Adoração dos Magos

 

“Quando nada acontece, há um milagre que não estamos vendo”. Essa frase é de Guimarães Rosa, do seu conto: O Espelho. Gostaria de usá-la para falar um pouco sobre a busca dos Reis Magos pela gruta de Belém. Sei que a Bíblia não é um livro de história embora possamos encontrar elementos históricos registrados por ela. A preocupação dos Evangelhos é mais catequética do que histórica. Com seus relatos visam transmitir-nos os ensinamentos de fé.  No caso, dos Reis Magos, por exemplo, impressiona-me, a disposição com que buscaram o local indicado pela estrela.  O céu sempre esteve repleto de estrelas e ninguém notaria qualquer mudança em sua composição estelar. Mas, “quando nada acontece, há um milagre que não estamos vendo”. Os Magos viram. E não apenas viram. Por causa do brilho singular daquela estrela deixaram tudo e foram de encontro ao novo rei nascido.  Quantos não viram e nada perceberam? Para muitos, Jesus não passou de mais uma criança pobre que nasceu em Belém de um casal igualmente pobre que nunca ocupou espaço nas redes sociais daquele tempo.

Chegando a Jerusalém os Magos não perguntaram pelo recém-nascido, mas pelo local do seu nascimento. Do nascimento eles já tinham certeza. Uma certeza que vinha de dentro. A fé é uma luz que vem de dentro e muda nossas ações e atitudes. Mesmo de longe eles perceberam um novo clima no ar. Apesar de tão perto de Belém, em Jerusalém, ninguém deu notícias do ocorrido. Mais tarde Jesus dirá que nenhum profeta é bem recebido em sua pátria!  

Com “os amores na mente, as flores no chão,” os Magos caminharam sem preconceitos. Talvez, por isso, não se assustaram ao depararem-se com a pobreza do recém-nascido. Sendo o rei dos reis, aquele menino não deveria estar deitado num leito de puro ouro?  - Não! O seu leito era de palhas secas, cuidadosamente, arranjadas pelas mãos de José. Quem não gostaria de deitar-se numa cama preparada por São José?  De pompas e circunstancias os magos estavam enfarados, mas, certamente, nunca viram um ambiente tão simples e, naturalmente, iluminado. A Bíblia não registra nenhuma palavra dita por eles. E precisava? Eles não vieram para tagarelar ou postar uma foto deles no “Face”, ao lado do Menino Deus. Vieram de longe para adorá-lo!  

“E entrando na casa, viram o Menino com Maria, sua mãe, e prostrando-se o adoraram (Mt 2, 11).

Em momentos de adoração as palavras somem de nossas bocas e só nos restam murmúrios de amor. Diante de Deus talvez, fosse mais sensato cantar do que falar. Isso nos ensina Rumi(1), ao dizer:

Se meu Amado apenas me tocasse com seus lábios, também eu, como a flauta, romperia em melodias (2). Às vezes, um olhar ou um simples murmúrio fala mais do que um dicionário inteiro!

Os Magos “prostraram” e o “adoraram”. Não o adoraram de qualquer maneira. Prostrar-se com reverência é atitude humilde de quem varou noites e dias na busca de um oásis que, no deserto da vida, pudesse matar suas sedes. Ali, entre o boi e o jumento encontraram a verdadeira “água da vida”!  Ainda inclinados ofereceram ao Menino os seus presentes: Ouro, incenso e mirra, os dons mais preciosos do oriente.

Às vezes fico pensando: Se eu estivesse na comitiva dos Magos o que iria oferecer ao Menino Jesus?  Qual o presente seria mais adequado àquele que é o dono do mundo? Pode até parecer lugar comum, mas certamente, Jesus iria querer o meu coração e o seu também. Mas, para isso, você e eu não precisamos ir a Belém. Podemos fazer isso todos os dias. Por falar nisso, hoje você já teve um tempinho para conversar com Deus?

 

1-      Mawlānā Jalāl ad-Dīn Muhammad Rûmî nasceu em 30 de setembro de 1207 na região de Balkh, atual Afeganistão. Foi um poeta e místico persa ( segundo alguns estudiosos do assunto os Magos vieram da Pérsia – antigo Irã)

2-      Trecho de Masnavi - Livro I; Prólogo - (Rumi)

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