Alma vegetal
Algumas plantas grudaram em mim desde cedo. Hoje, morando na cidade, ainda sinto o cheiro delas. Como se esquecer do perfume dos alecrins,...

Algumas plantas grudaram em mim desde cedo. Hoje, morando na
cidade, ainda sinto o cheiro delas. Como se esquecer do perfume dos alecrins,
sabugueiros, ervas doces e jasmins? Lembro-me, de uma planta com folhas
repicadas e florinhas roxas que minha mãe chamava, carinhosamente, de “Queixo
caído”. O seu aroma de lavanda era mesmo de cair o queixo! Havia ainda, aquelas
plantas aromáticas e selvagens, cujos nomes, nunca soube ao certo, e de cujos
perfumes também não me esqueci.
A “Dama da noite” compensava, com o perfume, sua falta de beleza. O mandacaru fazia o contrário: Com lindas flores noturnas, compensava sua falta de perfume! Com as plantas funciona assim: Cada uma nos oferece o melhor que possui. Como seria bom se também nós aprendêssemos essa lição!
Alguns aromas e sabores sempre me transportam! Posso viajar neles, mesmo
estando há anos luz de cada um! Como se esquecer do cheiro amarelo das marcelas
do brejo e da candura das flores das paineiras?
Eu e Zezé, meu irmão, quando crianças, passávamos boa parte
do nosso tempo subindo nas árvores próximas à nossa casa. Cada um de nós escolhia o galho mais
confortável para nos instalarmos e, daquele mirante natural, poder observar
tudo. Na arte de observar a gente sempre
dava um show! Sabíamos de cada cheiro, cada cor, cada som e cada sabor...
Estávamos mergulhados na natureza até ao pescoço!
Em torno de nossa infância, desfilavam variadas
libélulas, besouros e tanajuras. Quando chegava o mês de agosto as cigarras
disputavam as árvores conosco. Às vezes, “cantavam,” sem pudor, bem debaixo dos
nossos olhos. Meu pai dizia que elas morriam de tanto cantar. E a gente morria de inveja
delas! Mas, na verdade, a maioria morria mesmo era nos bicos dos passarinhos...
O cerrado nos oferecia um cardápio variado: Mama cadelas, araçás, araticuns, gabirobas, juás, muricis e bacupari... O juá do campo fazia a gente sofrer bastante antes de levá-lo à boca, pois seu pé era um espinheiro só! Não sei porque razão ele gostava de florir sobre as taperas e restos de construções. Assim, o que parecia imprestável, prestava-lhe os seus serviços.
O ananás do cerrado era outro fruto que cobrava da gente alto preço para
colhê-lo. Quase sempre, a gente levava muitos espinhos antes de saborear o
fruto, terrivelmente, picante. Esses frutos eram produzidos, milagrosamente,
em terreno seco e ruim. As pitangueiras e os coqueiros produziam quase o ano
todo, mas os pequizeiros, feitos noivas, cobriam se brancas flores ao finais de anos para frutificar em em janeiro. Seus frutos amarelos perfumavam o início de cada ano.
Minha mãe tinha dois pés de “Brincos de Princesa”, no
terreiro da cozinha. Os beija flores desfilavam o dia todo em torno deles. Com
suas penas reluzentes pareciam pequenos arcos- Iris, flutuando no quintal. Era a volúpia da vida, acontecendo debaixo de nossos olhos.
Como se pode ver, a vida foi generosa comigo. Deu-me muitas
coisas sem nada cobrar de mim. Por isso, vivo em ação de graças. Concordo com o
que já foi dito, que o “essencial é invisível aos olhos”. Mas, quem disse que
vi tudo isso, somente com os olhos?
Imagem de dianesgomes por Pixabay - Foto de Mama Cadela, fruto do cerrado
Padre Geraldo Gabriel que maravilha de reflexão, Deus abençoe ao Sr .
ResponderExcluirEste texto me fez viajar em minha infância. Cada detalhe me traz inesquecíveis recordações. Ainda sinto o cheiro e o perfume de cada fruto e plantas. Além do cheiro de comidas, pessoas que já se foram... Viver bem é a arte de ser feliz...
ResponderExcluirMuito do que o senhor relatou faz parte de minha infância também! Parabéns
ResponderExcluirLinda reflexão! Voltei no tempo por alguns minutos.
ResponderExcluirO alecrim me lembra a Serra dos Ferreira, que conheci aos treze anos.
ResponderExcluirQue lindas e ricas lembranças tem o senhor!!!Voltei no tempo de menina na roça e me identifiquei com cada aroma e cada sabor dessas delícias do campo !!!Assim como agora,ao escrever,sentindo um ventinho bom cheirando a flor de jabuticaba....é o tempo!!!!
ResponderExcluirEu mim lembrei de nois eu e meus amigos no pé de amora essa reflexão fez voltar no tempo de criança
ResponderExcluirPadre, o senhor me levou a minhas lembranças e doces lembranças.pena que a geração de emociton e likes não vive isso.
ResponderExcluirQue nostalgia! Chegou a doer o coração de saudades desse tempo!
ResponderExcluirQue lindo de reflexão,ALMA Vegetal!Passa um filme em minha cabeça...quantas histórias lindas vivemos quando criança! Tempo bom que não volta mais! Obrigada Pe,Gabriel por relatar este tempo de infância! Grande abraço
ResponderExcluirQue saudade 😢 Padre Geraldo e ao mesmo tempo tristeza se a gente pudesse voltar só passado , vomoy não podemos resta viver das lembranças o Sr foi muito felizes sua mensagem pois voltamos por uns minutos no tempo que não volta mais
ResponderExcluirOi Padre Grabril Boa tarde suas leituras são maravilhosas mais não tava conseguindo te responder por não saber usar o celular direto meu filho está me ensinado gosto muito de suas reflexão por favor continue a me mandar obrigada que nossa senhora te cubra com seu manto obrigada Raquel
ResponderExcluir..."A “Dama da noite” compensava, com o perfume, sua falta de beleza. O mandacaru fazia o contrário: Com lindas flores noturnas, compensava sua falta de perfume!"...
ResponderExcluirMUITO LINDO ISSO.
..."Minha mãe tinha dois pés de “Brincos de Princesa”, no terreiro da cozinha. Os beija flores desfilavam o dia todo em torno deles. Com suas penas reluzentes pareciam pequenos arcos- Iris, flutuando no quintal. Era a volúpia da vida, acontecendo debaixo de nossos olhos. "...
ResponderExcluir.."Minha mãe tinha dois pés de “Brincos de Princesa”, no terreiro da cozinha. "..
ResponderExcluir..."Minha mãe tinha dois pés de “Brincos de Princesa”, no terreiro da cozinha. Os beija flores desfilavam o dia todo em torno deles. Com suas penas reluzentes pareciam pequenos arcos- Iris, flutuando no quintal. Era a volúpia da vida, acontecendo debaixo de nossos olhos."...
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