Enviou-os, dois a dois...

 

O que parece um detalhe, na Bíblia, acaba não sendo. Por isso, é preciso muita atenção na leitura dos seus textos. No Evangelho de São Marcos (Mc 6, 7-13), Jesus envia os apóstolos em missão e dá-lhes, algumas orientações importantes: “Chamou os doze e começou a enviá-los dois a dois...” Quando se está em dupla um pode ser testemunha para o outro. Por isso, os discípulos de Emaús foram dois; os discípulos foram chamados dois a dois; Pedro e o Discípulo Amado foram ao túmulo... Quando se anda dois a dois um acaba protegendo e amparando o outro. O que não se consegue sozinho se consegue, mais facilmente, em dupla. O número doze também é rico de significado. Doze foram os apóstolos, as tribos de Israel, os filhos de Jacó. Doze é sinal de perfeição e de totalidade. Afinal, doze são três vezes quatro. Imaginemos um Deus trinitário e os “quatro cantos” do mundo, ou seja, norte, sul, leste oeste...

“Deu-lhes autoridade sobre os espíritos impuros...” A impureza, que já existia naquele tempo, carecia de limpeza. Mas, a impureza maior talvez, não estivesse fora do homem. Noutra ocasião, Jesus afirmou que, o que tornava o homem impuro, não era o que entrava nele, mas, o que saia do seu coração. A luta contra toda forma de impureza deve começar, portanto, dentro de nossos corações. Aqueles que são, verdadeiramente, enviados por Cristo tem autoridade para nos libertar desses espíritos impuros, mas, para que isso aconteça é preciso que nossos corações lhe estejam abertos.

“Ordenou que não levassem coisa alguma pelo caminho a não ser um cajado...” Aqueles que foram, e ainda são, enviados não devem ficar divididos. “Quando se tem duas Marias uma acaba sendo abandonada”. Para servir a Cristo é preciso liberdade, tarefa quase impossível, quando se pretende andar em dois carrinhos, ao mesmo tempo. Não dá para agradar a Deus e ao mundo. Quando se está muito ajustado com um, com o outro a coisa não anda boa. No texto de Marcos o cajado foi permitido, em Mateus nem isso acontece. O cajado representa o poder divino. Moisés abriu o mar vermelho estendendo o seu cajado em direção a ele. Fez a água brotar da pedra ao tocar nela com seu cajado. A ideia, portanto, é essa: Quem está revestido do poder divino não precisa de muitos acessórios para a missão.

“Não levem duas túnicas...”. A ideia aqui é a mesma que valeu para o cajado. Em Efésios (Ef 6, 11-19) Paulo nos exorta a nos revestirmos de Cristo. Quem está revestido de Cristo também não precisa de outras roupagens. Quando se preocupa, em excesso, com essas camadas que realçam apenas a aparência é sinal que está faltando a vestimenta de Cristo. É bom refletir sobre isso em tempos carregados de vaidades e  cultos à própria aparência como o nosso. 

“Em qualquer casa em que entrardes permanecei nela até vos retirardes dali...” Para evangelizar, de forma eficiente, é preciso criar laços de amizade. Vivemos, hoje, na civilização da pressa. Tudo tem que ser rápido, de tal maneira, que temos que “assoviar e chupar cana” ao mesmo tempo. Nossas relações ficaram superficiais e até mesmo nas igrejas onde frequentamos corremos o risco de não criar laços com ninguém. O Evangelho nos alerta sobre essa questão. A palavra precisa de um tempo para decantação. Não dá para fazer tudo a oitenta por hora! É um grande desafio evangelizar na era do Tik tok.

Os apóstolos partiram em missão e conseguiram colocar em prática os ensinamentos de Jesus. Esses ensinamentos são os mesmos. O que mudou, então? Bom. O mundo mudou e nós também mudamos com ele. Resta saber se com essas mudanças estamos mais felizes. Os desafios da missão ainda existem. Além da coragem é preciso a veste da graça para que a palavra de Jesus seja colocada em prática  também em nossos dias. Pense nisso!

Foto: Arquivo Pessoal - Visão panorâmica - São José da Varginha, MG