Uma visita aos cemitérios
Debaixo de um sol escaldante visitei, recentemente, o Cemitério dos Brancos e o Cemitério dos Pretos, em Pompéu Velho, MG. No Cemitério do...

Debaixo de um sol escaldante visitei, recentemente, o
Cemitério dos Brancos e o Cemitério dos Pretos, em Pompéu Velho, MG. No
Cemitério dos Brancos foi sepultada Dona Joaquina do Pompéu, uma das maiores
fazendeiras de Minas que viveu naquela região no Séc XVIII. Sua fazenda somava,
aproximadamente, um milhão de alqueires!
Nunca entro num cemitério sem fazer a minha oração por
aqueles, que um dia viveram entre nós, e foram sepultados naquele local. Por
isso, mesmo debaixo do sol, rezei para todos os mortos que foram sepultados
naquele espaço. Ao ver a desolação do lugar, alguns pensamentos,
inevitavelmente, me assaltaram. Lembrei-me de duas músicas que aludem à
realidade. A primeira, de Billy Blanco, cantada por Dolores Duran, que fala
sobre o final dos vaidosos. Como se sabe, Dolores Duran era negra e, como tal,
sofria os preconceitos por causa disso.
A música “A Banca do
Distinto”, criticou o comportamento de um racista que costumava “assistir” os seus shows de costas virada
para ela. Por ser negra e pobre Dolores ficou muito triste com isso. “Banca do
Distinto” teve destinatário certo e foi um recado, inteligente, contra o
comportamento racista de um "distinto" daquele tempo. Ela diz o seguinte:
Não
fala com pobre
Não
dá mão a preto
Não
carrega embrulho
Pra
que tanta pose, doutor?
Pra que esse orgulho?
A bruxa, que é cega
Esbarra
na gente
E
a vida estanca
O
enfarto lhe pega, doutor
E
acaba essa banca
A
vaidade é assim, põe o bobo no alto
E
retira a escada
Mas
fica por perto
Esperando
sentada
Mais
cedo ou mais tarde
Ele
acaba no chão
Mais
alto o coqueiro
Maior
é o tombo do coco, afinal
Todo
mundo é igual
Quando
o tombo termina
Com
terra por cima
E
na horizontal
Como se pode perceber, através da música, Billy Blanco provocou muitas reflexões sobre o sentido da vida e sua brevidade. Não vale à pena perder tempo com preconceitos se todos um dia vamos terminar na horizontal com terra por cima...
No
sé qué tienen las flores, llorona
Las
flores de un camposanto
No
sé qué tienen las flores, llorona
Las
flores de un camposanto
Que,
cuando las mueve el viento, llorona
Parece
que están llorando
Que,
cuando las mueve el viento, llorona
Parece
que están llorando
(Eu
não sei o que as flores têm, chorona
As
flores do cemitério...
Parece
que estão chorando)
A música citada é uma canção mexicana tradicional, de autor desconhecido e traduz o sentimento de quem visita um cemitério onde até as flores parecem chorar com o sopro do vento.
A
palavra “cemitério” vem do grego (Koimetérion) e quer dizer local de descanso.
Por isso, deixei o local pensativo. Muitos que estavam sepultados ali levaram a mesma vida agitada que levo e, hoje,
descansam em completo esquecimento. Pena que, naquele tempo, nem a morte
conseguiu unir brancos e negros razão pela qual há dois cemitérios. A cor da
pele justificou a inferioridade de alguns. E olhe que, ao sepultar os negros,
de forma decente, num local específico, já foi um avanço na ocasião. Uma visita ao cemitério pode provocar em nós
boas reflexões. Talvez, esse seja o único local onde toda vaidade termina...
Fotos: Arquivo pessoal. Primeira foto: Cemitério dos Brancos - Segunda foto: Cemitério dos Pretos