Preso ao mastro do navio

 

Ao voltar da Guerra de Tróia Ulisses e seus companheiros deveriam atravessar por um caminho perigoso entre a Itália e a Cicília. Havia, naquela região, uma bela ilha habitada por sereias. No litoral, acumulavam-se restos de ossos e corpos de marinheiros que se afogaram, hipnotizados pelos cantos das sereias. Consta que, apenas dois, se salvaram de tal maldição: Orfeu e Ulisses!

Orfeu, o deus da música, ao perceber o risco que corria sua tripulação, ao passar pelas proximidades da ilha, tocou sua lira de forma tão encantadora que ninguém mais prestou atenção às músicas que vinham do lado de fora do navio. Assim, como quem usa contrafogo para apagar um incêndio, para abafar certa beleza, ele usou beleza ainda maior. Talvez, essa poderia ser uma grande lição aos pais e educadores. Não adianta, simplesmente, arrancar o celular das mãos dos filhos sem oferecer-lhes algo que seja mais sedutor... A vida real, às vezes, é tão dura que muitos preferem um refúgio no mundo virtual.

O que aconteceu com Ulisses, em situação parecida, foi ainda mais curioso. Antes de se aproximar da ilha das sereias, ele tampou o ouvido de seus companheiros com cera de abelhas. Em seguida, ele mesmo foi amarrado ao mastro do navio, conforme havia pedido. Dessa maneira, somente ele pode ouvir o canto das sereias mas, como estivesse amarrado, não pode sair do lugar!  Seus companheiros remaram sem nada ouvir. Assim, conseguiram atravessar, com vida, aquele trecho perigoso do mar.

Consideremos que todos somos tripulantes de uma grande embarcação nesse oceano da vida. O canto da sereia é tudo aquilo que nos seduz e arrasta para um caminho de morte. Quantas pessoas naufragaram enganadas pelas sereias de nosso tempo?  Num primeiro momento, elas são sedutoras e convincentes. Quem segue esses cantos, só mais tarde, perceberão que foram enganados.  Isso acontece, por exemplo, com quem busca o caminho das drogas.  No começo tudo parece lindo e maravilhoso mas, depois...

Não quero terminar esse texto sem falar da importância do mastro. No caso de Ulisses, ele foi a salvação. Em nosso caso, ele é Cristo. É preciso agarrar-se a Cristo para não ser arrastado para as profundezas ou cair nas armadilhas do inimigo. Afinal, como dizia Riobaldo, personagem de Guimarães Rosa: Viver é muito perigoso!

Imagem de Stefan Keller por Pixabay