Limpar a ferrugem da alma em vez de cortar o bico do falcão

  Com a alma enferrujada o homem é incapaz de contemplar a Deus. Essa é uma grande verdade mostrada por Rumi no seu livro, o “Masnavi”.   An...

 


Com a alma enferrujada o homem é incapaz de contemplar a Deus. Essa é uma grande verdade mostrada por Rumi no seu livro, o “Masnavi”.  Antes de falar isso, ele mostrou um suposto diálogo entre Moisés e o Faraó. Mas, o Faraó estava com a “alma enferrujada” e, por isso, não conseguia entender o que Moisés lhe dizia. Moisés encarnava a razão verdadeira enquanto o Faraó se limitava ao campo da mera opinião.  Não deve ter sido fácil convencer o Faraó a adorar a Deus se ele próprio se considerava uma divindade!

Enquanto o Faraó acusava Moisés de ser um mal agradecido por tudo o que recebeu dele durante a infância, Moisés dizia-lhe que, a melhor forma de agradecimento era livrá-lo de suas ilusões.  O Faraó acusava Moisés de feitiçarias enquanto Moisés tentava lhe convencer que tudo o que fizera foi pelo “dedo de Deus”, ou seja, pelo poder de Deus.

“O corpo do homem, (disse Moisés), é formado de terra, mas, por disciplina e contrição, pode ser capaz de refletir verdades espirituais, assim como o ferro bruto pode ser polido até transformar-se em um espelho de aço. O Faraó deveria limpar a ferrugem da perversidade de sua alma, e então, seria capaz de ver as verdades espirituais que Moisés expunha diante dele”.

Moisés prometeu que se o Faraó obedecesse às suas admoestações ele receberia em troca quatro vantagens: Saúde, vida longa (vida eterna), um reino melhor do que o reino do Egito (Reino do céu) e juventude eterna. Após ouvir tais promessas o Faraó aconselhou-se com  Haman, alguém que pensava mais ou menos como ele, ou seja, um homem de alma enferrujada também. A mulher do Faraó querendo mostrar ao marido a cegueira espiritual de Haman, o seu conselheiro, contou-lhe uma história assim:

Certa vez, “um falcão real caiu nas mãos de uma velha ignorante. Essa velha não sabia nada das virtudes de um falcão e não gostou da aparência do falcão, dizendo a ele: ‘O que pretendia sua mãe deixando-lhe as garras e o bico tão longos’? Ela então resolveu cortá-los de acordo com o seu gosto e, evidentemente, estragou o falcão para os fins da falcoaria”.(1)

Apesar dos sábios conselhos da esposa o Faraó acabou ouvindo o seu assistente, pois “cada qual procura o seu igual”.

A história acima serve para todos nós. O falcão do relato significa a espiritualidade e simboliza a alma superior, enquanto a velha megera simboliza a natureza humana decadente e pecaminosa. Em cada ser humano existem duas forças: Uma nos puxa para cima, para Deus. É o falcão; e a outra nos arrasta para baixo, é a velha que mutila o falcão impedindo o seu voo para Deus.  Dentro de você e de mim, existe um Moisés e um Faraó. Enquanto o primeiro se parece ao ferro polido capaz de refletir a luz do sol, de Deus, o outro continua enferrujado preso apenas às coisas da  terra. Seria bom se a gente perguntasse qual desses dois personagens falam mais alto dentro de nós...

 

1-    Rumí, Maulána Jalal- ud-Din, Muhammad I, 1207 – 1273. Masnavi. Trad. De Mônica Udler Cromberg e Ana Maria Sarda. Rio de Janeiro; Edições Dervish, 1992 – Livro IV, PP -244

Imagem de NoName_13 por Pixabay 

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  1. Olá Padre Gabriel, muito valioso e inquietante seu texto. Temos sim dentro de cada um de nós esses dois personagens. Procuro a cada dia, melhorar minha personalidade. Deus seja louvado!

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  2. Em cada ser humano existem duas forças. Uma nos puxa para o alto ,para Deus...
    Padre, amo seus textos,mas esse realmente é divino ❤️

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  3. A metáfora do texto nos leva a ricas reflexões. Gostei! Parabéns

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