Frederico Ozanam: Santo, poeta e cheio de amigos

Falar sobre Frederico Ozanam é falar sobre um homem santo que soube, com delicadeza, contornar os inúmeros obstáculos do seu tempo, sem perder a fé. Sua delicadeza com os amigos, com a família e com todos transparece em seus escritos. Dois amigos são como duas estrelas que se entreolham... Essa imagem foi, poeticamente, usada por ele em uma de suas cartas endereçadas ao primo Falconett.  Fiz questão de destacar trechos de duas dessas cartas porque os considerei muito belos:

... A juventude com seu ardor, com as suas tempestades; é o tempo das grandes alegrias e das grandes dores; é como a barca que se lança ao mar primeira vez: desadaptada às ondas que a baloiçam, tanto singra rápida e ligeira sobre a crista das vagas, como tomba e desaparece nos abismos até que mão mais segura vem empunhar o seu leme e guiá-la ao porto. Eis como é a nossa existência, para nós que começamos. Estamos, pois irrevogavelmente condenados a estas inquietações que nos devoram, a estas tormentas que nos assaltam e não há algum meio de dar ao nosso coração um pouco de paz e consolação? (1)

... A nossa amizade nunca foi perturbada. As nossas almas são como duas jovens estrelas que surgem juntas e se entreolham no horizonte: Uma névoa ligeira pode passar entre elas e ocultá-las durante algumas horas, mas em breve a ilusão dissipa-se e elas reaparecem puras, intactas, brilhantes uma para a outra e reencontram-se como irmãs... (2)

Frederico Ozanam foi um jovem de alma inquieta. Isso se pode perceber no primeiro trecho destacado acima. Mas, no restante da mesma carta, ele nos deixa claro sobre o que fazia para acalmar sua inquietação interior. Além da oração, ele costumava ler poesia:

...Temos necessidade de qualquer coisa que nos possua e nos transporte; que domine os nossos pensamentos e os eleve; temos necessidade de poesia no meio deste mundo prosaico e frio, e ao mesmo tempo de uma filosofia que dê alguma realidade às nossas concepções ideais, de um conjunto de doutrinas que seja a base e a regra dos nossos estudos e das nossas ações. Este duplo benefício, encontramo-lo no catolicismo, ao qual nos ligamos para nossa felicidade...

Somente esses dois trechos das cartas de Ozanam nos valeria para grandes reflexões. Ele que, ainda era jovem, ao escrever essas cartas, não descarta a beleza da juventude: Parece uma canoa graciosa que corta a crista das águas... Mas, ao mesmo tempo, sem uma mão experiente e firme essa canoa pode resvalar-se para o abismo... Achei essa imagem da canoa maravilhosa para falar da juventude. A canoa não tem o peso de um trem de ferro. Ela é leve e graciosa. Não foge das ondas nem teme o mar aberto. Ela representa bem o tempo da juventude. Quase nada representa desafio para quem está na flor da idade. Mas, esse desejo de mar aberto, muitas vezes, pode levar o jovem ao naufrágio... Ozanam encontrou essa “Mão firme” na religião. Por isso pode deslizar com leveza o seu barco sem que ele fosse tragado pelas ondas de seu tempo.

No segundo trecho acima ele fala da importância da amizade. Os dois amigos que cresceram juntos são como duas estrelas que se entreolham. Com a passagem de uma nuvem, momentaneamente, esse olhar pode ficar embaçado. Mas, logo depois ele recupera a visão e contempla a beleza da amizade. Mas, que nuvem é essa que embaça a visão das duas estrelas?  Ao que parece, era uma forma delicada de Ozanam se desculpar pela demora em responder as cartas do primo que lhe pedia conselhos e informações sobre sua vida em Paris...

Ozanam valorizava tanto a amizade, que ao longo de suas cartas podemos encontrar diversas afirmações bonitas sobre o tema:

 “A amizade é o vínculo por excelência para cimentar a caridade”

 “Após grandes emoções, sente-se mais vivamente a necessidade de se encontrar, de conversar e se entregar às doçuras da amizade”

“Sempre muito me impressionaram estas palavras de Davi, ao implorar a Deus ‘que o corrigisse pela voz de um amigo’”

“Parentes e amigos formam duas espécies de companheiros que Deus nos concedeu para com eles caminharmos pela vida”

 “As ocupações, por mais importantes que sejam, devem dar lugar por algumas horas aos deveres da amizade”

“Há amizade mais pura que a amizade cristã?” (3)

Conforme podemos observar Frederico Ozanam sempre procurou cultivar e valorizar as amizades. Fundou a primeira Conferência Vicentina com um grupo de amigos. E assim as conferências existem até hoje. Não existe “carreira solo”, no trabalho vicentino. Formamos uma grande rede unida por diversos pontos. Cada um é importante. Mas, sozinho ninguém faz nada. Pense nisso!

1-      Carta de Frederico Ozanam ao seu primo Ernesto Falconett, datada de 5 – 8 de janeiro de 1833

2-      --------------------- Carta datada de 19 de março de 1833.

3-      http://www.ssvpbrasil.org.br/20-de-julho-ii-dia-do-amigo-irmaos-na-fe/ - Consulta em 09/03/2020

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