma porção de coisas até a chegada do "busão".  Despedi do moço e entrei no ônibus como gente grande. Que beleza! Rumei para a capital. Ao meu lado outro jovem distinto que foi chamado (três vezes!!!) pela namorada em menos de uma hora! Ô marcação, sô! Só poderia ser namoro recente, pensei. Com o tempo o grude perde a cola. Deduzi que fosse a namorada porque ele a chamava de amor ou pelo diminutivo “mor”.  Havia mel em sua boca. Homem apaixonado fica bobo! Cê lembra de Bill Clinton, que quase perdeu as botas por causa da secretária com chapinhas no cabelo?
Em Belo Horizonte continuei minhas anotações de bordo. Peguei o lotação “Vinte zero quatro” (ninguém fala dois mil e quatro!) e pude contar dez pessoas com fones nos ouvidos. Estávamos todos no mesmo barco, na verdade uma arca de Noé e, embora conectados com o mundo,  completamente, desconectados uns dos outros. 
A cidade é o lugar da solidão. Apesar de Niemayer traçar linhas curvas em sua obras para privilegiar o humano, o que prevalece na cidade é o funcional. As ruas são retas para que o trânsito flua. Até o Ribeirão Arrudas, na capital foi coberto para ceder espaço ao trânsito. O Governador de Minas fez proeza. Conseguiu esconder um rio!  

O Bairro Dom Bosco, em Pará de Minas, não tem nenhuma praça ou cantinho onde as pessoas possam se encontrar, as crianças brincarem e os idosos jogarem baralho...  A cidade negou a sua vocação primeira. Ela deveria ser um local de encontros e não de solidão, de cerca elétrica, câmeras, cachorros bravos, uma verdadeira Guantánamo onde nos escondemos. Corremos o risco de sermos encontrados três dias após a morte em nossos apartamentos...
O homem é um ser de relacionamentos. Ninguém consegue viver sozinho. Mas, parece que estamos desaprendendo a relacionar. Veja o caso dos “heróis” do Big Brother. Eles são confinados numa casa e não conseguem viver um dia sem brigar uns com os outros. Em nossas famílias também pode acontecer isso. Nunca tivemos tantos aparelhinhos e recursos de comunicação e nunca tivemos tão isolados. Os pais não conseguem acessar aos filhos e os irmãos não se conectam. Os construtores da Torre de Babel se entediam mais do que nós. Somos habitantes de um mesmo teto, mas cada um no seu mundo. Cada qual no seu canto sofrendo do seu tanto... 
Precisamos, urgentemente, construir pontes de relacionamentos. Alguém terá que se encorajar e dar o primeiro passo.  Nesse sentido, Jesus é um grande exemplo. Veja, como ele se aproximou da Samaritana. Pediu água. Esse pedido foi um pretexto para puxar conversa. Nessa conversa ela encontrou o caminho e depois pode indicá-lo aos outros...

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