Não junteis tesouros aqui na terra...

 

Começo o meu texto citando o poeta brasileiro, Vicente de Carvalho (1866-1924) que, além de poeta, foi jornalista, fazendeiro, advogado e político:

 Felicidade

Só a leve esperança, em toda a vida,

Disfarça a pena de viver, mais nada:

Nem é mais a existência, resumida,

Que uma grande esperança malograda.

 

O eterno sonho da alma desterrada,

Sonho que a traz ansiosa e embevecida,

É uma hora feliz, sempre adiada,

E que não chega nunca em toda a vida.

 

Essa felicidade que supomos,

Árvore milagrosa, que sonhamos,

Toda arreada de dourados pomos,

 

Existe, sim: mas nós não a alcançamos,

Porque está sempre apenas onde a pomos

E nunca a pomos onde nós estamos. 

A parte da poesia que mais me chama a atenção é a que diz: A felicidade existe, mas, nunca a pomos onde estamos, pois, sempre a pomos fora de nós como se ela fosse os frutos dourados de uma árvore inacessível. Acho que é bem isso, que acontece em nosso tempo, um tempo onde o mercado dita as regras de comportamento, cria necessidades fictícias e faz a gente confundir o ser com o ter. Dá-se a impressão que o poder de compra vai garantir a minha felicidade. Como boa parte das necessidades não é real, o salário nunca dá para pagar as contas e por isso, a gente se mata no trabalho para não endividar ao final de cada mês. Isso confirma que a gente não coloca a felicidade onde estamos... 

No Evangelho de São Mateus (Mt6, 19 – 23) Jesus nos orienta dizendo: Não acumuleis tesouros na terra, onde a ferrugem e as traças corroem, onde os ladrões furtam e roubam. Ajuntais para vós tesouros no céu... O alerta vale para todos nós, principalmente, para quem gosta de acumular, sem necessidade. Ter dinheiro e possuir o que nos é necessário é muito bom. Quem tem pode, inclusive, ajudar a quem não tem. O problema começa quando o dinheiro e as coisas se transformam em fins e não em meios. Diferente de Deus, que nos liberta, o ídolo nos escraviza. Muitos são escravos do dinheiro e dos bens que adquiriram. O dinheiro ajuda, mas, necessariamente, não traz felicidade. Caso contrário, todos os ricos seriam felizes e não é isso que percebemos por aí. De que adianta ser milionário e tirar a própria vida? 

Esse texto não quer ser uma idealização da miséria. Deus não criou ninguém para passar fome e morar debaixo da ponte. É apenas um questionamento, pois, muitas vezes, colocamos a felicidade num lugar distante quando ela pode estar perto de nós. Mais do que ter coisas precisamos de boas razões para viver. Quais são as razões que alimentam suas esperanças e dão sentido para sua vida? 

Pense nisso!

Foto em destaque: Arquivo pessoal - Eu e Dona Beija