Deus mendigo

 

Deus sempre nos surpreende com seu jeito de agir. Quando todos esperavam um Deus poderoso aos moldes de um líder militar, Ele veio a nós como criança. A criança em tudo depende dos adultos. Deus se fez dependente de nós, invertendo a lógica messiânica de seu povo. No encontro com a Samaritana, à beira do poço, pediu-lhe um copo d’água. Após ser atendido, ofereceu-lhe, água viva. A fonte de água viva suplica por um único copo d’água! Como entender esse gesto?  Antes da multiplicação dos pães requisitou alguns pãezinhos de uma criança e com eles alimentou cinco mil pessoas!

Uma coisa é certa: - Deus não tem mania de grandeza. Nós, que nada somos, é que cultivamos tais manias. Deus é simples e transparente. Com grande naturalidade, sem fazer estardalhaço, ressuscitou a filha de Jairo e recomendou aos seus pais que lhe dessem de comer. Durante a última ceia inclinou-se, humildemente e, feito escravo, lavou os pés dos discípulos. Que Deus é esse, que sendo tão grande, se fez mendigo para nos servir? Ele que tudo criou suplica, carente, pelo nosso amor. Como entender isso?

Creio em Deus todo poderoso, criador do céu e da terra... Assim, começa uma de nossas orações principais. Isso, está correto, caso contrário, ele não seria Deus. Mas, penso, que esse tipo de afirmação não o agrada muito.  Jesus nos revelou o verdadeiro rosto de Deus: Um pai, perdoador, misericordioso e apaixonado pelos filhos. Penso, que Deus nos olha, lá do céu, com um olhar cheio de bondade e misericórdia. Quem tem misericórdia coloca-se no lugar do outro e compreende suas fraquezas. Por isso, não temo o julgamento divino pois, sei que, para além de justo, ele é misericordioso e eu confio nessa misericórdia!  

Deus, às vezes, se disfarça para testar nossa generosidade. O texto abaixo foi escrito por Rabindranath Tagore, (Tagore) um poeta indiano que produziu verdadeiras pérolas na literatura de seu tempo. Acho que ele poderia ser aplicado aqui para ilustrar o que estou dizendo ou tentando dizer. Então, vamos lá:

Eu estava mendigando de porta em porta no caminho da aldeia, quando tua carruagem de ouro apareceu ao longe, como sonho deslumbrante. E fiquei me perguntando, extasiado, quem seria esse Rei dos reis.

Minhas esperanças voaram alto, e pensei que meus dias infelizes haviam chegado ao fim. Fiquei sentado, esperando esmolas que me seriam dadas sem serem pedidas, e um tesouro, espalhado por toda a parte, na poeira.

A carruagem parou onde eu estava. Teus olhar pousou em mim e desceste sorrindo. Senti que a felicidade de minha vida havia enfim chegado. Então, de repente, estendeste a mão direita e me perguntaste: “O que tens para me dar?”.

Ah, mas que gesto tão régio foi esse o de abrir tua mão para pedir esmola a um mendigo: Eu estava confuso e não sabia o que fazer. Então, bem devagar, tirei de minha sacola o menor grão de trigo, e o entreguei a ti.

Contudo, qual não foi minha surpresa quando, no fim do dia, esvaziei minha sacola no chão, e encontrei um grão de ouro entre as pobres migalhas que restavam! Chorei amargamente, lamentando não ter tido a coragem de entregar-me todo a ti. (1)

Após ler esse texto é bom tomar cuidado quando alguém solicitar nossa ajuda. Talvez, seja o próprio Deus que, disfarçado, vem a nós para testar nossa caridade. Pense nisso!

 

1 – Tagore, Rabibdranath, Poesia Mística. SP. Paullus, 2003. Poema 50 ( Gitanjali).

Imagem de billy cedeno por Pixabay