Tapera
Se existe alguma cena que me faz refletir é uma casa em ruínas: uma tapera, por exemplo. O seu abandono reclama pelas vozes que, em ...

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A casa abandonada é triste. Ali não se ouve mais nada a não ser os grilos que ferem o silencio de quando em quando; ali não se sente mais o cheiro de alho e de gente. Apenas uma ou outra lagartixa passeia sobre as pedras. Onde antes a vida se alojava hoje reina o silêncio sepulcral dos abandonos. As paredes caiadas querem resistir à força imperativa do tempo que a tudo põem a baixo. Tudo em vão. Com o passar do tempo, a casa que abrigou famílias e acalentou sonhos tomba inexoravelmente por terra deixando para trás apenas saudades...
A roda do tempo é impiedosa. Tritura tudo por onde passa e passa em todos os lugares. Engole casas, gente e jasmins. Encardidas e dependuradas, as fotos de famílias duram mais do que as famílias de verdade. Olhando para nós parecem nos dizer: Vejam bem, somos hoje o que vocês serão amanhã!
Tapera rima com tristeza, com silêncio e saudade. A identidade das pessoas dura menos que os tijolos. Diante de uma casa em ruínas é impossível não se interrogar: Quem viveu por aqui? Que sonhos acalentaram? Que vestígios deixaram? Há registros do que fizeram? Ainda existem sobreviventes? A maioria dessas perguntas também fica no ar. Experimentei, um dia, esse sentimento ao visitar o Museu de Guimarães Rosa, em Cordisburgo, MG. Cordisburgo quer dizer “Cidade do Coração”. Coração de quem? – De Rosa, certamente. O presente cheio de vida que povoou a imaginação do grande escritor hoje pode ser contemplado apenas em seus livros. Sua família mudou-se de lá e tudo se transformou. Em Diamantina, o que sobrou de Chica da Silva, além do nome carregado de mitos? Mulher que fez e aconteceu, que pôs homens famosos de joelhos aos seus pés, o que deixou para a posteridade? Em Pará de Minas, o que sobrou de Benedito Valadares além do nome de uma rua, quase sempre substituído, por “Rua Direita”?
Na vã tentativa de fugir da fome do tempo, alguns mandam fazer estátuas de bronze de si mesmos. As pessoas se vão e as estátuas permanecem para servirem de banheiros públicos ou poleiros de pombos e pardais que, sem a menor cerimônia, defecam sobre suas cabeças!