A adolescente do som

  Três horas da tarde e um sol de rachar mamonas! Ela desfila na pracinha com um som possante e reluzente debaixo do braço. Pela cara, tem u...

 


Três horas da tarde e um sol de rachar mamonas! Ela desfila na pracinha com um som possante e reluzente debaixo do braço. Pela cara, tem uns dezesseis anos, mais ou menos, época em que se faz de tudo para ser notado e chamar a atenção sobre si.  Cabelos vermelhos e  óculos cor de arco-íris, prendendo o pixaim no alto da testa e uma bolsinha minúscula que balança no rebolar dos quadris.  Mas, ela não estava só. Adolescente não faz carreira solo. Acompanhavam-na, três amiguinhas invejando o seu empoderamento feminino e mais uma de pernas compridas que também fazia parte da trupe. Aquele “footing” sob sol a pino mais parecia um desfile.  Desfile, talvez, fosse a palavra mais apropriada para aquela adolescente que, enquanto caminhava pela praça, exibia o seu poderoso som, “made in China”, debaixo do braço esquerdo, exaltando um “funk” de favela.  A adolescente do possante, nunca visitou uma favela de verdade e só tem uma ideia da mesma à partir dos programas policialescos da televisão brasileira que adora espetacularizar o crime. Mas, qual adolescente não adora transgredir? Por isso, mostrava com aquela música em alto e ruim som sua identificação com os “parsas” do Rio, São Paulo ou qualquer outra cidade grande.

Não sei por que, na adolescência, a gente vive um comportamento de bando. Nesse tempo, a turma se parece a um bando de maritacas; se uma pousa no milharal, todas pousam; se uma voa, todas vão atrás. Uma usou tênis branco, todas querem um tênis branco; comprou um “yphone”, todas querem um igual... Falam ao mesmo tempo e ninguém se entende. Quem mora nas proximidades de uma escola sabe bem do que estou falando. Os meninos, de bigodinhos, gostam de exibir a voz grossa e, às vezes, desafinada. Todos querem mostrar que já dominam certas gírias e alguns assuntos, principalmente, sobre sexo. Ao saírem da escola pisam forte, gritam alto e, muitas vezes, se descontrolam. Quase nenhum aceita o corpo que tem. Os mais magros querem engordar os gordos querem emagrecer; as baixinhas põem saltos; outras alisam ou anelam os cabelos. Ninguém está contente consigo mesmo. Mas, voltemos ao assunto da menina na praça.

Com seu som debaixo do braço em pleno sol de verão, a menina arranca suspiros de inveja de suas colegas. Seu short curtinho alonga mais ainda o tamanho de suas pernas. Sobra-lhe vaidade e hormônios. Pobre de seus pais! Como poderão educar os filhos no mundo de hoje, com tantos modismos que lhes chegam de todos os lados? Como poderão educar atualmente, quem foi educado há meio século?  Enquanto fiquei pensando nessas questões  a garota se distanciou. Vida que segue! Mas, quem segue mesmo é a adolescente do som, agora no alto da rua com uma grande turma de seguidores para animar um funk bem na porta de cemitério...

Foto em destaque: https://pixabay.com/pt/photos/jovens-grupo-amigos-amizade-junto-3575167/

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