Os amantes de Deus estão acima das religiões
As religiões são caminhos para Deus. Mas, quem já chegou a Deus não precisa mais de caminho e nem de “GPS” para caminhar. Seria estranho, ...
As religiões são caminhos para
Deus. Mas, quem já chegou a Deus não precisa mais de caminho e nem de “GPS”
para caminhar. Seria estranho, se alguém, continuasse usando muletas depois de
ter sido curado... “Não é preciso
virar-se para a Caaba quando já se está nela...”
Penso que é dessa maneira que devemos compreender os grandes místicos da humanidade, independentemente, de suas religiões de origem. Isso não significa abandono ou desprezo para com as religiões. Mas, precisamos compreender que, quem já alcançou um alto patamar de santidade, não precisa mais de formas religiosas. Para ilustrar essa ideia, cito o texto de um grande místico do Islã, chamado Jalāl-ad-Dīn Muhammad Rūmī:
Certa vez, Moisés ouviu um pastor rezando assim: “O Deus, mostra-me
onde estás, para que eu possa tornar-me Teu servo. Limparei Teus sapatos e
pentearei Teus cabelos, coserei Tuas roupas e irei buscar leite para Ti”. Ao
ouvi-lo rezar dessa maneira insensata, Moisés repreendeu-o dizendo: “O tolo! Embora
teu pai fosse muçulmano, tu te tornaste um infiel. Deus é um Espírito, e não
precisa desses cuidados grosseiros, como tu, em tua ignorância, supões.”
Envergonhado com essa censura o pastor rasgou suas vestes e fugiu para o
deserto. Então se ouviu uma voz do céu dizendo: “Ó Moisés, por que fizeste
partir meu servo? Teu oficio é reconciliar o meu povo comigo, e não afastá-lo
de mim. Dei a cada raça diferente costumes e formas de louvar-me e adorar-me.
Não tenho necessidade de seus louvores, estando acima de toda necessidade. Não
considero as palavras que são ditas, mas o coração que as oferece. Não exijo
belas palavras, mas um coração ardente. São várias as formas de mostrar-me
devoção, mas se a devoção for sincera, elas são aceitas.” (1)
Acreditando estar fazendo o bem Moisés recriminou o pastor pela sua maneira de compreender a pessoa de Deus. Deus, no entanto, recriminou Moisés. Afinal de contas, não existe uma única maneira de louvar. Os povos são muitos e com culturas diferentes. Deus é infinito e não precisa do louvor de ninguém, mas, aceita louvores diferentes quando realizados com corações sinceros. Uma grande lição para quem pensa de forma autoritária e não sabe respeitar as diferentes compreensões do sagrado.
Parece-me, que os grandes místicos encontraram um jeito próprio e muito pessoal para se elevarem a Deus. Às vezes, eles foram muito incompreendidos por isso. São João da Cruz, por exemplo, chegou a ser preso e, por pouco, não foi denunciado à inquisição. Al Hallaj, místico muçulmano do Irã (857) foi preso mutilado e executado em 922. Sua união com Deus foi tamanha que ele dizia “Eu sou a verdade”. Isso foi o bastante para ele ser acusado de herege e pagar o seu “crime” com a própria vida. Algo parecido foi dito pelo Apóstolo Paulo – Já não sou eu quem vive, é Cristo que vive em mim – e, apesar de incompreendido, não foi condenado à morte por isso.
Continuando ainda a citar o Masnavi, completo minha reflexão. Deus disse a Moisés:
A cada pessoa destinei formas peculiares,
A cada uma dei costumes particulares.
Aquilo que em ti é louvável, nele é repreensível,
O que é veneno para ti, para ele é mel.
O que é bom para ele, é mau para ti,
O que é belo nele, em ti é repulsivo.
Estou isento de toda pureza e impureza,
Não preciso da preguiça ou do vigor do meu povo.
Não criei os homens para tirar deles proveito,
Mas para verter sobre eles a minha beneficência.
Nos homens da China, os da China.
Eu não sou purificado por seus louvores,
São eles que se tornam puros e brilhante com isso.
Não considero o exterior e as palavras,
Considero o interior e o estado do coração (2)
Considerando os textos acima fico pensando: Que bela lição de respeito e diálogo inter-religioso temos diante dos olhos! Ninguém ou nenhum grupo religioso deveria se considerar dono de Deus. O respeito às diferenças é fundamental para construirmos uma sociedade mais humana e fraterna. Pense nisso!
1- Masnavi – LivroII – História VII – PP 108
2- Rumí, Maulána Jalal- ud-Din, Muhammad I, 1207 – 1273. Masnavi. Trad. De Mônica Udler Cromberg e Ana Maria Sarda. Rio de Janeiro; Edições Dervish, 1992 - PP 108 - 109
Imagem de Flash Alexander por Pixabay
Bom dia Padre Gabriel peço oração por mim e por minha família
ResponderExcluirMuito boa reflexão.
ResponderExcluirChegar a Deus tem vários caminhos, por isto não podemos fazer julgamentos. Este texto mostra claramente que o temos no coração é que tem valor e não o exterior.
ResponderExcluirSabemos que Deus conhece o coração de cada um.
O tolo faz julgamentos a partir de seus valores, o sábio respeita as diferenças. Nosso pai pleno da sabedoria, conhece o coração de cada um de nós, aceita que o caminhar de cada um, seja no seu tempo, mas com o mesmo fim, ir encontro de Deus.
ResponderExcluirAssim este belo texto me levou a esta reflexão. Gostei muito da música. Parabéns