O Candidato

  Zé Trombeta, amansador de burro bravo, era um homem de visão. Com ajuda da sogra conseguiu um grande reconhecimento nas redondezas. A sogr...

 

Zé Trombeta, amansador de burro bravo, era um homem de visão. Com ajuda da sogra conseguiu um grande reconhecimento nas redondezas. A sogra era rezadeira e benzia de vento virado à espinhela caída... No Bairro dos Afogados, onde passou a residir, após o casório, Seu Zé, era conhecido até pelos cachorros da rua. Sua esposa era natural de Ponte Podre, nome popular do bairro “Dr. Floriano Peixoto”. Essas coisas acontecem por todo lado: Assim, Capanema vira “Seringueiras” e Tabatinga “Buracão” e, por aí se vai... O povo sabe simplificar, quando em vez de dizerem, "Complexo Penitenciário Dr. pio de não seio o quê", usa, simplesmente, "Cadeião"... Os nomes solenes são pronunciados apenas de forma oficial ou nos eventos políticos. O povo vive no mundo prático e não num mundo idealizado.

Por causa de sua voz estridente Seu Zé, ganhou dos amigos a alcunha de “trombeta”. No início, ficava um pouco incomodado com o apelido. Com o tempo, nem ele se lembrava mais, do seu nome de batismo: José Pinto Calado! O “calado” herdou do pai. O “pinto” do avô materno. Mas, "piava" sobre esse assunto com ele. 

Um belo dia, alguém enfiou na cabeça do Zé que ele deveria se candidatar à vereador na cidade. Certamente, iria angariar muitos votos e mudar-se de posição. Consultou Lêide Dái, sua esposa e só decidiu pela candidatura, após sua aprovação.  Lêide Dái Calado Silva, esse era seu nome completo, não gostava de política, mas não negou apoio ao marido. Naquele tempo, não havia tantas leis com hoje. Pesquisas eleitorais era um trabalho para os fofoqueiros de plantão. Esses sempre existiram!

Zé Trombeta pintou o cabelo de preto e deu uma apertada nas calças. Disseram-lhe, que isso o faria parecer mais jovem. Mas, ele não estava acostumado com essas modernidades. Por isso, esqueceu-se de pintar o bigode e os cabelos do peito que, teimavam em aparecer nas fotos. Para piorar as coisas as fotos eram em preto e branco. 

Feitos os "santinhos" Zé encarregou-se de espalhá-los pela cidade. A partir de então, seu nome caiu na boca do povo. Sobrou até para Lêide Dái, pois, num panfleto anônimo ela foi chamada de feiticeira. Na crítica acabaram confundindo a filha com a mãe e o "tiro" pegou na pessoa errada.  Mas, Trombeta não ligou muito para isso. Com apoio dos amigos chegou a computar a soma dos votos: Na Ponte Podre, teria cerca de 400 votos, pois lá era a terra natal de Lêide  Dái. Entre os “clientes” da sogra, certamente, teria uns 300. No Bairro do Pito Aceso ele era muito conhecido, e sem querer faltar com a modéstia era até meio famoso. Todos o elogiavam, pois sabia amansar os burros sem uso da força. Daí poderia contar com mais uns cem votos naquela região. Andou pagando umas contas de água e luz para alguns pidões. Não seria possível que lhe negassem um reles votinho. No lombo do burro chegou a carregar cargas para alguns amigos. Esses também não lhe negariam, com certeza. Na fritada dos ovos, seus votos dariam para Elegê-lo com muita folga. Por causa dessa soma passou a agradecer aos eleitores. Para alguns dizia: Olhe, pode ajudar fulano com seu voto porque, segundo os meus cálculos eu já tenho votos de sobra...  Mas, eleitor é um bicho traíra. Costuma acender uma vela para Deus e outra para o diabo esperando recompensa dos dois lados.

No dia da apuração dos votos, Zé Trombeta teve grande surpresa. Na soma só contou com meia dúzia de votos. Para a eleição precisava de, no mínimo, 1500! E o pior é que já havia mandado costurar um terno novo para sua posse na câmara municipal... Nos dias seguintes, cada “eleitor” que ele encontrava pelo caminho, inventava uma história sem pé e sem cabeça, para justificar o voto que não lhe dera.

 Naquele dia seu Zé conheceu, de perto, o que era fingimento. Ao ouvir o resultado da apuração deu um  fez um pequeno muxoxo em sinal de protesto,  pegou Lêide Dái e tomou rumo ignorado. Passou um bom tempo sem aparecer no Bairro dos Afogados. Afogado estava ele. Mergulhado no mar da desilusão. Mas, seu recuo foi apenas estratégico. Não queria ficar dando explicações do fato a ninguém. Na próxima eleição tentaria de novo, se, de novo pudesse contar, com o apoio de Lêide Dái. Ela sim, era a verdadeira musa de sua vida!

Imagem de IgorSuassuna por Pixabay 

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  1. O que mais tem por aqui é gente tipo Zé kkk

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  2. Isso que acontece,com quem se acha que tem o mundo só para si próprio. achou que tinha ganhado demais, ganhou foi nada kkkk Pode esperar que nas eleições desse ano vai ter muito Zé assim.

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