Sacudiu a poeira e deu a volta por cima

 

Vou começar minha reflexão de hoje citando o trecho da música “Volta por Cima” de Paulo Vanzolini, sambista de São Paulo. A música foi gravada pela primeira vez em 1962 pelo cantor Noite Ilustrada:

Um homem de moral / Não fica no chão / Nem quer que mulher / Lhe venha dar a mão /

Reconhece a queda / E não desanima / Levanta, sacode a poeira / Dá a volta por cima...

Por alguma razão, essa música me veio à cabeça ao refletir sobre a atitude de Jesus frente à rejeição de seus conterrâneos. Mas, vamos com mais calma:

Após passar por um “retiro espiritual” no deserto, cheio do Espírito Santo Jesus resolveu visitar Nazaré, sua terra ((Lc 4, 24-30). Cientes da fama do conterrâneo, famoso por seus milagres, o povo de Nazaré estava ansioso para ver “sua atuação”. Pelo visto, queriam milagres sob encomenda, como quem paga para ver um número de circo. Infelizmente, ainda hoje temos pessoas assim. São elas que lotam os auditórios das “Igrejas eletrônicas” para verem as últimas novidades em termos de milagres televisivos... Nesse campo acontece de tudo: Expulsões de demônios, curas espetaculares, depoimentos miraculosos... Cada qual costuma ser mais original nessa área. Deus atende prontamente a qualquer ordem do líder religioso. O milagre cai assim que a ficha é colocada. A ficha nesse caso costuma ser uma nota de cem!

Jesus decepcionou os seus conterrâneos. Além de não fazer ali nenhum milagre, colocou-se na mesma linha dos antigos profetas, igualmente rejeitados por Israel. Citou Elias, profeta perseguido pelo Rei Acab, que também era seu conterrâneo. A viúva estrangeira o acolheu melhor do que o seu próprio povo; Citou também Elizeu que curou um leproso estrangeiro, Naamã, mas não curou nenhum leproso de sua terra... E terminou seu discurso com uma reclamação: Nenhum profeta é bem recebido em sua própria pátria...

Jesus estava cheio do Espírito Santo, mas os seus conterrâneos estavam cheios de ódio. Por isso, o expulsaram da cidade e pretendiam arremessá-lo num precipício. Mas, Jesus “sacudiu a poeira, deu a volta por cima”, e continuou o seu caminho!

No Livro do Levítico (Lv 16,10), temos o relato sobre a celebração do “Dia da Expiação”, Yom Kippur, uma celebração que se tornou tradicional em Israel. Nesse dia, após uma série de rituais, escolhia-se um bode sobre o qual o sacerdote rezava como se transferisse ao animal os pecados do povo. Em seguida o “bode expiatório” era empurrado para morrer no  deserto ou no precipício”. O diabo também havia sugerido que Jesus pulasse do pináculo (o ponto mais alto) do templo (Lc 4, 9), pois, sendo Deus deveria, naturalmente,  ser protegido pelos anjos para não se ferir...

Apesar dessa “boa acolhida” de seus conterrâneos ainda não era a hora de Jesus se entregar na Cruz feito “Cordeiro Salvador” de seu povo. Por isso, seguiu adiante cumprindo tudo o que fora planejado pelo Pai. A “hora de Jesus” ainda não havia chegado e não seria pelo desejo de seus conterrâneos que ela seria apressada. Jesus não ficou na poeira nem reclamou de nada. Simplesmente seguiu seu caminho. Isso pode ser uma grande lição para todos nós.

Imagem de Ri Butov por Pixabay