Roupas no varal
Sob minha varanda, enquanto a tarde agoniza, vejo as roupas no varal. São peças de mim que, expostas ao vento, revelam minha identi...
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Enquanto escrevo esse texto contemplo o suave balanço das roupas acariciadas pelo vento. Esse vento sem origem, que mais parece uma brisa, toca em cada peça e a torna mais leve. Enquanto beija as roupas sopra minhas idéias. Ele vem de longe e parece brincar com o tempo. Não se envelhece jamais! Vem de eras passadas e vai lamber o futuro ignorando o tempo que a tudo devora. Apenas as roupas no varal testemunham sua discreta presença sem cheiro ou cor. Conversam com ele enquanto matam sua sede de água.
As roupas estão de “cabeça para baixo”. Assim, lembram a precariedade de minha condição. Ainda não sei por que as pendurei assim. Essa forma de ver o mundo me causa tonturas e náuseas. Os bolsos das calças virados pelo avesso lembram-me a orelha de algum animal primitivo. Acho que isso só serviu para amedrontar o vento ou mexer com meus pensamentos...
Sou pesado e nem em sonhos tenho a leveza de minhas roupas. Mas, enquanto elas se secam eu posso voar. Os lençóis são bonitos! Um é listradinho, outro amarelo desmaiado e dois se confundem com o firmamento. Gostaria de subir ao céu nesses lençóis para dispensar o trabalho das nuvens. Não precisaria de cortinha. Simplesmente seria engolido pelo azul do céu em meus lençóis alvejados...
Enquanto vou sonhando vejo os uniformes que também enfeitam o varal. Eles me chamam à realidade e fazem-me lembrar do relógio. O vento cessou e daqui a pouco escurece. Amanhã, as roupas estarão lá do mesmo jeito, se a rolinha deixar. Conservarão apenas um pouco de umidade, um suave presente da brisa noturna...
Imagem de Peggy und Marco Lachmann-Anke por Pixabay
Imagem de Peggy und Marco Lachmann-Anke por Pixabay
Fico admirada padre Gabriel, como o Senhor consegue descrever uma coisa tão corriqueira do nosso dia a dia em uma descrição tão bonita . Imagina uma peça de roupa no varal, para minha pessoa não quer dizer nada. É só uma roupa lavada . Mas o Senhor consegue ver algo a mais, o que é muito bom para nós.Agora quando colocar roupas no varal ,vou me lembrar de sua crônica e, logicamente do senhor. Obrigada. Fátima.
ResponderExcluirA simplicidade da vida colocada no nosso dia a dia com tão lindo texto, obrigada Padre Gabriel!
ResponderExcluirSônia Cruz
Leve e profundo
ResponderExcluir''pesado e nem em sonhos tenho a leveza de minhas roupas. Mas, enquanto elas se secam eu posso voar. Os lençóis são bonitos! Um é listradinho, outro amarelo desmaiado e dois se confundem com o firmamento. Gostaria de subir ao céu nesses lençóis para dispensar o trabalho das nuvens. Não precisaria de cortinha. Simplesmente seria engolido pelo azul do céu em meus lençóis alvejados...'''
ResponderExcluir.." As roupas estão de “cabeça para baixo”. Assim, lembram a precariedade de minha condição. Ainda não sei por que as pendurei assim. Essa forma de ver o mundo me causa tonturas e náuseas. Os bolsos das calças virados pelo avesso lembram-me a orelha de algum animal primitivo. Acho que isso só serviu para amedrontar o vento ou mexer com meus pensamentos..."
ResponderExcluirLindo texto, mim fez lembrar minha infância quando morava na roça
ResponderExcluirMuito lindo.Adorwi.
ResponderExcluirO Senhor nos faz ver td com outros olhos padre Geraldo Gabriel... mt obg
ResponderExcluirEpicuro, a vida nas pequenas coisas.
ResponderExcluirLembrei do livro que o senhor escreveu sombreado as roupas no varal 😍
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